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terça-feira, 22 de agosto de 2017

Uma declaração política (ainda) necessária no séc. XXI

Há uns anos, Alexandre Quintanilha disse numa entrevista a Anabela Mota Ribeiro: “Pensei muito sobre se devia dar esta entrevista ou não, porque não tenho que explicar rigorosamente nada. As pessoas são aquilo que fazem e aquilo que são, e não aquilo que dizem. Há uma pequenina coisa que é muito importante: a questão dos role models. [...] Temos que nos reinventar e dar a noção a outros gay de que isso é possível, realizável. É preciso que o mundo à nossa volta perceba que não me acho especial, positiva ou negativamente, por ser assim. Tive muita sorte em encontrar uma pessoa como o Richard, tive muita sorte em ter os pais que tive, em viver nos sítios onde vivi, apesar de às vezes me sentir muito só e de ter momentos muito difíceis de afirmação pessoal. Isso também é uma história que vale a pena divulgar. Numa sociedade que está cada vez mais competitiva, é importante as pessoas falarem daquilo que não é competição selvagem. É a partilha, é sentirmos – isto parece uma treta... – que o mundo, se tivermos boa vontade, e se funcionarmos de boa fé, vale a pena”. É por estas palavras que (ainda) acho que declarações políticas como as da Secretária de Estado da Modernização Administrativa são tão importantes.

Palmas para a Graça Fonseca que falou “mesmo de tudo”.

A Graça é o exemplo da pessoa que deve estar na política. Chegou tarde mas dá-lhe o seu melhor. Uma pessoa inteligente, competente, bem formada, sóbria, discreta, honesta e “militantemente optimista” é o que destaco dela. Esta entrevista só lhe acrescenta a dimensão humana que eu já tinha. Tendo (tantas) qualidades, e o seu o percurso profissional exemplar, destaca-se ser a primeira mulher da política portuguesa a assumir-se como homossexual.

No séc XXI não devia ser notícia, de facto, até porque em Portugal o casamento e a adopção são permitidos a todas as pessoas sem  descriminações.  Mas num século em que ainda são mortas pessoas por amarem alguém, estas palavras da Graça, devem ser lidas e viralizadas: “ ... se as pessoas começarem a olhar para políticos, pessoas do cinema, desportistas, sabendo-os homossexuais, como é o meu caso, isso pode fazer que a próxima vez que sai uma notícia sobre pessoas serem mortas por serem homossexuais pensem em alguém por quem até têm simpatia. E se as pessoas perceberem que há um seu semelhante, que não odeiam, que é homossexual, isso pode fazer que a forma como olham para isso seja por um lado menos não querer saber se essas pessoas são perseguidas, por outro lado até defender que assim não seja”.

E depois temos palavras como as do Carlos Abreu Amorim que, infelizmente, é Vice-Presidente do Partido que eu um dia simpatizei: Não demonstra coragem, diferença ou novidade. Só exibe que não tem mais nada para dizer. [...] Quando um governante dá uma entrevista é porque tem alguma coisa importante a dizer ao país. Deve ter mensagens políticas acerca daquilo que fez e faz, sobre os seus planos para o futuro. Não age bem um governante que apenas fala de si, que usa a entrevista para tentar projectar-se a si mesmo, a sua vida privada e a sua sexualidade, como uma espécie de modelo de comportamento público”. A sério que o Carlos Abreu Amorim escreveu que a Graça Fonseca quis projectar-se?

O PSD precisa mesmo, muito mesmo, de uma limpeza. Devemos nunca esquecer que foi Sá Carneiro que dizia que se a Snu Abecassis (por quem assumiu publicamente o seu amor e só não se casou com ela porque não lhe foi dado o divórcio) não fosse convidada ele não ia. Assim sendo, 36 anos depois da morte de Sá Carneiro, este reaccionário dizer frases destas, é insultuoso. Desde quando é que num mundo, onde ainda morrem pessoas por assumirem a sua homossexualidade, é visto como propaganda pessoal? Depois há os que se calam e não comentam. 

Mas depois, felizmente, ainda há pessoas do PSD como o Carlos Moedas, que actualmente é Comissário Europeu da Ciência, Investigação e Inovação, com estas palavras: "A coragem da @gracafonseca é importante para os que lutam por uma sociedade mais justa. Obrigado Graça."

O que eu espero? Já que temos um investigador da geração de 70 que é Ministro, espero ver em breve uma mulher, que também já foi investigadora, e da geração de 70 chegar brevemente a Ministra. Go, go, Graça!



