Mostrar mensagens com a etiqueta família. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta família. Mostrar todas as mensagens
segunda-feira, 9 de julho de 2018
You need to push (more)
Fim de semana em casa. Dias cansativos e de pouco sono. Horas de viagem. Horas entre aeroportos e aviões. Atrasos. Esperas. Barulho. Muita gente. Mas vale sempre a pena. Muitas horas de cansaço em troca de prazeres. Pequenos luxos. Contacto físico. E como sabe bem depois de semanas desgastantes de trabalho. Após fins de semana em clausura sem ver a luz do dia e sem sentir a temperatura real. Lá fora o Mediterrâneo quente e azul. Sonos trocados. Expectativas defraudadas. Críticas injustas. Muito trabalho sem reconhecimento. Palavras desmotivadoras. Pressão. Reuniões semanais. Necessidade de resultados. Updates. Analogias de guerra. Hierarquias militares. General vs soldados. Touros e cornos. Chef vs descascadores de batatas. Ausência de palmadas nas costas. Tarefeiros. Executantes. Falta de espírito crítico. Faz isto, faz aquilo. E, finalmente, chegar a casa. Massagem. Mimo. Festas na cabeça. Vinhos bons. Comidas predilectas. Conforto. Baterias recarregadas. Amigos. Conversas. E o sobrinho mais velho que diz: “a avó tem um coração sensível. Ela perdoa-nos tudo. Não grita com ninguém. Eu peço-lhe para gritar com o pai e ela não tem coragem”. Como não adorar? E uma carteira com toda a vida lá dentro que se perde. Procuras infindáveis. Desespero. Perspectiva. Assunto arrumado. Nova etapa. E tudo começa de novo. Naturalmente. Outra vez. Riso
sábado, 23 de dezembro de 2017
Sete anos sem ele
Estou sentada à espera de ser chamada. Falta de ar. Dia de crise. Bronquite. Bronquite asmática. Asma brônquica. Asma alérgica. Mas, de facto, não sou alérgica a muita coisa. Tenho (apenas) as imunoglobulinas aumentadas 1000 vezes. Corticoides. Cortisona. Optam pelos anti-inflamatórios que não sejam não-esteróides. Brometo de ipratrópio. Salbutamol. Budesonida. Flixotaide. Cansaço. Pieira. Gatinhos. Panela de pressão. Borbulhar. Esponja. Hiperventilação. Peixe fora de água. Insónia. Mal-estar. Cetirizina. Bilaxten. Descanso.
Hoje ela disse-me que a imagem mais remota que tem de mim é de num dia de verão muito quente, dia de tudo a arder em volta, eu a caminhar calmamente, parar e dizer: “não entres em pânico, está a começar uma crise de asma. Eu não tenho a bomba e preciso de oxigénio. Liga por favor para o INEM”. Nesse dia, o INEM chegou rapidamente mas não tinham oxigénio. Lembro-me da médica me dar a mão e pedir-me calma, apesar de eu estar deitada mais do que calma. Nesse dia uma amiga que eu não sabia grávida foi comigo na ambulância a alta velocidade para o hospital. Ela não teve medo. Eu não sabia.
O meu avô morreu há 7 anos. Passava pouco das 8 e recebemos um telefonema. Nesse dia, eu dormi em casa dos meus pais. A minha mãe foi acordar-me porque uma das minhas tias queria falar comigo. Disse-me ao telefone a chorar: “O avô morreu”. O mundo parou. Não consegui dizer nada. Petrifiquei. Como é que podia ter morrido se estava, apesar de internado, tão bem na noite anterior? Ele que sobrevivera a dois enfartes num mês. Ele que nunca estivera gravemente doente na vida. Ele que nunca estivera internado. Um enfarte atirou-o para a cama de um hospital e nunca mais de lá saiu. Perdeu o apetite. Perdeu peso. Perdeu a função renal. Perdeu quase tudo. Mas nunca perdeu a consciência. Que saudades que tenho do humor dele. Do riso dele. E conversava tanto. Que saudades do “minha neta”.
Há um ano, exactamente neste dia, entrei com a maior das confianças numa sala. E saí de lá cega de desânimo. Acho que nunca me recuperei. Ainda hoje não consigo lembrar-me do que foi dito. Vou aprendendo devagarinho a não acreditar.
Ontem mandaram dizer-me que a minha pressa não era urgente. A minha esperança morre, a cada dia, um pouco mais. Tudo é espera e incógnita. A resposta chegará algum dia. É uma questão de tempo e paciência.
