quinta-feira, 26 de setembro de 2013

O olhar vazio

[Este texto foi escrito no dia 15 de Setembro]


Estou sentada numa das mesas do café do Centro de Arte Moderna (CAM) na Gulbenkian. São 4 da tarde. Tenho à minha frente uma salada com quatro escolhas, uma mousse de chocolate, e para piorar, uma coca-cola. O café do CAM está a abarrotar. Almoços tardios em família, casais de turistas, nenhuma mesa individual, excluíndo a minha.Ao meu lado tenho uma mesa grande, com uma família, com o que parecem ser os pais, duas filhas com os respectivos maridos e os netos. Um dos homens (que só poderá ser genro ou filho) está numa das pontas da mesa e é o único que não participa na conversa. Não sei do que falam, nem acho isso importante. Mantém-se à parte do mundo. O olhar dele é para o vazio. Não está ali. Está distraído no seu mundo. Ele continua à margem. Impecavelmente vestido, cabelo cortado, grisalho, barba de 3 dias, parece-me estar depressivo. Não fala, não partilha, não ri, não demonstra emoção. Só o olhar o distingue dos outros. Imperturbável. O que sente? O que o incomoda? Os mais pequenos foram pegar-lhe na chávena de café e ele não se manifesta. Tem umas mãos lindas, uns dedos compridos, unhas impecavelmente cuidadas. Mexe nas mãos, olha para elas. Provavelmente para se manter à parte, suponho que escolheu estrategicamente, o lugar na mesa. Reparo que não usa aliança. Mas isso não significa nada. Será ele também um dos filhos? Será solteiro? Ou casado com alguém da mesa? Ou divorciado? Levanta-se, caminha cabisbaixo e os pés parecem arrastar-se. Despede-se de algumas das outras pessoas sem entusiasmo. Sai sem eu conseguir perceber a história dele. Sai e eu fico com estas dúvidas que nunca vou desfazer.

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