Copyright: Jorge Amaral/ Global Imagens

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

A volta a Portugal Simplex

A sessão está marcada para as 9:30 no GNRation. Um edifício lindíssimo visto de dia. Eu, que apenas o tinha visto de noite, não me recordava o quão labiríntico era. Algumas escadas e corredores depois, eis que chegamos à box. Uma sala preta que parece realmente uma caixa. Apesar de ser um edifício novo, está um frio "de congelar passarinhos nas árvores". Passam 10 minutos da hora marcada, eu atrasada, como (quase) sempre, mal entro na sala, cruzo-me com a Chefe de Gabinete do Presidente da Câmara de Braga (CMB) que conheço de outros mundos. Ao longe, vejo a Secretária de Estado (ainda de pé) com o Presidente da CMB. A sala praticamente vazia. Aqui nem dá para empregar as simpáticas frases "meio cheia/ meio vazia". Sento-me nas filas de trás, a imitar os meus tempos de estudante. A sessão começa com o Presidente da CMB e passa rapidamente à Secretária de Estado que está ali mais para ouvir do que falar, nas suas próprias palavras. Na plateia estão maioritariamente homens com idades para serem meus pais. Devem ser, pelo aspecto, empresários, representantes de empresas e associações. Mulheres, poucas. Na plateia vejo também o autarca omnipresente da cidade berço. Aquela pessoa, que em qualquer evento no distrito de Braga e arredores, está sempre lá. Fiquei a saber que trabalhava para o privado e que tirou licença sem vencimento para se dedicar à causa pública. Eu não imaginava que um tipo da minha idade, com uma licenciatura em Filosofia na Faculdade onde entravam todos aqueles que não conseguiam entrar na UM (por não terem notas) se licenciavam, podia ter 10 anos de privado. Estão também autarcas de Barcelos e Póvoa do Lanhoso. 

Eu que não entendo nada de leis, empresas, números, e afins, parecia estar a ouvir chinês. Mas gostei de uma intervenção de alguém do Grupo Casais a apontar alguns problemas. Vou resumindo por pontos as coisas que gostaria de ver melhoradas mas inibo-me de falar porque aquela não é a minha plateia. Iriam achar chinês o que eu tinha para dizer. E provavelmente não achariam piada ao meu humor judeu. E como no início foi-nos dado um questionário, optei por escrever. Dizem que escrevo melhor do que falo. Assim fiz. A Secretária de Estado bem disse que só tinha que estar em Lisboa às 8 da noite e que tinha todo o tempo do mundo. Não resultou. 

Vou resumir o que me ocorre dizer. A iniciativa "Volta a Portugal Simplex" é louvável. Não sei de quem foi a ideia mas conhecendo o historial político da Secretária de Estado na Câmara de Lisboa, apostaria que a ideia foi dela, ou no mínimo, apoiada por ela. Graça Fonseca, como Vereadora da Câmara de Lisboa, não conheço ninguém que a critique. O que já ouvi foram críticas ao facto de ter saído da CML e às mudanças que já são perceptíveis. Jovens criadores e empreendedores já começaram a queixar-se. Mas eu defendo que se se tiver de sacrificar uma autarquia em favor do país, esse é o caminho.  E esta parece ser a grande arma do governo: algumas pessoas muito competentes. É verdade que o número de mulheres que integra o governo é diminuto. Mas nunca fui favorável às cotas. A competência desta Secretária de Estado, eu posso atestar. E depois não sei qual a receita: sempre com uma energia inesgotável, curiosa, interessada. Não está ali apenas para marcar presença. Questiona. Comenta. É acessível. Regista. Aponta. Tem humor.

Totalmente livre. Aberto a toda a gente. Sem necessidade de inscrição. First come, first served basis. Podia de facto estar mais gente e mais jovens mas acredito que o resultado desta volta será visível. Muitos cidadãos, em cidades diferentes, "criticam" as mesmas coisas.

Os maiores problemas da máquina do Estado, na ninha opinião: burocracia, papéis e presença física. O que proponho: um portal que englobe o máximo número de acções, funções, ministérios. Tutoriais explicativos de como se abre uma empresa ou como se preenche um IRS, por ex.

