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terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Carta de uma desconhecida de Stefan Zweig

A peça começa com a protagonista (Sandra Barata Belo) sentada na primeira fila da plateia, vestida de preto. Simultâneamente, no palco, ainda de cortina fechada houve-se barulhos de bolas de papel atirados ao chão e a coreografia do sofrimento de um homem. Um pianista, vestido de azul, acompanha a peça. A protagonista, começa pelo fim, e diz que o filho morreu. A partir daí há uma analepse e é contada a história de um amor platónico entre uma menina de 13 anos e um homem mais velho e como isso se vai tornando numa obsessão. O que chama a atenção nesta peça, não é o texto, mas a interpretação dos actores, principalmente as duas cenas de sexo. Duas coreografias perfeitas. Violentas. Sincronizadas. Dança pura. Pas de deux. Interpretação. Tudo dito sem palavras. Perfeito. As diferenças significativas entre a primeira noite e quando ele não a reconhece e é (só) puro sexo mecanizado. E no fim de tudo, a morte.











terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Portátil by Porta dos Fundos

Há mais de um mês que tinha comprado os bilhetes. Na altura já ouvira falar que escolhiam uma pessoa da plateia para interagir com os actores. Com o pânico de poder ser a escolhida (já que achava que seriam os actores a escolher), os lugares que comprei não tinham acesso directo nem ao palco nem à plateia. Como seria de esperar, pelo sucesso da Porta dos Fundos, os bilhetes esgotaram rapidamente.

No dia antes do espectáculo vi uma entrevista com o Gregorio Duvivier na Sic Notícias e percebi, que ao contrário do que pensava, a pessoa do público não seria escolhida pelos actores mas seria voluntária.

Como (quase) sempre, não sabia para o que ia. Nem sabia o que me esperava. Pois bem, Portátil é um espectáculo de improvisação com os actores Gregório Duvivier, João Vicente de Castro, Luís Lobianco e Gustavo Miranda e que conta com a ajuda de um pianista. O cenário é simplesmente um tapete branco, uma tela gigante e quatro cadeiras e os actores estão magnificamente vestidos de Gilda Midani. Nos primeiros minutos os actores dizem o que estão a fazer e apresentam-se, arrancando do público muitas gargalhadas:
- Quando era pequeno eu queria ser grande (Gregorio Duvivier)
- Quando eu era criança eu não queria estar na plateia, queria estar no palco (Luís Lobianco).

A partir daí, começam a fazer perguntas à plateia: “quem é português?”, “quem nasceu em Braga?”, “quem tem filhos?, “quem não tem filhos mas gostaria de ter?”... Depois pedem voluntários.

No Theatro Circo, foi escolhida uma senhora de meia idade a quem foi feita uma breve entrevista na qual falou sobre como os seus pais se conheceram, onde vivia, família, trabalho e o seu maior sonho. Este é o ponto de partida para a peça de improvisação que os actores farão ao longo de 60 minutos. Basicamente, a peça será a história daquela pessoa, resumindo a sua vida. A pessoa escolhida em Braga era chamava-se Luísa brasileira, os pais conheceram-se na Ponta do Caju no Rio de Janeiro, o pai era motorista de ministério e a mãe tecelã, o pai era “brabo” feito “siri na lata”, adorava brincar no milharal, em criança tinha um amigo imaginário, era apaixonada pelos personagens de Monteiro Lobato, era aposentada mas trabalhou como funcionária pública, o maior defeito era dormir muito e acordar tarde e a maior virtude era o senso de localização (como um pombo), era turista em Braga e estava acompanhada pelo genro, o seu maior sonho era voar.

Eu estou a escrever este texto e estou a rir à gargalhada. Eu não me lembro da última vez que me ri tanto como nesta peça. A minha opinião: quem tiver oportunidade, assista. O dinheiro mais bem dado dos últimos tempos.


Sobre o Theatro Circo, Gregorio Duvivier disse ser o “teatro mais bonito do planeta”. 




quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Uma noite na lua

Conhecia o Gregorio Duvivier do “Porta dos fundos” e do evento “Minha língua, minha pátria”, organizado pelo jornal Público em São Paulo, numa conversa com a Matilde Campilho. Ontem, quando fui ver “Uma noite na lua”, sabia apenas que era um monólogo. Nada mais. Chegámos em cima da hora e os nossos lugares eram na primeira fila. Começou pontualmente às 9:30. Tudo escuro e apenas fumo. Depois, a luz ilumina-o. Só isto. Ele vestido de fato, gravata, um sobretudo e um chapéu. E a luz. O cenário é só isto. Minimalista. E durante minutos a frase que ele mais repete é: “Sou um homem em cima do palco pensando”. Nestes minutos ouço muita gente a rir-se. E eu, entre a surpresa de ouvir risos e não perceber porque é que eu não tinha vontade de rir, comecei a achar que o defeito era meu. O resto, é uma interpretação incrível. Fenomenal. Magnífica. A iluminação e a interpretação são quase tudo nesta peça. O tema é tão simples como a luta para reconquistar uma mulher, a Berenice. E mais do que a vontade com que ficamos de nos apaixonar é a vontade de ser uma Berenice por quem este personagem é tão devoto. Que loucura é estar apaixonado e ser deixado. Que doença é essa que não nos larga, que só vemos o objecto de adoração. Tudo pára. Ou tudo parece parar. Nada importa. Só captar a atenção dela, a Berenice. Dudivier canta, dança, grita, deita-se no chão, imita o som do telefone e do aspirador e da música. E quando termina parece ter saído de um mergulho, embora não existisse água em palco. O cepticismo inicial e a surpresa dão lugar a um grande sorriso. Não acredito que alguém tenha saído defraudado. Mais que não seja que o amor é o grande veículo do mundo. Toda a gente sai de coração cheio.