E depois penso naquele senhor de 91 anos, a idade que o meu avô tinha quando morreu, que está desesperado, nota-se no tom de voz. Quer uma receita e não pode esperar porque tem muito que fazer. Tem a filha no hospital. A filha tem 59 anos e tem um cancro no rim. Já foi operada quatro vezes. E naquela casa onde eram dois, agora resta um. Está sozinho, nesta época do ano. Há sempre pior.
Etiquetas:
avô,
família,
quotidiano,
realidade,
vida
quarta-feira, 19 de outubro de 2016
Onze de outubro de dois mil e dezasseis
Passaram-se quatro anos. O meu afilhado tinha 3 anos, usava chupeta e uma
fralda na mão para dormir. O meu sobrinho mais velho tinha 4 anos, ainda não
tinha mudado os dentes. Já usavam óculos. Não quero voltar a esse dia.
Não consigo voltar a esse dia. É demasiado mau. Nestes 4 anos, a minha avó
morreu. Passaram-se Natais, e novos anos e dias de anos e dias do pai. Muito
medo, muitas lágrimas, muitas tristezas, muitas saudades, muita dor. Muitas
lágrimas secaram e muitas lágrimas deixaram de brotar por não haver mais para
chorar. Expectativas defraudadas. Muitas provas, muitas folhas, muita tinta,
muitas palavras. Tempo, muito tempo, demasiado tempo. Tempo, que se pensava,
irrecuperável. Depois de tantas desilusões chegava-se ao dia da decisão final.
À estrada percorrida, comprida, sem saída. Uma única e justa solução. Não seria
possível outra decisão que não fosse a justa. Que a justiça fosse justa, o
verdadeiro pleonasmo. A decisão que defendesse o superior interesse das
crianças. Uma justiça que fosse cega, como é a imagem que a representa, sem
pender para nenhum lado das balanças. Ninguém entende, ninguém consegue
perceber-nos, ninguém consegue colocar-se no nosso lugar. A tão bela frase que
fica ainda melhor em inglês: "put yourself in my shoes".
E chega o grande dia. Um entusiasmo calado, um optimismo que sentia estar
certo. Mas conhecia as frases: "Quem disse que a vida é justa?",
"A justiça não funciona", "Mãe é mãe", "Ninguém tira
os filhos a uma mãe". Depois de tanto tempo, tantos factos, tantas provas,
tantas evidências, só poderíamos estar confiantes. Mas o tempo perdido,
decisões erradas e falta de coragem de muitos dos envolvidos, levam-me a ter
(sobretudo) medo. Foi isto que mais aprendi nestes últimos 4 anos: a ter medo.
E eu que só tinha medo que os meus morressem...
Acordei optimista, depois de não ter conseguido adormecer antes das 4 da
manhã. Adormeci com dor de cabeça, como quase sempre nos últimos dias, e
acordei como se não tivesse dormido. Mas acordei sem medo e sem angústia.
Confiante, no fundo. Pela primeira vez, não conseguia não ser optimista. Quando
no aeroporto, vi que iria viajar numa avioneta que mais parecia um avião de
papel, pensei no quão injusto seria morrer antes de ver a alegria estampada no
rosto dos meus sobrinhos. Aterrei sem problemas de maior. Fui trabalhar, como
de costume. Não disse a ninguém o quão mal estava, por dentro. Acreditava, com a fé que tenho, que seria um grande dia e
que tudo ia acabar em bem!
E assim foi. O grande sonho cumpriu-se. O dia
da liberdade chegou! A justiça foi feita! Muita gente nunca desanimou. Muito
obrigada a todas as pessoas que sempre acreditaram. Uma vida nova começa. Os
meus sobrinhos ganharam! Palmas, principalmente, para a advogada do meu irmão
que nunca perdeu a esperança e sabia, desde o inicío de que lado estava a razão!
Não quero mais olhar para trás. Só para a frente e pensar que os meus
sobrinhos vão agora poder viver a vida na sua plenitude. Vão poder falar sem
terem medo do que vão dizer, sem medo que lhes digam mal das pessoas que
gostam, que vão ter aquilo que há quatro anos lhes tiraram: a liberdade de
serem o que são.