Para um concurso público é necessário requerer (sempre) um registo criminal. Como é que isto se faz? Pessoalmente no tribunal que funciona das 9 às 3 com intervalo de almoço. Não seria mais fácil haver a possibilidade de ser emitido online?
Emissão de passaporte: se há a possibilidade de um passaporte ser emitido num dia qual a razão de ser, habitualmente, emitido numa semana? 
Votação de quem está no estrangeiro. Qual a necessidade do registo ter de ser feito 6 meses antes? E qual a razão do voto ter de ser feito presencialmente na Embaixada? Não pode haver uma solução online? Por este motivo, nos últimos 10 anos votei metade das vezes que devia!

Conheço (mais ou menos bem) o trabalho da Secretária de  Estado como Vereadora na CML. Sei que muitas das coisas bem feitas em termos de industrias criativas, orçamento participativo, ensino de programação nas escolas, alimentação saudável, startup Lisboa, Village Underground, só para dar alguns exemplos, têm o seu cunho pessoal. Além de todos os talentos, como conciliar opiniões, exaltar o bom e dar pouco valor ao negativo, ter um optimismo invencível, uma energia contagiante, escreve bem e fala (ainda) melhor.

As cores saudáveis da Secretária de Estado no inverno de Braga pareciam mais de quem se dedica ao ski nas montanhas suíças ao invés de fazer a "Volta a Portugal Simplex" fechada em auditórios a ouvir pessoas. Estas devem ser as cores de quem gosta (muito) do que faz. Queremos a receita.

Num dos discursos de atribuição do OP nas Escolas, no qual participaram crianças, destacou a importância de escolher e participar, que a decisão depende da vontade da maioria. Que é essa, afinal, a razão maior do voto. Isto, assim, dito às crianças. A importância do voto. Alguns conceitos como este, que no futuro será a arma de cada um, pode ser explicado gradualmente. É assim que se criam futuros cidadãos interessados. Ensinar às crianças coisas tão importantes como o voto, que no futuro, decidirá o caminho de todos nós. Daí que eu termine este texto com um reparo. Andamos na escola até ao 12º ano, se não estou em erro, a escolaridade obrigatória, e nenhuma das disciplinas nos ensina a ser cidadãos. Nenhuma disciplina nos ensina a preencher o IRS. Depois vamos para a Universidade e quem não for para as Economias ou Direito continuará sem saber fazê-lo. E depois aos 30, defendemos o doutoramento, conhecendo todos os continentes, tendo passado e sobrevivido a várias provações da natureza, sabendo mais a cada dia... Mas não sabemos preencher o IRS. Eu, ignorante, confesso-me!

Depois da sessão ainda houve tempo para visitar a StartUp Braga e o Balcão Único. Não conhecia nenhum dos dois. Retenho, no edifício do Balcão Único, os candeeiros no tecto de bom gosto que me fizeram lembrar os que existem na Vida Portuguesa no Intendente.

E agora mesmo para terminar, uma história. O Oliver Sacks, um dos nomes maiores da neurologia, que era um fanático por botânica, por fotografia, por livros e por muitas outras coisas que não incluíam medicina, passou a vida a ouvir e a investigar as histórias dos pacientes. Na adolescência teve um professor perspicaz que disse: "O Sacks vai longe, se não for longe demais". Apesar de não ser vidente, (quase) nunca me engano (mas tenho muitas dúvidas, ao contrário do outro), acho que a Graça Fonseca vai chegar longe. E pessoas competentes e bem formadas assim é que nos fazem acreditar que nem todos na política são iguais. Go, Doc!

Copyright:Sérgio Freitas




sábado, 4 de outubro de 2014

Liberdade e digital: a perspectiva empresarial

3 de Outubro. O 3º Encontro Presente no Futuro da Fundação Francisco Manuel dos Santos começou, para mim, com o debate "Liberdade e digital: a perspectiva empresarial". Muito bem moderado pelo Luís Pedro Duarte (que eu não conhecia) que é o director financeiro da Accenture. O painel era constituído pela Graça Fonseca, licenciada em Direito, Mestrado e Doutoramento em Sociologia, vereadora da Câmara Municipal de Lisboa com os pelouros de Economia, Inovação, Educação e Reforma Administrativa.

Gonçalo Morais Leitão entertainer, que já fez de tudo um pouco: animador, homem-sanduíche, porteiro, publicitário, até que encontrou a profissão com que sempre sonhou depois de um curso de apresentador e começar na  Sic Radical o programa Filho da Pub.

