terça-feira, 31 de janeiro de 2012

WIT


Na sexta-feira fui ver  a peça “Wit” no Samuel J. Friedman Theatre. Eu não conhecia a peça mas a C. disse-me que os alunos de Medicina viam o filme nas aulas de Bioética e disse-me também que no filme entrava a Emma Thompson e que os médicos eram representados como “os maus”. Decidi comprar os bilhetes porque a actriz principal era a Cynthia Nixon, que ganhara o Tony Award pelo “Rabbit Hole” (que foi posteriormente adaptado para cinema e com o qual a Nicole Kidman foi nomeada para o Óscar de melhor actriz). 

Ainda antes de ver a peça, comprei o livro da Margaret Edson pelo qual ganhou o prémio Pulitzer. Bem, a peça é sobre Vivian Bearing, Ph.D., uma excelente professora de inglês, a melhor na sua área, que passou anos a estudar e a ensinar os brilhantes e difíceis sonetos de John Donne. A peça começa com o diagnóstico de cancro terminal. Vivian uma mulher de 50 anos, determinada, sem medo e forte que sempre se dedicou ao estudo e à profissão. “After twenty years, I can say with confidence, no one is quite good as I”. Há algumas partes hilariantes quando vai fazer um Raio-X e lhe perguntam o nome e a seguir: "Doctor” e ela responde: “Yes, I have a Ph.D.” e o técnico diz-lhe: “Your Doctor!”. Mais à frente percebemos que um dos médicos foi aluno dela: “Professor Bearing was very highly regarded on campus. It looked very good on my transcript that I had taker her course. They even asked me about it in my interview for med school. I survived Bearing’s course. Yeah, John Donne, those metaphysical poets, that metaphysical wit. Hardest poetry in the English department. A pergunta mais repetida é: “Professor Bearing, how are you feeling today?”. No decorrer dos 8 meses de tratamento experimental Vivian diz aprender a sofrer. Fala do quanto é difícil a proctosigmoidoscopia mas que ver-se sem cabelo e descalça é o pior. Sim, e acha também degradante os exames pélvicos efectuados pelo antigo aluno. A forma como são representadas as “Grand Rounds” é notável. As descrições exaustivas dos tratamentos e da manifestação da doença: “Grand Rounds is not Grand Opera. But compared to lying here, it is positively dramatic. Full of subservience, hierarchy, gratuitous displays, sublimated rivalries - I feel right at home. It is just like a graduate seminar. In Grand Rounds, they read me like a book. Once I did the teaching; now I am taught”. Vivian sobrevive a 8 sessões de tratamento experimental com dose máxima, superou o record. Como os médicos dizem durante a peça: “She´s tough. She can take it”. Depois, vê-se  o confronto entre humanidade vs profissionalismo, humanidade vs investigação. O que é mais importante? O que lhes é ensinado na Universidade? E ela própria percebe como foi insensível numa das cenas com um dos alunos dela em que este lhe pede um adiamento para a entrega de um paper, numa analepse: “Don´t tell me. Your grondmother died.”, ao que o aluno responde: “You knew” (coitadinho, que crente..). E ela responde: “It was a guess. Do what you will, but the paper is due when it is due”. 

Com o evoluir da doença e do sofrimento, Vivian consegue perceber a humanidade que tanto lhe faltou durante a vida e que ela agora, sozinha, tanto ambiciona: “The young doctor, like the senior scholar, prefers research to humanity. At the same time the senior scholar, in her pathetic state as simpering victim, wishes the young doctor would take more interest in personal contact…the senior scholar ruthlessly denied her simpering students the touch of human kindness she now seeks”. O momento catártico da peça é quando ela está em sofrimento agoniante. A cena está tão bem interpretada que ela até chora: "I want to explain it, to use my words…I’m like a student and this is the final exam and I don´t know what to put down because I don´t understand the question and I´m running out of time. I am in terrible pain… Oh God, it is so painful. So painful. So much pain. So much pain.”. Sabem que mesmo as pessoas que não são crentes na hora do desespero chamam sempre por Deus?. Mas sabem o mais irónico, o médico chega ao quarto e vê esta agonia e sabem o que pergunta: “Dr. Bearing are you in pain?”. Ao que Vivian responde: “Am I in pain? I don´t believe this. Yes, I´m in goddamn pain. I have fever of 101 spiking to 104. And I have bone metastases in my pelvis and both femurs. (Screaming). There is cancer eating away at my goddamn bones, and I did not know there could be such pain in this earth”. Numa das últimas cenas, Vivian já não responde devido à morfina, quando o médico lhe pergunta:”How are you feeling today?”. Na parte final, enquanto o médico (antigo aluno de Vivian) muda o cateter com a enfermeira fala: “She was a great scholar. Wrote tons of books, articles, was the head of everything...I had a lot of respect for her. She gave a hell of a lecture. No notes, not a word out of place. It was pretty impressive. A lot of students hated her, though. She wasn’t exactly a cupcake. It felt more like boot camp than English class...”. E a peça acaba de forma surpreendente, pensavamos nós que teria sido uma diferença em relação ao livro, afinal não. O final é exactamente o mesmo.

