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quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Prémio Bottari Lattes


No sábado, 20 de Outubro, no Castelo Grinzane Cavour, numa cerimónia que começou às 4:30 da tarde foi entregue o prémio Bottari Lattes a António Lobo Antunes numa cerimónia pública. Vindos dos liceus de toda a Itália, a plateia estava repleta de jovens leitores.

No discurso de agradecimento do Prémio Bottari Lattes no valor de dez mil euros disse: “Quero agradecer este prémio que me deu muito prazer de o vir receber aqui e encontrar pessoas que foram, para mim, de uma delicadeza e de uma elegância que não vou esquecer. Se há coisa que eu admiro nas pessoas é a elegância da alma. E isso encontro aqui, até na beleza da vossa língua, que me faz imensa inveja, porque se eu escrevesse em italiano poderia, certamente, chegar mais longe. Quero, sobretudo, agradecer a forma como receberam, atrevo-me a dizer que com ternura e amizade. Como estava sempre a dizer um grande amigo, que tinha idade para ser me avô: “Olha miúdo, só há duas coisas no mundo que valem a pena: o amor e a amizade. O resto é uma merda”.

Ainda houve tempo para uma pergunta i: “A sua prosa tem uma força poética excepcional. Qual é a sua relação com a poesia? ”.“A mim parece-me que a distinção entre poesia e prosa está em vias de acabar. Não faz muito sentido. Lembre-se que às Almas mortas de Gogol se chamou de poema e Nabokov chamou ao seu poema romance. Toda a arte tende para a poesia. A poesia pode muito mais do que a prosa. Eu muitas vezes não sei o que estou a escrever nem a ler. Se pensar em Bashô, poeta japonês, tem um poema que é assim: “ Os quimonos secam ao sol/ Ai as mangas pequenas/ Da criança morta”.  Uma vida inteira está aqui em meia dúzia de palavras.

Quando Antonio Lobo Antunes recebe das mãos da mulher de Mario Lattes agradece-lhe, muito educadamente, e como um cavalheiro como poucos, faz-lhe uma pequena vénia com a cabeça e beija-lhe a mão.









copyright: Fondazione Bottari Lattes






copyright: Fondazione Bottari Lattes





terça-feira, 23 de outubro de 2018

Lectio Magistralis

Entro no Teatro Sociale  Giorgio Busca a poucos minutos da hora marcada. Sala bonita, parecida com o Teatro Nacional S. João. A plateia está cheia e como só restam lugares longe do palco opto por um dos camarotes. Muitos intelectuais, muitos jovens, muitos adolescentes. A mulher está sentada na segunda fila.

No palco está apenas uma cadeira e uma pequena mesa. António Lobo Antunes (ALA) entrará daí a poucos minutos para iniciar a Lectio Magistralis do prémio Bottari Lattes do qual foi o vencedor de 2018. A cerimónia de entrega será no dia seguinte no Castelo Grinzane Cavour, Património Mundial da Unesco.

Quem apresenta António Lobo Antunes descreve-o como "muito conhecido em Itália, na Europa e no mundo". O teatro repleto numa cidade pequena como Alba é o exemplo disso. Continua com a introdução da biografia de ALA, destacando a sua formação como médico psiquiatra, principalmente a sua experiência como médico na guerra em Angola "o Vietname português". Seguiu-se a bibliografia, com o apresentador a mostrar-se um conhecedor da obra, sem necessitar de ler para destacar cada um dos livros traduzidos. Elogia a ligação de ALA à literatura e ao cinema italiano e a narrativa inovadora. Destaca a imaginação de ALA, e os cenários dos seus livros, Lisboa e África ficcionadas, realidades que não existem. Há também uma pequena leitura do livro "Não é meia-noite quem quer", o último livro traduzido em Itália. 

António Lobo Antunes entra no palco debaixo de estrondosas palmas. Andar arrastado. Os anos têm visivelmente passado por ele e deixado marcas, fisicamente. Começa a falar com uma voz inaudível em português. Tem tradução simultânea. 

