Quando conheci uma das minhas melhores amigas detestei-a. Tínhamos
amigas em comum. Uns meses mais tarde, as circunstâncias da vida juntaram-nos. Sozinhas, do outro lado do
mundo, ajudei-a, ouvindo-a. E nunca mais nos largamos. Uns anos mais tarde, do
lado oposto do mundo, salvou-me a vida duas vezes. Estes milagres não acontecem
sempre mas estão sempre à espreita para acontecerem. Quero com este exemplo dizer que tenho amigos
improváveis. Sendo eu uma pessoa difícil, e que gosta pouco de muitas pessoas,
os amigos são aqueles a quem eu dei uma hipótese.
Esta amiga é mais distante. Falamos poucas vezes. Geralmente
por emails sucintos, resumidos, bem escritos e curtos, como a vida. Esta minha amiga tem duas das coisas que mais
admiro: escreve maravilhosamente bem e tem um amor imensurável pelos sobrinhos.
Acho que foi isso que me aproximou dela. Para além de outras coisas, isso é o
que mais admiro nela. No resto, partilhamos a timidez. Chegada a casa de mais
uma viagem, leio a confirmação daquilo que andava desconfiada há uns tempos mas
não tive coragem de abordar. A minha cobardia de sempre. A má notícia vinha em
forma de um texto lindíssimo em que fazia a incrível analogia da morte de uma
estrela com o término de uma relação longa. E só ela para escrever sobre
qualquer coisa de forma tão sublime.
M., desculpa expor-te assim, mas se um amor como o vosso
sucumbiu após 10 anos... a esperança fica curta... Dizem que a melhor literatura nasce na dor. E nem imagino
o sofrimento ao escreveres estas palavras que são um soco no estômago, de tão
reais: “...Que morte linda a nossa, meu amor. Que história
mais sublime essa que escrevemos. Quantas coisas e casas e pessoas e dores e
amores dividimos. Como fomos felizes e como existimos (...) Tudo o
que sei é que foram os melhores anos da minha vida...”.
E eu, especialmente hoje, não consigo não estar triste.
Tens-me aqui para te ajudar a levantar, quando conseguires. Espero que te
consigas encontrar, no menor espaço de tempo possível, sem o teu amor. A questão chave é:
como se renasce depois da chama apagar? Mas depois penso: a humanidade tem
futuro. Porque existem pessoas que se respeitam e admiram mesmo depois que uma
relação acaba. Que não esquecem um minuto, que não apagam, que se reconstroem
e reinventam. Não como um fim. Mas como um renascimento. Um dia olharão para
trás e conseguirão sorrir, quem sabe, sem chorar.
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