Depois da peça vi o filme e acho que algumas das partes dramáticas estão melhor representadas na peça (Cynthia Nixon) relativamente ao filme (Emma Thompson). Concordo, contudo, com a C. que a ironia é muito mais bem interpretada pela Emma Thompson. Comparações à parte, não posso deixar de me queixar do público. Ó pá, nunca vi gente tão mal comportada no teatro. Esta gente vai a uma peça dramática, sim, repleta de cenas de ironia, mas não é para rir feitos tolinhos... Eu até estava a sentir-me incomodada. Apetecia-me pregar dois murros ao gajo sentado ao meu lado. As pessoas, não distinguem uma comédia hilariante de um drama com alguma ironia. Claro que há partes que dá para rir muito... mas não é sempre. Aqui está outro dos exemplos do excesso de barulho desta cidade. Mas depois proíbem as pipocas nas salas de cinema....

Photo By Boneau/Bryan-Brown

Photo By Boneau/Bryan-Brown






sábado, 28 de janeiro de 2012

Antony and the Jonhsons: SWANLIGHTS Performance


Eu sou o que se chama “ignorante” quando o assunto é música. Quase não oiço música. E a pouca música que oiço é quase sempre a mesma há muitos anos. De vez em quando, muito raramente, lá oiço qualquer coisa nova que me mostram e adiciono à minha lista. Não consigo fazer nada, que exija concentração, com música. Nunca fiz parte dessa percentagem de pessoas que conseguia estudar com música, ou escrever, ou adormecer... A única altura em que oiço música é quando conduzo (e muito pouca, porque normalmente prefiro ouvir notícias), ou quando corro (também, infelizmente, muito raramente), e deixei de o fazer enquanto andava de metro (já não o faço mais porque aprendi a não ficar enjoada enquanto leio). 

Tudo isto para dizer que fui ver o Antony Hegarty (mais conhecido como Antony and The Johnsons) ao Radio Music City Hall. Gostei desde sempre da voz dele. Quando soube que ia fazer uma performance única em NYC com o patrocínio do MoMa quis desde logo ir. O espectáculo chamou-se “Swanlights”. O Antony tocou com uma orquestra a que ele chamou “The Jonhsons New York Orquestra”  e apareceu vestido com uma espécie de túnica branca, uma mistura de vestido de diva e a túnica de Jesus, quase sempre sozinho no centro do enorme palco. O cenário estava lindíssimo. Tinha um mobile gigante que mudava de cor durante o espectáculo, havia vários jogos de luzes e lazers. Durante a maior parte da performance não se viu a orquestra e mais para o fim  uma das cortinas subiu e mostrou a orquestra que estava no fundo do palco. Ele escolheu as canções mais contemplativas. Ao contrário do que é habitual, o público manteve-se extremamente calado, como o espectáculo exigia, aplaudindo apenas entusiasticamente no fim de cada música. Foi um concerto coeso, concentrado, pequeno...curto, como a vida. E ainda mostrou que o pop, para além de ser uma corrente muito forte na arte, pode transformar-se em poesia, quando o assunto é música. Antony fez da música da Beyoncé “Crazy in love” parecer um poema: “Got me hoping you’ll save me right now”.

Após a última música, ele abandonou o palco e as cortinas fecharam-se. O público bem insistiu durante uns cinco minutos para que voltasse... Como anti-pop que é, não usou o vulgar truque do encore, e não voltou.  
Foi mágico! Visualmente inesquecível! Estou comovida com o Antony, com o som, com a orquestra, e as instalações. Isto só podia ter acontecido em NYC, a cidade onde tudo acontece! Tantas tribos, tão diferentes. Nunca me senti tanto em NYC como nesse dia..