Começa por dizer que não fará nenhuma Lectio Magistralis. E o monólogo inicia-se pela sua relação com os livros aos 3/4 anos. Aprendeu a ler muito cedo. Divaga entre a morte, tratada como desconhecida, e os livros que começou a ler, desde Oscar Wilde a livros franceses. Fala dos irmãos, de como eram todos bons alunos, o contrário dele. Não estudava. Só lhe interessava escrever e ler e o hóquei. Passa para a relação com o pai que quando leu as primeiras coisas que escreveu foi muito encorajador: "Isto não presta para nada". Mas ele próprio tinha a certeza que ia escrever coisas extraordinárias. Aos 14/ 15 anos era hiperdotado e começou a enviar os textos, sob pseudónimo, para o jornal. Escrevia de tudo poesia, conto, novela. Estava convencido que era um génio. E como queria ser escritor, quando o pai perguntou qual o curso para o qual queria entrar, pensou em Letras. E o pai, como era muito democrata, disse: "Estás matriculado em Medicina". Então, mais precoce que a maioria, aos 16 anos entrou em Medicina. Nunca tinha visto um cadáver. Mas tudo nos primeiros anos envolvia cadáveres. Tinha medo. Essas aulas imensas de 4 horas provocavam-lhe terror. Mas continuou sempre a escrever e enviava coisas para a Casa dos Estudantes do Império (que defendia a libertação das colónias). E foi chamado à Polícia política. Como era um Lobo Antunes disseram-lhe: "O menino vá para casa e veja se não reincide de andar com comunistas". 

Fala da divisão social que existia na ditadura entre ricos e pobres. Das quatro ou cinco empregadas que tinham em casa. Das diferenças sociais que existiam. A missa das empregadas às 7 da manhã separada da missa dos patrões ao meio-dia, com direito a homilias mais longas é um dos exemplos dados. A igreja católica não é poupada, destacando os grandes almoços que havia em casa com padres e bispos que comiam e comiam: "essas santas criaturas".A ditadura também não é poupada. A existência da polícia política agressiva e temível, muito mais para os amigos do que para ele, que era um privilegiado.

Fala da sua viagem a Pádua de carro, ainda criança, e o pai a querer parar em todos os museus dos países por onde passavam. O pai queria ver todos os Tintoretto e ele achava uma chatice e que "gostava dos escarradores". Conta o episódio do escritor que perante As meninas de Velasquez no Prado ficou a olhá-lo muito tempo, calado e quando lhe perguntaram o que achava respondeu: "Onde está o quadro?", a mais bela crítica de arte q ouviu.

Fez o curso com várias reprovações mas no fim apaixonou-se pela Medicina. Escolheu Psiquiatria porque achava que dava menos trabalho. Foi para Londres fazer um estágio e quando volta é chamado para a guerra. Pensou em fugir. "A esquerda ia fazer a revolução para os cafés de Paris e voltava a votar na direita". Mas como podia fugir se escrevia em português? Tinha que estar em Portugal. E achava que a ditadura, que tinha começado em 1926, nunca iria acabar.

Exalta os militares, os seus soldados. Alguns deles nunca tinham visto o mar: "Que rio é este tão largo e com tanta espuma?". A maior parte dos soldados era muito pobre. Contou outro episódio que se passou há uns anos, no Porto, num sítio muito chique e os "seus" soldados apareceram para a apresentação do livro e o professor responsável pela apresentação disse: "O António gosta muito de pessoas humildes". Ao que ele respondeu, indignado: "Os meus soldados não são gente humilde. São príncipes. Está a ouvir? São príncipes!". E a partir daí começaram a aparecer com cartazes "Os príncipes de António Lobo Antunes. Quanto à guerra. propriamente, só falará de um dos intervenientes da revolução, Ernesto Melo Antunes, que no meio de um tiroteio à noite andava desprotegido e com uma lanterna: "Sabes, é que às vezes apetece-me morrer". Recordará a única vez que chorou na vida quando recebeu um telegrama a dizer que tinha uma filha. Foi chorar imenso tempo e outro oficial colocou-lhe a mão no ombro, sem dizer nada. E essa mão silenciosa e a sua importância, nunca mais esqueceu.

