domingo, 15 de janeiro de 2012

A saudade


Numa das minhas viagens Lisboa – NY fiquei naqueles lugares que toda a gente ambiciona, que ficam imediatamente a seguir à business class. Consegui pela primeira vez, desde que ando de avião, um desses lugares. São espaçosos e pode estender-se as pernas. Disseram-me, depois, que tive sorte de não apanhar uma família com os seus filhos chorões... mas de facto, isso não aconteceu. Ao meu lado ficou uma menina (julgava eu não ser maior de idade) com aquele aspecto de quem vai fazer o último ano do secundário na escola americana e viver em casa de uma família. Saberia eu depois, que isso também não correspondia à verdade.
Eu sou daquelas pessoas que joga no campeonato dos que quase morrem de medo de andar de avião. Acho desconfortável, temível, incontrolável... acho sempre que é um desafio à natureza.... Mas tento sempre abstrair-me e ocupar-me com o maior número de coisas porque nunca durmo. Tentei uma vez dormir (por indução do sono) há alguns anos atrás. Numa viagem Frankfurt- Xangai viajava com mais 3 amigas e também colegas mas tive o azar de ficar separada delas. Como a viagem demorava 12 horas resolvi tomar 1 victan. Não fez efeito... Na viagem de regresso em vez de 1 tomei 2. Não sei o que aquilo provocou em mim....fiquei num estado tal que achavam que eu tinha morrido, inclusivé, acharam que eu tinha aberto a testa tal foi a força com que bati com a mesma naquelas mesas que abrem no avião... Tudo isto para dizer que a partir desse dia passei a não determinar as acções do meu corpo. Como quase sempre, também nunca durmo na noite anterior a viajar (que novidade... muita gente acha que não durmo, de todo, e que estou acordada em quase todos os fusos horários).  Como, quase sem excepções, não falo com a(s) pessoa(s) que viajam ao meu lado (corroborando a minha fama de anti-social). Desta vez foi diferente. A menina que viaja ao meu lado, chamada R, e que já não era tão menina assim, demonstrava um aparente entusiamo de quem sai de casa dos pais pela primeira vez.  Passados uns minutos do avião ter levantado começo a reparar que a R. está a chorar incontrolavelmente. Não aquele choro histérico, mas um choro silencioso, de quem tem vergonha de estar a sentir o que ela estava a sentir naquele momento. As lágrimas eram tantas que lhe molharam os joelhos. E ela chorava silenciosamente ao ler o que me parecia ser uma carta que ela retirara de um envelope. Disse-me mais tarde que tinha sido a mãe a escrever. Tentei ignorar porque achei que aquilo passaria com o terminar da carta. Não só não terminou, como piorou quando abriu um caderno. Não tive como não ver. O caderno estava cheio de orações e com santinhos colados. Pensei para mim “Afinal esta miúda não vai terminar o secundário numa escola americana... é mormon e vai dedicar um ano da vida dela a fazer o que os mormons fazem na idade dela”. Não podia estar mais enganada. Duas tentativas de adivinhar falhadas. Não a podia ignorar. Perguntei-lhe se precisava de ajuda, se havia alguma coisa que eu pudesse fazer. Contou-me que não era a primeira vez que viajava para os Estados Unidos, que já tinha passado uma temporada de 6 meses no final do mestrado. Regressava, agora, para um curso de 4 meses numa prestigiada universidade. Contou-me que chorava de saudade, que tinha passado 6 meses em Portugal depois dos 6 meses nos Estados Unidos. Compreendi-a tão bem. Por melhor e por maior que seja o desafio destas etapas na nossa vida profissional, por mais excitantes que sejam as cidades para onde nos mudamos, por muito que essas experiências enriqueçam o nosso CV, por mais amigos que tenhamos, não há nada igual à nossa casa. E eu, que tenho sempre o coração apertado quando saio de Portugal, arranjei forças onde não as tinha, e tentei convence-la que tudo ia correr bem e que é assim mesmo: a saudade. Essa palavra tão portuguesa e que não se consegue traduzir noutra língua. 


2 comentários:

  1. 1º És péssima 'adivinhadora'...
    2º Saudade...sentir português...
    3º Concordo contigo: There´s no place like home...
    4ºLast but not least...é bom partir, alargar horizontes a todos os níveis, mas é tão bom regressar...
    5º Gostei do texto, gostei do blog...tens aqui uma apreciadora e crítica! beijokas
    P.S. MORMON???????kakakakakakakakakaaka :-D

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