Photo By Neide Vieira

Photo By Neide Vieira

Photo By Neide Vieira
Photo By Neide Vieira

Photo By Neide Vieira

Photo By Neide Vieira

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

1 Train (I)

No metro de NYC é onde (quase) tudo acontece. O metro aqui chama-se "train". O que uso todos os dias para ir de casa para o laboratório (e do laboratório para casa) é o "1" que me leva de "Columbia University -116th" até a "Columbia Medical Center - 168th. São apenas 10 minutos e 4 estações (125th, 137th, 145th, 157th).  Tenho muitas histórias para contar, mas há pouco, quando regressava a casa vi, mais uma vez (já perdi a conta), uma mãe com um saco de qualquer coisa tipo "Cheetos"  a partilhá-lo com os filhos. Não posso deixar de mencionar que já era uma hora tardia para os parâmetros americanos (passava das 9 da noite). A esta hora, as crianças já deveriam ter jantado e deveriam estar a dormir. Um dos miúdos não tinha mais de 2 anos e o outro ainda não andava. A mãe, essa, não devia ter mais de 18 anos... E como se não bastasse, o miúdo mais velho ainda estava agarrado a uma garrafa de coca-cola... compreendo, depois daquela gordura e daquele sal todo... 

E este episódio de hoje faz lembrar-me outros dois. No ano passado assisti a uma cena semelhante, só que dessa vez, de manhã. Uma mãe com um bebé que não deveria ter mais de 7 meses (ainda nem dentes tinha, nem um!!) dava-lhe batatas fritas de pacote!!!  Era ver o menino (sem dentes, não esquecer) a amolecer as batatas fritas para as conseguir engolir, e com um ar muito satisfeito. Até que, o pior aconteceu, o menino engasgou-se!!!! Pudera!!! E o que fez a mãe?! Virou-o de pernas para o ar e era vê-la a sacudir o menino!! A batata entalada lá saiu e o menino continuou na sua degustação. Alguns dias depois lembro-me de ter contado esta história à C. Ela não ficou muito surpreendida e disse-me: "Quando estava no Texas vi uma mãe com um bebé de colo a dar-lhe coca-cola! 

E depois de tudo isto, se os meus sobrinhos imaginassem que os meninos da idade deles podem beber coca-cola e comer batatas fritas, nunca mais me falariam! Eles sabem que o mundo da coca-cola está a anos luz...mas sabem o que estão a perder, porque apesar de nunca ninguém lhes ter permitido provar tão secreta bebida (que eles sabem que o pai e a tia são viciados) foram já apanhados no saco da reciclagem a tentar que o resto de uma gota dentro de uma garrafa lhes caísse na boca!!!

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

O barulho


Os americanos têm regras para tudo menos para uma coisa: o barulho. Em NYC a coisa ainda piora. Mesmo com o cair da noite não há regras: os carros continuam a buzinar, as ambulâncias, polícias e os bombeiros continuam com as sirenes ligadas. Ainda não consegui distinguir quando as pessoas estão a gritar porque lhes aconteceu alguma coisa ou porque deve ser moda....E eu, que nunca tive problemas em adormecer, no pouco tempo que durmo, vejo-me agora a "contar estrelas depois que o dia nasce". 
No entanto, é a cidade que proíbe que se fume até em sítios ao ar livre (Exs: Central Park e muitos outros parques, Times Square, esplanadas de cafés e restaurantes, zona à volta dos hospitais, junto a edifícios públicos...). Não esquecendo, claro, as próprias casas. Podemos ser os detentores do aluguer mas continuamos a não poder fumar. Em Houston costumava fumar na cozinha por baixo do exaustor que era a única maneira do fumo não ser detectado. Agora, eu que já não fumo, vejo imensos vizinhos ou à janela ou nas escadas de incêndio (que basta abrir a janela e saltar para lá). Estou contente pela democracia existente neste prédio. Nunca vi tantos fumadores por metro quadrado, apesar de não ter visto mais de 4!!! Mas acreditem, para a amostragem, é um valor significativo! Ah, claro, não podia esquecer a regra ridícula de não se poder transportar garrafas de álcool (visíveis) ou bebê-lo na rua. Todas as garrafas têm que ser transportadas tapadas, de preferência, dentro de sacos de papel e mais um saco de plástico (contribua-se para a poluição do mundo). 