Copyright: Gregorio Dudivier



terça-feira, 17 de março de 2015

Mísia no Theatro Circo

Braga, 6 de Março de 2015

Eu, ignorante em música, confesso-me. Tenho 35 anos, vivo entre Braga ("O penico do mundo"), NY ("A grande maçã") e Lisboa ( "A grande alface") e menos por outros lugares do mundo aos quais se chegam pelos ares. Considero-me instruída. Dizem que leio muito. Tenho um doutoramento. Viajo muito. Já estive em todos os continente excepto na América do Sul. Durmo muito pouco. Por isso, penso muito. Quase não oiço música. Leio todos os dias os jornais portugueses e New York Times. Leio todas as semanas o Expresso. A única rádio que oiço, quando oiço, é a TSF. Quase não vejo TV. Tudo isto para dizer que apesar de tudo o que mencionei, nunca tinha ido um concerto da Mísia. Ontem foi a primeira vez!  Não encontro uma explicação razoável, nem desculpas coerentes. Digo apenas que é uma vergonha este facto. Mas, como o ditado, mais vale tarde do que nunca. E nunca uma frase combinou tanto com uma situação. 

Ontem percebi o que perdi nestes anos todos. Não tinha qualquer expectativa. Fui ao concerto porque era indesculpável que uma pessoa como eu que já fez loucuras para ver uma ópera, um ballet ou uma peça de teatro, que já pagou fortunas para estar num determinado dia em determinada cidade, que conheceu quase todas as pessoas portuguesas e estrangeiras que queria conhecer, não tivesse visto um (que fosse) concerto da Mísia. Esta cantora mais conhecida fora do que dentro do país. Esta pessoa que eu nada sabia ou conhecia para além de estar sempre impecavelmente vestida e penteada, uns cortes de cabelo contemporâneos, que cantava uns fados. Como a maioria das pessoas, e sem nenhuma razão plausível, achei que morava fora de Portugal. Talvez em Paris, no meu imaginário. Ouvi, repetidas vezes, tempos a fio, até à exaustão um fado na voz dela, que até hoje não sei se é das suas músicas mais conhecidas: "O Corvo" ("Tenho um corvo à flor da pele/ vive de uma ferida aberta/ acorda quando me deito/ levanta voo do meu peito/ sempre sempre à hora certa/...entra pela minha vida/ como a lua num jardim / pendura tudo o que valha/ no gume de uma navalha/ traz-me pedaços de mim/ tenho um corvo à flor da pele/ um irmão da minha idade/ acorda quando me deito/ levanta voo do meu peito/ diz que se chama saudade").

Um piano e uma voz. É assim este concerto. Um maestro (Fabrízio Romano) que tocava tão bem que parecia cantar com as mãos. Belíssima performance. Mísia introduziu cada música com detalhados monólogos. Delikatessen Café Concerto é um jantar em tempos de crise que Mísia imaginou um dia que estava em casa. As músicas são sobretudo das décadas de 50 e 60. Começou com a primeira canção do disco Fado do ciúme. As histórias que foram descrições de acontecimentos reais como a coincidência de ter encontrado num alfarrabista telegramas de artistas dessa época. Contou também a história  do poema de Tiago Torres da Silva sobre o altar que tem em casa com santos de todas as partes do mundo. Confessou-se agnóstica mas que acha que aqueles santos, rodeados por fotos da família e amigos, põem-se todos de acordo e protegem-na. Falou também de um poeta espanhol que morreu na prisão e nunca chegou a conhecer a filha e que para ela fez uma canção de embalar: Nanas de la cebolla. Destacou os amigos Eduardo Prado Coelho e Vasco Graça Moura que diz fazerem-lhe muita falta. A segunda parte do concerto, na qual mudou de roupa, virou-se para o fado: Que fazes aí Lisboa?, Sem saber. O poema Veste de noite este quarto foi escrito por António Lobo Antunes para o cantor Vitorino Salomé. Mísia perguntou se sabíamos quanto tinha ficado o jogo Braga-Porto. Disse não se interessar por futebol nem saber deste jogo mas que quando chegou perguntou “Onde está o público?”. Mas apesar de a sala não estar cheia, para ela, é como se estivesse. E, por isso, foi longamente aplaudida. Duas das músicas com que terminou, entre elas Espelho quebrado, fazem parte do disco que será uma homenagem a Amália. Será lançado no outono e chamar-se-á Para Amália. Fez um demorado elogio a Amália, não só como cantora e intérprete, mas como grande talento para a escrita de poemas e a sua contemporaneidade (mais do que Edith Piaff e Billie Holiday)