Eugénio Apolo formado em programação, já foi professor, programador e já participou em vários projectos relacionados com internet até que chegou o momento de criar o cryptoescudo (a moeda portuguesa electrónica). Actualmente dedica a totalidade do seu tempo na gestão desta moeda virtual. Diz que a moeda electrónica pode ajudar a pagar a dívida do país. “Há quem pense que o cryptoescudo podia ser a nova moeda oficial portuguesa”. “Um cryptoescudo está a quase nada, o que é a parte interessante da coisa, só pode melhorar”. Recuso-me a fazer comentários sobre estas afirmações porque ainda vou ser acusada de difamação.

Tinha que escolher esta sessão e “A liberdade constrói-se?”. Como faço sempre más escolhas, decidi-me por esta. Só conhecia a Graça Fonseca e como foi a única que falou alguma coisa de jeito (para além do moderador), o entusiasmo e o optimismo que carrega nas palavras, já valeu a pena. Falou-se do caso de sucesso da STARTUP LISBOA (que criou 900 postos de trabalho), da qual é presidente, e que resultou de uma proposta do orçamento participativo. Foi uma das propostas mais votadas de 2009 (pelos vistos, nem sempre o povo escolhe mal). Falou que o objectivo da CML não é ser empreendedor porque esse não é o papel das entidades públicas, mas criar as condições para que as pessoas possam empreender: encontrar parceiros, espaços e sobretudo, confiança. Referiu, também, que as crises têm sempre um lado bom: “Estas são alturas em que as entidades públicas e privadas têm que reconfigurar para as ideias que estão a surgir e para pessoas que querem ousar”.  Falou-se também dos estrangeiros que a STARTUP LISBOA atrai. “os portugueses são óptimos a não gostar do que temos e os estrangeiros são óptimos a gostarem imenso do que temos”. As decisões que as pessoas tomam no que respeita a mobilidade tem a ver com a qualidade da cidade, segurança, equipamentos para os filhos, acessos fáceis e qualidade das infraestruturas. Terminou a sugerir duas coisas: 1) introduzir nas escolas a obrigatoriedade das crianças para programar nas escolas (Graças a Deus que já acabei a escolaridade obrigatória!!!); 2) jovens desempregados licenciados por ex em História e aprenderem a programar. Graça Fonseca mostrou que tem humor e soube falar claro e inteligentemente no meio de pessoas que não estavam ao nível dela.



A única coisa que o Gonçalo Morais Leitão disse de jeito foi que em época de crise é uma boa altura para se questionar tudo. Mas depois veio com a pergunta retórica de quem é que naquela sala continuava a fazer o que fazia se lhe saísse o euromilhões. No caso dele, que foi simples diga-se, descobriu o curso que tinha que fazer na net (?), contactou o Pedro Boucherie Mendes (director da Sic Radical) por email...é o que se pode chamar de “gajo com sorte”. Vamos lá todos questionar o que fazemos, não ligar para o dinheiro, tirar um curso na net e fazer uns contactos por email. Acabaríamos todos indigentes! Neste caso particular (que deve ser menor do que a prevalência de doenças raras no mundo), o digital foi a “única” forma de alcançar o sucesso. “O dinheiro é importante mas mais importante é fazer aquilo que se gosta”. 