Restaurant Week - Spice Market



Entre 16 de janeiro e 10 de fevereiro decorre  a edição de inverno do Restaurant Week New York.  Ontem fomos pela  primeira vez a ementa do Restaurant Week deste ano. A escolha do almoço foi: Spice Market no Meatpacking District. O restaurante é muito bonito, dividido em 2 pisos enormes e com uma iluminação que a Blanche do “Um eléctrico chamado desejo” adoraria: “lâmpadas com quebra-luz" (Ela detestava luz demasiado forte, ao que ela dizia: “Não quero ser vista debaixo desse clarão impiedoso"). A entrada que escolhi foi "Spiced Chicken Samosas Cilantro Yogurt" Aqui ficam as fotos do prato principal e da sobremesa:

Grilled Beef with Rice Noodles 
Pho Broth, Asian Vegetable

Pineapple Upside Down Cake 
Basil Ice Cream, Pineapple Sorbet 


sábado, 21 de janeiro de 2012

"Botar o preto no branco"

Hoje lembrei-me desta história enquanto andava debaixo de neve ali para os lados do Lincoln Center. Há uns anos atrás a Adriana Calcanhotto contou que a maior cantada da vida dela tinha sido quando era adolescente em Porto Alegre: «Eu vinha da escola com os livros na mão, e naquela época eu era tão branca como sou hoje, e eu vi um menino muito preto encostado na parede que  me diz: "E aí, se a gente botasse o preto no branco?"».

A casa de banho de Bryant Park


Ontem fui jantar com a C. a um restaurante indiano Chola.  Há muito que me apetecia comer comida indiana de boa qualidade (toda a gente sabe o resultado da ingestão deste tipo de comidas impróprias para consumo...). Comemos muito bem: naan (pão indiano), CHICKEN CHUTNEYWALA, SAAG PANEER (espinafres com queijo), regado com Sam Addams. Depois deste repasto a única alternativa era andar a pé. Era uma das noites mais frias do ano, e que estava anunciado que a partir da meia-noite iria nevar. Como o restaurante era na 58 com a 3ª Av resolvemos andar até à 42 pela Park Av. Vamos a meio do percurso e comunico à C. que a minha bexiga  está a dar horas. Tentamos a Grand Central mas pelo tardar da hora, as casa de banho já estavam fechadas. Os Starbucks por essa hora já estavam todos fechados. Tentamos a 2ª hipótese: Bryant Park onde nesta altura do ano tem a pista de gelo. Num dos recantos escondidos do jardim encontramos um edifício antigo, discreto, e qual não é o nosso espanto quando entramos e vemos aquele aparato. Foi talvez a melhor e mais limpa casa de banho que entrei em NY. Jarro enorme de flores verdadeiras, música clássica e tudo impecavelmente limpo. Aqui fica a sugestão para os turistas. E lá caminhamos até Times Square para o metro que nos levaria a casa. 


Crysler building ao fundo



Times Square ontem à noite

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

E esta sou eu...

Tenho uma amiga aqui na Grande Maçã que para além de ser muito mais nova do que eu, diz-se que vai ser médica e tem um humor apuradíssimo. Eis como me apresenta às outras pessoas: "AM, mais de 30 anos (não se diz a idade de uma senhora). Bracarense de gema. Conhecedora de bons sítios para comer e beber. Trabalha em Caldas das Taipas, local que adora do fundo do seu coração. Vem de vez em quando para Columbia com a desculpa que faz experiências... pois.  Mas o que ela quer realmente é andar por NYC a fazer um guia dos tascos (Moleskine preto)".  

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Obama vs Vinícius


Vinícius de Moraes, muito resumidamente, inventou a bossa nova, e depois largou a bossa nova e inventou os afro sambas, e depois largou os afro sambas e foi diplomata, e largou a gravata, e aí foi expulso. Esta história é contada pelo próprio Obama nas memórias dele. A mãe do Obama com 16 anos de idade viu o filme do Marcel Camus “Black off”, o filme baseado na peça de Vinícius de Moraes “Orfeu da Conceição” que é um orfeu negro. A mãe do Barack Obama, uma mulher branca nos Estados Unidos, numa época em que os negros tinham que dar lugar aos brancos no autocarro. Ela apaixonou-se por esse filme, por aquela possibilidade que o filme promete. Então, a mãe do Barack Obama teve um filho com um homem negro do Quénia. Tudo isto para dizer que se não fosse o Vinícius de Moraes não haveria o primeiro presidente negro nos EUA.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Por que você faz cinema?