Descobri uma cantora totalmente desconhecida para mim. Diz-se tímida. Mas tem um humor judeu que adorei. Ama os poetas e os poemas. O poeta que mais cantou foi Vasco Graça Moura (que eu tanto gosto e que fez a tradução brilhante e que eu conheço do livro Divina Comédia de Dante). Cantou o meu querido António Lobo Antunes. No intervalo das músicas conversa. Conta histórias. Não sei se foi improviso. Eu prefiro acreditar que sim.

Eu prefiro fingir acreditar na desculpa para o concerto estar meio vazio foi de coincidir com o dia e hora de um jogo Braga-Porto. As "mentiras piedosas", como Blanche Dubois chama-as no Eléctrico chamado desejo de Tennessee Williams. Porque será que eu sempre tive capacidade para decorar falas de diálogos de livros e nunca tive capacidade para decorar matéria quando era estudante? Alguma explicação científica deve haver para este fenómeno

Terminou com um agradecimento ao público que para ela encheu a sala, a transbordar.O encore foi somente com Lágrima de  Amália, que para mim é tristíssima. Dedicou-a ao seu fiel amor, o público. Aplaudida de pé, mais uma vez, como bem mereceu. A sala não estava cheia nem perto disso. Mas o entusiasmo era o equivalente.


Estava na primeira fila. Esperei um pouco para as pessoas que estavam atrás de mim, agora à frente, saíssem. Quando vejo a Adriana Calcanhotto. Se não fosse verdade diria que estava a alucinar. Encontrá-la por mero acaso, em duas cidades diferentes, no espaço de duas semanas, em locais que não era os concertos dela,  qual seria a infinitésima possibilidade? Tento passar despercebida por ela. Prefiro que não me reconheça. Eu e o meu medo de os outros acharem que o meu desconforto é directamente proporcional ao deles, nestas situações. A evitar, por isso. Eu, que tenho capacidade social de uma criança tímida de quatro anos. Sim, quase um bicho do mato. Ultrapasso, o melhor que posso, esta "pedra no caminho". Vou comprar o último CD  da Mísia Delikatessen Café Concerto que não tinha encontrado em lado nenhum em Braga, Guimarães e Lisboa. Mas que a Mísia tinha-me dito que estaria disponível para venda no Theatro Circo. E já que ali estava, eu e o CD, num concerto que adorei e que não sabia quando se iria repetir. Dei um pontapé, a custo, à minha timidez e vou aos camarins. Esta sim, a verdadeira situação constrangedora. Se há situação constrangedora é esta. Estar ali à espera de falar com uma pessoa que não nos conhece, a quem vamos dizer umas palavras amáveis e gentis, iguais às dezenas de outras pessoas. Que vamos ser apresentadas, mas que se for como eu, no dia seguinte não se lembra do que comeu na refeição anterior. Quando cheguei ao camarim, a Adriana estava a despedir-se da Mísia. Eu não lhe queria dizer nada para além dos parabéns pelo magnífico concerto. A Mísia assinou- me o CD que eu vou ouvir até enjoar no carro. E eu desci no elevador e pelos labirínticos corredores do Theatro Circo. 




quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

"Doze homens e uma sentença"

Ontem fomos eu, a A. e a J. ver a peça "Doze homens e uma sentença" ao Theatro Circo.

A peça começa com a reunião de 12 jurados pela absolvição ou acusação de um jovem de 16 anos que presumivelmente matou o pai com uma facada no peito. Os 12 jurados reúnem-se em volta de uma mesa e começam com uma votação de 11 a considerarem o réu culpado e apenas um a considerá-lo inocente porque não tem certezas. Esta peça é um surpreendente exercício de argumentação.

O calor escaldante que se faz sentir faz os jurados limpar o suor frequentemente do rosto dos 12 homens trancados numa pequena sala com apenas mesa, cadeiras e água. O veredicto tem que ser unânime.  Se os jurados considerarem o réu culpado do assassinato do próprio pai, será executado na cadeira eléctrica, mas se um deles tiver uma dúvida razoável a respeito da culpabilidade, o filho não poderá ser condenado e regressará assim às ruas.

São quase duas horas de acesas discussões, muitos gritos, muitas demonstrações, muitos argumentos e que nos deixa com uma dúvida: os jurados, com todas as provas apresentadas em tribunal têm a certeza absoluta que o jovem é culpado?


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