sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Todas as declarações de amor são ridículas

Íris, cor de mel, mostravam muito bem o que ela sabia fazer, fotografar. A verdadeira definição de amador, aquele que ama o que faz. A câmara parece gigante quando comparada com o seu corpo franzino e de baixa estatura. O desequilíbrio de tamanhos. Mas a postura de um gigante. Olhar os outros através da lente. Captar o que os olhos comuns não vêem. Gosta de conhecer gente interessante. E foi por causa de uma pessoa, mais do que interessante, que se conheceram. Foi paixão à primeira vista. Começou por ser um amor vivido em silêncio. A forma como amava não era explicável por palavras. Talvez para além delas. A razão de muitas insónias. “Eu sou o sol da sua noite em claro”. E a razão de contar estrelas enquanto o dia nascia. Mas tinha todo o tempo do mundo. Esperaria o tempo que fosse preciso. Sem pressas. Muitos sinais. Muito óbvios. Esperava que parasse de fingir que não reparava.  Como a canção: “Meu bem, qualquer instante que eu fico sem te ver aumenta a saudade que eu sinto de você”.

Passaram algum tempo a trocar mensagens. Estava numa fase complicada. Frases curtas e sucintas, como a vida. Respostas por dar, perguntas sem resposta, quase nenhuns pormenores dela. Como um saca-rolhas a quem é difícil resgatar qualquer informação que não queria dar. Tudo muito devagar. Tudo com muita calma. O martírio da sedução. A barreira intransponível dos muros. A carapaça dos bivalves e tartarugas com que se protege. Difícil. Resolvia tudo com “não quero falar sobre isso”. Tudo eram longas histórias. Incontáveis. Difíceis de contar. Com algumas insinuações e sinais contava (tudo) o que viveu. Mas conversar não era o seu forte. Tinha um dedo podre para amizades. Fazia-lhe falta alguém que a abraçasse sem pedir nada em troca. Estava farta de parasitismo e que lhe sugassem as energias. Acabava sempre enganada, como (quase) todas as mulheres, em alguma altura. Não tinha objectivos, alvos ou metas. Respondia ao momento segundo o que lhe davam. Viver ao sabor do vento, esse era o seu mote. Contou-me que tem muita mágoa no coração e que tem dado muito amor. Que teve muito prazer mas também muita dor. E que os momentos de felicidade se transformaram em sofrimento.

Como se explica? Não foi um arranjo de família. Não foi interesse. Por isso, a resposta mais sensata: foi o amor. Com muita perseverança e muita luta, sem perder a esperança, mesmo quando esta parecia não ser nenhuma. Uma mulher de muita coragem. A coragem nunca desvaneceu. Espera que a ouçam chorar. Olhar-lhe nos olhos e sentir reciprocidade é tudo o que mais quer. Acredita que não corre perigo e que tudo vai mudar. Porque não há mal que dure sempre nem bem que nunca acabe. “Vem vambora/ Que o que você demora/ É o que o tempo leva”.

E foi assim que eu vi que a vida
Colocou ela pra mim
Ali naquela terça-feira
De setembro
Por isso eu sei de cada luz de cada cor de cor
Pode me perguntar de cada coisa 
Que eu me lembro
(...)

Ela me achou muito engraçada
Ela falou, falou e eu fingi que ri
A blusa dela tava do lado errado/ toda amassada
Ela adorou o jeito que eu me vesti

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