Em Maio de 1987 o jornal francês “Liberation” fez a pergunta “Porquois filmez-vous?” ao cineasta brasileiro Joaquim Pedro de Andrade, ao que ele respondeu:

«Para chatear os imbecis, para não ser aplaudido depois de sequências dó de peito. Para viver à beira do abismo. Para correr o risco de ser desmascarado pelo grande público, para que conhecidos e desconhecidos se deliciem. Para que os justos e os bons ganhem dinheiro, sobretudo eu mesmo. Porque, de outro jeito a vida não vale a pena. Para ver e mostrar o nunca visto, o bem e o mal, o feio e o bonito. Porque vi “Simão no deserto”. Para insultar os arrogantes e poderosos quando ficam como “cachorros dentro d'água” no escuro do cinema. Para ser lesado em meus direitos autorais».

Embora eu esteja sempre muito mais interessada nas perguntas do que nas respostas, esta foi das melhores respostas que li na vida.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

O Starbucks (I)


O Starbucks, antes de viver cá, era para mim um lugar de peregrinação. Era viciada, ao chegar aos Estados Unidos, em pedir “medium decaf latte”. Percebi com a experiência e com os anos vividos cá, deste lado do oceano, que não é o melhor da sua área, na minha opinião. Mas desde sempre a minha opinião foi imutável no que respeita ao conceito democrático deste café. É um sítio onde as pessoas podem ficar o dia todo, protegerem-se do frio/calor, permanecer sem consumir e até usar a casa de banho sem ser cliente. Desde o ano passado, em que me mudei para NY no inverno, passei a respeitar ainda mais o Starbucks. Passei inúmeras horas no Starbucks da 110 com a Broadway. Este ano, por razões bem diferentes volta a ser o meu local de eleição, depois do trabalho e aos fins de semana, enquanto não tenho internet em casa. Hoje está uma noite amena para os parâmetros do inverno de NY, e por isso, o Starbucks da 110 está com muitos lugares vagos. Se estivesse muito frio estaria a abarrotar, sobretudo com pessoas que não têm casa. Fiquei comovida no ano passado quando num dos dias de muito frio vi os sofás e as cadeiras ocupados por pessoas que viviam na rua. E ninguém os mandava embora. É isto que gosto no Starbucks: tribos tão diferentes. E depois é observar a solidão tão entranhada de NY. Pessoas que estão aqui para não estar sozinhas em casa. Depois há os estudantes e os intelectuais que podem passar aqui o dia inteiro. Vê-se também pessoas a jogar cartas. E eu gosto particularmente deste porque é maior, tem muito menos gente do que o Starbucks da 116 (que é mesmo ao lado de minha casa) e porque posso andar a pé.

Buraka Som Sistema


Mais uma vez no Bowery Ballroom a noite prometia. O programa começou com um DJ daqueles de fio de fora, com uma música muito má, na minha opinião. Sobretudo música suburbana (em Portugal mais conhecida por música “carrinhos de choque”). Mas lá tive que o ouvir durante mais de uma hora. O que eu estava mesmo curiosa era ver os Buraka pela primeira vez. E valeu muito a pena a espera.  A vocalista parecia que tinha tomado qualquer coisa ilegal. Estava eléctrica e chegou até a dançar o "créu". Para quem não conhece aconselha-se a elucidação via youtube. Queria postar uns vídeos mas não estou a conseguir. Existem alguns no youtube para quem for mais curioso(a).



segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Faça você mesmo

Repito a mesma experiência de há uns anos atrás. Parece que foi ontem mas já foi em 2006! Quando vivi em Houston mobilei a casa duas vezes. Tudo comprado do zero. Hoje, passados quase 6 anos, volto a fazer o mesmo. Mudou apenas a cidade. Só que desta vez foi bem mais fácil porque não envolveu a minha ida a lojas. Tudo foi comprado pela internet. Foi nessa altura que entrei pela primeira vez no IKEA. Saí à mesma velocidade que entrei. Limitei-me à lista que levava na mão e não olhei para mais nada. Dessa vez não foi uma experiência má. Passados uns anos, no último verão, voltei a entrar no IKEA, numa cidade diferente. Muitas das pessoas que me conhecem começam agora a dizer que o defeito não é da loja mas da cidade.... Adiante, jurei que nunca mais. A experiência foi tão má que saí de lá com uma dor de cabeça que não me passou com nada!!! E acabei por não trazer quase nada do que me propunha porque não encontrei metade... Perdoem-me os defensores do IKEA mas para mim não dá. Para mim resultaria muito bem se as vendas fossem online e se não tivesse que entrar lá e suportar aquela música, que tal como quase todas as lojas em Portugal, só serve para poluir. Nunca percebi este excesso de música no mundo, música no elevador, música nas lojas, música nos hotéis, nos cafés... para quê? Termino com 3 fotos de fases diferentes e que prova que até eu sou capaz de o fazer!







