Muitos (500 investigadores) estarão mais felizes do que
nunca. E dei comigo a pensar que, pelo menos estas dezenas de pessoas, não
terão o coração nas mãos nos próximos anos. Muitos deles já com família
constituída e vida estabelecida em determinado local. E fiquei,
momentaneamente, feliz por eles. Mas depois pensei que em 4000 candidaturas somente
500 tiveram contratos. No meio da alegria de muitos há (sempre) os vencidos. Os
não contemplados. Os tristes. Os esquecidos. Os injustiçados. Não vou analisar
resultados, nem estatísticas, nem fazer críticas, nem dizer que este governo é
melhor ou pior do que o anterior. Vou falar de mim. Porque foi de mim que me
lembrei há quase dois anos atrás quando queria muito ter tido um contrato em
Portugal e não consegui. Eu não queria mais do que isso. Queria o que via
começar a acontecer à minha volta. Investigadores da minha geração que
começavam a ver, e muito bem, as suas bolsas trocadas por um contrato pela
primeira vez na vida. Era tudo o que eu queria. Um contrato a termo, com 14
meses/ano, descontos para a segurança social e (se possível) ADSE. Mas isto, que
eu considerava muito, e muitos acham pouco, nunca tive no meu país. Aos 39
anos, depois de um doutoramento em que passei parte a fazê-lo em Houston, no
Texas, depois de 8 anos de Pós-Doc que
incluíram vários períodos em Columbia University em NY, 10 papers como primeira
autora, 1 projecto em colaboração, não foram suficientes para conseguir uma
posição, digamos, mais estável. A verdade é que o que parece muito currículo
era menos do que alguns dos meus colegas no grupo a que pertencia. Não vou
dizer nunca que foi fácil não ter tido um contrato naquela altura. Nem mesmo o
tempo fez com que me esquecesse. Com a distância de quase 2 anos consigo
compreender que novos caminhos podem surgir. Mas não me apetece relembrar o
quão difícil foi. Os critérios de escolha, mesmo conhecidos, não são nunca
compreendidos pelos que não são contemplados. Somos humanos e não conseguimos
na maioria das vezes separar a razão do coração. E eu, provavelmente, tão bem
como muitos ou melhor do que muitos sei, porque senti na pele o que é não ser
uma das escolhidas quando não existem muitas opções. E é isto que acontece à
maioria dos meus colegas investigadores/ cientistas. Hoje, mais do que nunca estou solidária com
os 3500 que não conseguiram um contrato. E damos connosco, erradamente, a
culpar alguém. A culpar os estrangeiros
que conseguem mais facilmente quando nem o trabalho, nem CV, nem qualidade são
melhores do que os nossos; as pessoas que são apadrinhadas pelas padrinhos
certos e que conseguem ter mais papers em colaboração; os preferidos, não necessariamente os
melhores, que conseguem (mais) alunos de doutoramento...
E depois, concluo que aos 39 anos consegui uma posição
competitiva não só pelo meu CV, entrevista, plano de trabalhos, apresentação, mas também
porque o meu orientador na época apoiou a minha candidatura. Porque esse apoio,
mais do que tudo, mesmo que o nosso desempenho seja perfeito e irrepreensível, será
a chave da decisão final. E expiro de alívio por não ter, hoje mais uma vez, o
coração nas mãos. Mas para isso mudei de cidade, de país, de colegas, de
trabalho. Deixei a minha casa, a minha família, a minha cadela, os meus amigos,
o meu carro e comecei de novo. Do princípio, do inicio, do começo e com tudo o que
ser desconhecida e começar de novo implica. E percebi, sim, à minha custa, que
a crítica sem acções não nos levará nunca a lado nenhum. Porque aquela velha
máxima que aprendemos desde crianças que tudo na vida resulta de acções justas,
não passa disso mesmo, de apenas uma frase como outra qualquer. A verdade é que
uns mais do que outros, dependendo de muitas variáveis ao longo do caminho,
teremos mais ou menos sorte mais ou menos sucesso e que isso dependerá (sempre)
mais dos outros do que nós próprios. E depois, o pensamento foge-me, mais uma
vez, para o futuro. Que no fim deste contrato estarei mais uma vez de coração
nas mãos e tudo começará de novo e de novo e de novo. Até não haver mais
início.
Sem comentários:
Enviar um comentário