Recordou a dificuldade de voltar à vida real depois da guerra. E também a dificuldade de publicar o primeiro livro. Deu o manuscrito a ler a dois amigos: "um disse-me que devia tirar a primeira parte e o outro disse-me que devia tirar a segunda...". O livro foi recusado por todas as editoras em Portugal. Depois foi publicado por uma pequena editora e na sessão de lançamento "estava eu, o editor e a empregada da editora". E foi um acontecimento. Vendeu muito. O irmão Miguel até lhe disse: "Tens que tirar a fotografia da conta-capa porque ouvi dizer "deve ser uma porcaria mas ele é tão bonito". 

Falou do imenso orgulho que foi conseguir um agente em NY e ter sido publicado pela Random House e de ter boas críticas no The New York Times e todos os mais importantes jornais americanos. De como largou a Medicina para se dedicar em exclusivo à escrita. Continua a fazer o mesmo horário. Escreve das 8:30 até à uma e depois das 2:30 às 8 e depois mais um bocado à noite. Porque escrever, segundo ALA, é sobretudo trabalho.

Tem andado a reler Dickens. Cita de memória sobre um filho que vai ver a mãe que está muito doente:
"- Tens dores, mãezinha?
-  Tenho a impressão que há uma dor aqui no quarto mas não sei se sou eu que a tenho".
Deu este exemplo para explicar o quanto é preciso de trabalho e sofrimento para chegar a uma frase destas. 

Não se esqueceu de destacar o quanto estava orgulhoso por ver publicada toda a sua obra na colecção Pléiade, o único português, a par com Fernando Pessoa, a integrar esta lista. E junta-se aos 3 escritores vivos a integrá-la. 

Um monólogo, com argumento conhecido, sem qualquer novidade para os que acompanham de perto os poucos eventos públicos que aceita, usado como guião da sua Lectio Magistralis. Despediu-se com: "Só entre os homens e por  eles vale a pena viver".

O público não teve direito a perguntas mas os seus admiradores tiveram a oportunidade de ver os livros autografados. Teve direito a uma pausa para fazer desaparecer dois cigarros. Filas desorganizadas de mais novos e mais velhos, com a predominância dos mais novos. Auxiliado pela tradutora nos recados que os seus admiradores faziam questão que entendesse, parava de escrever, olhava-os nos olhos, com o sorriso lindo, apesar de contido e tímido. Quase não se lhe vêem os dentes,e aquele segundo de atenção com um sorriso inocente de quem não está a entender o que se lhe está a dizer, mais por causa da surdez do que outra coisa. E responde, delicadamente, com a mão estendida: "Grazie".









quinta-feira, 23 de março de 2017

O discurso sublime de António Lobo Antunes

Há umas semanas deu uma grande entrevista ao Expresso muito diferente daquilo que o apelidam. Sincero, demorado, descritivo.

Não vi a gala da SPA na RTP. Cheguei ao vídeo do discurso pela Fernanda Mira Barros. No agradecimento do prémio da SPA Vida e Obra não parece o grande escritor. Parece pequenino. e (ainda) mais velho. O tempo não o tem poupado. Apesar disso, parece um menino grande. Tímido. Tom de voz muito baixo. Agradeceu emocionado ao Presidente da República que lhe lhe enviou um bilhete sobre um livro que tinha saído. Congratulou-se por termos um Ministro da Cultura que é um grande poeta. Disse que escrever foi o que sempre lhe deu sentido à vida. E falou do Senhor Barata que tem um cancro e ao qual prometeu dizer “adeus”. “Livre-se de não vencer essa puta!”.

Este é a pessoa que tive a honra de conhecer. O maior escritor vivo. A maior parte das vezes quando conhecemos os génios ou os nossos ídolos temos  a tendência para nos sentirmos defraudados. O António é o contrário: perde tempo com os seus leitores, é um grande ouvinte (apesar de ser “surdo como uma porta”, como ele diz), terno, meigo, tem uma voz linda, pausada, sorri muito, agradece na mesma proporção e adora NY.