domingo, 15 de janeiro de 2012

A saudade


Numa das minhas viagens Lisboa – NY fiquei naqueles lugares que toda a gente ambiciona, que ficam imediatamente a seguir à business class. Consegui pela primeira vez, desde que ando de avião, um desses lugares. São espaçosos e pode estender-se as pernas. Disseram-me, depois, que tive sorte de não apanhar uma família com os seus filhos chorões... mas de facto, isso não aconteceu. Ao meu lado ficou uma menina (julgava eu não ser maior de idade) com aquele aspecto de quem vai fazer o último ano do secundário na escola americana e viver em casa de uma família. Saberia eu depois, que isso também não correspondia à verdade.
Eu sou daquelas pessoas que joga no campeonato dos que quase morrem de medo de andar de avião. Acho desconfortável, temível, incontrolável... acho sempre que é um desafio à natureza.... Mas tento sempre abstrair-me e ocupar-me com o maior número de coisas porque nunca durmo. Tentei uma vez dormir (por indução do sono) há alguns anos atrás. Numa viagem Frankfurt- Xangai viajava com mais 3 amigas e também colegas mas tive o azar de ficar separada delas. Como a viagem demorava 12 horas resolvi tomar 1 victan. Não fez efeito... Na viagem de regresso em vez de 1 tomei 2. Não sei o que aquilo provocou em mim....fiquei num estado tal que achavam que eu tinha morrido, inclusivé, acharam que eu tinha aberto a testa tal foi a força com que bati com a mesma naquelas mesas que abrem no avião... Tudo isto para dizer que a partir desse dia passei a não determinar as acções do meu corpo. Como quase sempre, também nunca durmo na noite anterior a viajar (que novidade... muita gente acha que não durmo, de todo, e que estou acordada em quase todos os fusos horários).  Como, quase sem excepções, não falo com a(s) pessoa(s) que viajam ao meu lado (corroborando a minha fama de anti-social). Desta vez foi diferente. A menina que viaja ao meu lado, chamada R, e que já não era tão menina assim, demonstrava um aparente entusiamo de quem sai de casa dos pais pela primeira vez.  Passados uns minutos do avião ter levantado começo a reparar que a R. está a chorar incontrolavelmente. Não aquele choro histérico, mas um choro silencioso, de quem tem vergonha de estar a sentir o que ela estava a sentir naquele momento. As lágrimas eram tantas que lhe molharam os joelhos. E ela chorava silenciosamente ao ler o que me parecia ser uma carta que ela retirara de um envelope. Disse-me mais tarde que tinha sido a mãe a escrever. Tentei ignorar porque achei que aquilo passaria com o terminar da carta. Não só não terminou, como piorou quando abriu um caderno. Não tive como não ver. O caderno estava cheio de orações e com santinhos colados. Pensei para mim “Afinal esta miúda não vai terminar o secundário numa escola americana... é mormon e vai dedicar um ano da vida dela a fazer o que os mormons fazem na idade dela”. Não podia estar mais enganada. Duas tentativas de adivinhar falhadas. Não a podia ignorar. Perguntei-lhe se precisava de ajuda, se havia alguma coisa que eu pudesse fazer. Contou-me que não era a primeira vez que viajava para os Estados Unidos, que já tinha passado uma temporada de 6 meses no final do mestrado. Regressava, agora, para um curso de 4 meses numa prestigiada universidade. Contou-me que chorava de saudade, que tinha passado 6 meses em Portugal depois dos 6 meses nos Estados Unidos. Compreendi-a tão bem. Por melhor e por maior que seja o desafio destas etapas na nossa vida profissional, por mais excitantes que sejam as cidades para onde nos mudamos, por muito que essas experiências enriqueçam o nosso CV, por mais amigos que tenhamos, não há nada igual à nossa casa. E eu, que tenho sempre o coração apertado quando saio de Portugal, arranjei forças onde não as tinha, e tentei convence-la que tudo ia correr bem e que é assim mesmo: a saudade. Essa palavra tão portuguesa e que não se consegue traduzir noutra língua. 


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