Fiz todos os meus estudos até à universidade num
colégio privado. Hoje não vou debruçar-me sobre as vantagens e desvantagens.
Tive sempre a mesma professora na primária, desde a 1ª até à 4ª classe. Os
métodos dela, para a época (anos 80) e para a idade que ela tinha (entre os 20
e muitos e os 30 e poucos), eram muito severos. Usava o castigo físico em
demasia, ora as orelhas, ora as reguadas com uma régua de madeira, até à
moderna (lançamento inovador na altura)
régua de plástico flexível que nunca partia. A violência física era
transversal, nem os bons alunos escapavam. Ninguém estava a salvo. Gostava de
encontrá-la para lhe perguntar se ainda continua com estes métodos pouco
ortodoxos. Tirando este pormenor (o adjectivo fica ao critério de cada um) era
uma excelente professora no que respeita ao método de ensino. Nessa altura
decoramos o poema, que sei de cor até hoje:
“Batem leve,
levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim”(...)
Adiante, depois no ciclo tive outros professores que
me marcaram positivamente. Uma professora de Português que nos incentivava a
ler fora das aulas e a anotar as palavras num caderno. Os significados eram
adicionados com recurso a um dicionário. Até hoje uso um dicionário. Desde a
primária que nunca dei muitos erros, mas sem dúvida, este método ajudou imenso.
Foi também com esta professora que eu descobri o gosto da leitura. Tivemos
outra, que os meus amigos que andaram no colégio se recordam, que nos obrigava
a fazer cópias em cadernos de duas linhas para termos a letra bonita!
A Matemática, acho que no 8º ano, tivemos um
professor que era Capitão do Exército. Era super engraçado. Corria toda a gente
com negativas mas era muito boa pessoa. E tinha por hábito destruir os livros
de ponto e sujar a roupa toda com giz. Quando fazíamos barulho pegava no livro
de ponto, batia com ele em cima da secretária e gritava: “Calou, porra!”.
Mais tarde, tivemos um professor, também de
português que era padre e Professor na Católica. Adorava latim e Gil Vicente.
Até hoje detesto essa língua morta e Gil Vicente. Contudo, adorava o
“Principezinho” que analisamos até à exaustão. Nessa altura achei o livro muito
desinteressante. Anos depois, reli-o várias vezes e sei trechos de cor. Este
professor proibia-nos de ler os cantos dos Lusíadas referentes à Ilha dos
Amores. Contudo, digo até hoje o primeiro canto: “As armas e os barões assinados/
que da ocidental praia lusitana/ por mares nunca dantes navegados...”. E o “Mar
Português” de Fernado Pessoa é outro dos exemplos que decorei nessas aulas e
que sei até hoje.
O Padre Fernandes foi quem mais nos incentivou à
leitura em voz alta nas aulas. Quase que só fazíamos isso. Lembro-me do dia que
morreu Miguel Torga, foi como se lhe tivesse morrido uma uma pessoa da família.
Adora Eugénio de Andrade. E tinha a maior biblioteca que alguma vez conheci.
Andava sempre com livros e todos eles dobrados e com pequenos papelinhos a fazer
marcações.
Ontem, no dia em que os professores fizeram greve,
que é um direito que lhes assiste, lembrei-me destes meus mestres. Eu lembro-me
nitidamente que os meus amigos que andavam nas escolas públicas, os professores
faltavam muitas vezes. Naquele tempo invejávamos estas baldas...nós nunca as
tínhamos. A verdade é que nos colégios privados não há greves. O que eu tenho a
dizer é que os professores das escolas públicas foram sempre uns privilegiados ao longo dos anos, e agora, como estão a deixar de ser intocáveis usam da pior
arma, não a greve, mas os alunos. Quantas horas trabalhava um professor? Como é
que era avaliado? Os salários sempre subiram, não por mérito, mas por anos de
serviço. Quanto tempo de férias tinham? Era férias no Natal, na Páscoa, 2 a 3
meses no verão... Claro que estão descontente s porque quem não se sente não é
filho de boa gente. Mas o que queriam? Se toda a sociedade portuguesa está a
ser afectada transversalmente, achavam que se mantinham intocáveis? Esse Mário
Nogueira, que só fala e não diz nada, se eu fosse professora tinha vergonha de
o ter como porta-voz. Que experiência de docência tem este senhor? Viveu a vida
toda a receber um ordenado de professor sem sê-lo. E eu termino com o meu agradecimento
profundo aos meus mestres que tanto me marcaram, tendo a certeza que a
profissão de professor é tão nobre.