Gosta de Jorge Amado, mais do homem do que do escritor, e pergunta quem é que o lê hoje. Eu! Eu adoro Jorge Amado. Parece sempre um menino grande que teve falta de amor e afecto. O menino prodígio que tem uma memória de elefante, que aprendeu a ler com 4 anos mas que se recusou durante três anos a decorar 5400 g de Anatomia, embora tendo uma memória prodigiosa. Nunca deixou de ser um menino tímido “que se virava para a parede” para não enfrentar as pessoas. Costuma dizer que era muito bonito e que agora é um monstro. Detesta levantar-se cedo. Tem uma vida monástica. Preparou-se a vida inteira para o talento que sempre teve: escrever. Ainda hoje escreve com um livro grande aberto (dos tempos em que fingia que estava a estudar enquanto escrevia).

Copyright: Sociedade Portuguesa de Autores (SPA)

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

O meu problema com Bob Dylan

O meu problema com o Bob Dylan é quase o mesmo que os outros galardoados com o Nobel da Literatura. Não o conheço (bem). Sei que é um grande (e conhecido cantor, para muitos) e um grande compositor. Não sei apreciar a sua qualidade musical. Mas sei dizer que detesto a voz fanhosa e aguda dele com aquele sotaque do sul (Minnesota). Aquele ar superior, de estar a “cagar-se para o mundo”, enerva-me. E achei espectacular o facto de ele não ter falado (ainda) com a Academia Sueca. Ele não rejeitou o galardão. Pura e simplesmente ignorou-o, que é muito pior. A justificação da Academia Sueca para atribuir o Nobel da Literaura a Bob Dylan baseou-se no facto de ele “ter criado um novo modo de expressão poética na grande tradição da música americana”.

A minha questão é mais: Não havia quem mais merecesse nessa categoria. A tradição de premiarem poetas é quase inexistente. Se a ideia foi premiar “escritores de letras de músicas” acho muito bem. Não distingo poetas de “escritores de letras de músicas”. Retiremos a melodia desses poemas e veremos que o poema resisterá sem música e será igualmente grande. Mas nessa categoria podemos questionar-nos: Vinícius de Moraes não mereceria muito mais? Um grande poeta que escreveu músicas extraodinárias. Um menino que sonhava ser poeta. Nunca sonhou ser outra coisa. Foi um dos grandes percursores de um revolucionário estilo musical: a bossa nova. Ok, mas está morto e a Academia não premeia mortos. O mesmo poder-se-á dizer sobre David Bowie. Mas, e sobre Leonard Cohen ou Patti Smith? Esta pergunta não tem resposta certa. Gosto, apenas, da pergunta. Serve, apenas, para pensar.

A coisa mais improvável que me aconteceu em relação ao Bob Dylan foi que conheci primeiro quem era Dylan Thomas antes do Bob Dylan... E eu gosto tanto do Dylan Thomas que até já fui a todos os loscais e ruas que ele frequentou em NY. As únicas duas músicas que coheço de Bob Dylan são. “Knocking on heaven’s door” e “Mr tamborine man”. A primeira um hit da minha geração popularizada pelos Guns N’ Roses.

Depois, outra coisa, o mercado livreiro está de tão boa saúde que atribuir o prémio de literatura a alguém que vive da música, parece-me injusto. Mas provavelmente eu não consigo esboçar uma opinião neutra porque não gosto, especialmente, do Bob Dylan. Alguém que nem o próprio nome assina...o tal “bardo romântico judeu do Minnesota”, como escreveu Caetano Veloso.


Senhores, desculpem-me, mas eu nunca fui de concordar com a maioria. Esta é a minha opinião. Não pretendo convencer ninguém.

terça-feira, 5 de junho de 2012

The Susan Sontag Prize for Translation 2012

Este ano o prémio de tradução atribuído pela Susan Sontag Foundation, no valor de $5000 for para dois tradutores da escritora brasileira Hilda Hilst: Julia Powers pela tradução de "Contos d'escárnio/Textos grotescos" de Hilda Hilst e para Adam Morris  pela tradução de "A obscena senhora D".

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