Copyright: CML

quinta-feira, 17 de abril de 2014

A cool Vereadora de Lisboa: da investigação à política

Graça Fonseca. 42 anos. Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa para a Economia, Inovação, Modernização Administrativa e Descentralização. Licenciou-se em Direito na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Foi assistente de investigação do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, integrada no Observatório Permanente da Justiça Portuguesa na área de direito de menores e família, tendo aí concluído o mestrado em Sociologia do Direito. Trabalhou aí com José Manuel Pureza, Boaventura Sousa Santos, João Pedroso e Maria Ioannis Baganha. Passou pelo Brasil, Washington D.C. (Georgetown University), Coimbra e Cabo Verde. Infelizmente, a orientadora Maria Ioannis Baganha, não viveu para vê-la defender a tese de doutoramento. Doutorou-se em Sociologia pelo ISCTE-IUL em 2010. Dá um semestre de aulas, que é o que consegue. Falou de acreditar no projecto de António Costa, que acompanha desde o Ministério Justiça. Low profile. Pontalidade britânica, tão pouco portuguesa. Sem gravação nem notas. Somente a cábula das perguntas estritamente programada para uma hora, que por princípio cumpriria à regra. Como não sou jornalista nem para lá caminho, a atrapalhação levou-me a começar pelo fim. Não posso ainda falar daquilo que deu início à conversa, mas ao contrário daquilo que esperava, aquela mentirinha piedosa tão portuguesa “vamos ver o que se pode fazer” ou “talvez”. Não, nada disso, a resposta foi um sincero não. E eu aprecio isso nas pessoas. Sinceridade. Um não é um não e passa-se à frente. Ninguém corta os pulsos por isso. Os meus óculos  haviam ficado no táxi, valeu-me o tamanho da letra. Está cansada. Confidencia-me que o dia começara cedo, às 8 da manhã. Passa pouco das 7 da tarde. Olhos muito verdes. Aspecto de quem já aproveitou o sol de Lisboa ou a praia na tímida Primavera. O cansaço só se nota nos bocejos. iPhone em cima da mesa mas pouco ou nada olhou para ele, ou se o fez, não notei. Também me pareceu nunca ter olhado para o relógio. Um caderno A5 da Emílio Bragaportuguês, fechado, garrido, em tons de vermelho. Lá fora o céu de Lisboa, sem vista para o Tejo. Mas a sala onde falamos já valeu a pena. Elogiei a sala. Pouco funcional, nas palavras da própria. Enorme, como o rio, diria eu. A um canto, pendurada, uma portuguesíssima mala da Ideal&Co. Conversa informal. Uma hora au point. Quando questionada sobre a razão pela qual mudou da academia para a política respondeu que “quer marcar a diferença” e fazer várias coisas ao mesmo tempo. Abraçar projectos e desafios. É isso que a move. Nunca se importou com cargos. Isso não importa. Apetece fazer a analogia com o escritor que é a imagem de Lisboa (ou será Lisboa a imagem do escritor?): “Não sou nada/ Nunca serei nada/ Não posso querer nada/ À parte disso, tenho em mim todos os sonhos do mundo”. As palavras são sempre de optimismo, mesmo quando provocada. Diz que existem pessoas extraordinárias na política portuguesa. E que há muitos “Miguel Relvas” em todos os quadrantes da sociedade. Não insulta, não injuria, não há uma palavra amarga. Só boas palavras e optimismo. Hoje é melhor que antes. Salienta que há coisas muito boas mas que os portugueses gostam de exagerar o lado negativo. Fala claro e detalhadamente. Quando lhe falo de cargos de nomeação e de confiança política, insurge-se (pacificamente) e relembra-me que foi eleita. Não acredita que não haja meritocracia, na maioria dos casos. Defende Portugal fervorosamente. Percebe-se que é uma optimista, apesar das minhas provocações. É daquelas pessoas para as quais o copo está sempre meio cheio e não meio vazio. Fala-me que quando era criança havia racionamento de comida em Lisboa. Havia muito analfabetismo e a maioria tinha a 4ª classe. Temos apenas 40 anos de democracia. As mudanças demoram décadas a notarem-se. E de repente, estamos no séc XXI, somos da mesma geração e temos ambas doutoramento. Fala com conhecimento de causa de todos os projectos. Percebe-se o orgulho daquilo que ajudou e ajudará a construir. Refere que há duas ou três start up que muito em breve vão dar que falar na área das ciências. Falamos de mecenato e filantropia, coisa pouco comum em Portugal. Quando, mais uma vez provocada, diz achar legítimo que as empresas queiram algo em troca quando financiam projectos. São empresas. Nunca critica. Levanta a questão de como podem as PMEs contratar doutorados quando a média da escolaridade dos superiores é o 9º ano. Falamos do rio por onde partimos para descobrir novos mundos. Da luz, do clima, dos museus, dos preços e das condições únicas de Lisboa. Nunca há uma só resposta. As respostas são demoradas e argumentativas. Soube há pouco tempo através da FLAD que Lisboa ficava lugares abaixo do Azerbeijão1 no que respeita a estudantes americanos escolherem cidades para estudar. Tentou inverter isso. Terminamos às 8, como combinado. Um jantar oficial esperava-a. Acompanhou-me à majestosa escadaria com o “Coração Independente” da Joana Vasconcelos. Eis o retrato de uma política que já foi investigadora. Sabe do que se fala quando se pronuncia a sigla FCT e afins. É a antítese da opinião que a maioria dos portugueses têm (infelizmente) em relação aos políticos. É também uma política que não se põe fora dos políticos e tem orgulho disso. Hajam muitas Graça Fonseca que só dignificam a nobre causa política. Este é um texto sobre o que retive, o que esqueci era acessório. O simples tão difícil.

1Exemplo ilustrativo

Copyright: Graça Fonseca

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