“It was a long,
long, long road”!
sexta-feira, 7 de outubro de 2016
O dia da liberdade chegará
Ainda hoje, passados 4 anos, não consigo lembrar-me daquele
dia. Ainda hoje, depois de muita ajuda, de muitas palavras, de muitos
conselhos, de muitos químicos legais, de muitos comprimidos, de muitas
insónias, de noites e noites sem dormir, de muitas lágrimas vertidas, de muitas
lágrimas que secaram, continuo a ter medo daquele dia. E fechei-o em qualquer
lugar dentro de mim para nunca mais lá voltar. Não há nenhum dia que ao
lembrar-me de pequenas partes (que
aparecem sem avisar), a que imediatamente fujo, consigo não chorar. A maior
injustiça de todas. O maior mal que se fez a algumas pessoas com o objectivo de
se atingir apenas uma. O maior mal, o maior de todos, foi causado a duas
crianças. E uns pais que criaram filhas inaptas para enfrentarem como adultas a sociedade apoiaram
a birra e a maldade de uma filha contra o supremo interesse dos netos. O
tempo e a memória permanecerão. E essa verdade imutável será a que sempre terão
que se confrontar na vida. O peso do mal que fizeram. E eu só espero e peço que
estes (inúteis) quatro anos não tenham interferência (negativa) na
personalidade e carácter dos meus sobrinhos. Que sejam homens bons. Que a
maldade nunca lhes afecte o juízo. Que sejam sérios e honestos. Que nunca
precisem (mais) de mentir e de esconder o que sentem. Que se guiem sempre pela
frase “A verdade liberta”. Que parem de me pedir “eu quero ficar com o pai”
quando eu não tenho poder nenhum e quando eu nada nada posso fazer a não ser lutar
para que seja feita justiça. É com essa fé, com que nasci, e profunda convicção e
optimismo, nos homens, que espero que na terça seja feita justiça. Sem
represálias, sem vinganças, sem acertos de contas. Só pelo bem de duas crianças
que sabem (desde sempre o que querem) mas que sempre tiveram medo de falar a
verdade. Para que nunca mais na vida tenham medo daquilo que sentem e que a
partir de terça sejam seres humanos livres. “Não há mal que dure sempre, nem bem
que sempre acabe”.
quarta-feira, 28 de setembro de 2016
Quando os sobrinhos acham que têm a cadela mais bonita do mundo
Chego ao carro. Entro para o banco de trás, onde seguem os meus sobrinhos, e eu espremida entre ele no lugar do meio. Beijinho num e beijinho no outro, reparo que o mais velho está triste. Pergunto-lhe o que se passa.Responde-me, todo fungoso, que a Bu não ganhou o prémio (fiquei sem entender se era prémio de habilidades ou beleza...). Durante a tarde tinham ido a uma "Cãominhada", uma caminhada solidária com cães que visava recolher ração para uma associação. Uma das actividades seria um concurso, que não cheguei a perceber o tipo. Choroso, o mais velho, continuou a explicar detalhadamente que a Bu não fez nada do que ele lhe pediu (mas que faz sempre). Não deu a patinha, não lambeu, não deitou, não sentou e não deu a barriguinha. Nada. Niente. Zero. E eu tentei explicar-lhe que a Bu não é uma cadela de circo. Que a função dela não é exibir os seus dotes artísticos mas ser feliz. Na linguagem mais simples tentei dizer-lhe que os cães, tal como nós, têm vontades e que, muitas vezes, só fazem o que lhes apetece. Provavelmente, viu muita gente e ficou inibida. Petrificou. E por mais que o dono pequeno (que ela adora) lhe pedisse e lhe implorasse, ela não se mexeu. Disse-me também que não ganhou o prémio de mais bonita. Perguntava-me ele como é que isso era possível? O que para ele não existe qualquer dúvida, mas apenas, uma certeza. O amor dos pequenos por ela é tão grande que lhes tolhe o juízo!
Pois bem, vou fazer a analogia com a história da coruja que ouço desde criança contada pela minha mãe. Era uma vez uma mãe coruja que precisava de ir arranjar comida para os filhos e pediu/avisou os predadores que não os comessem. Nas palavras da mãe-coruja "eram muito bonitos" quando questionada sobre a aparência deles. Quando os predadores chegaram, viram criaturas tão feias que não hesitaram em come-las de tão feios que eram. Moral da história: "Quem feio ama,bonito lhe parece".
quinta-feira, 15 de setembro de 2016
Retalhos da vida de uma tia babada
Fim de dia. Cansaço. Leve dor de cabeça. Paciência quase
nenhuma. Sono, muito. Há muitos dias que durmo mal. Tenho sono quando não devo.
E quando devia dormir, leio. Só imagino uma cama, ao longe. Dia de jantar com
os sobrinhos. Toco a campainha e ouço a voz que quero ouvir: “Quem é?- a
pergunta de sempre. Com a resposta previsível e sem engano: “Sou eu”. Quando
querem brincar ainda acrescentam: “ Eu, quem?”. Subo de elevador e antes da
porta se abrir já ouço o ladrar da Bu. Quem me abre a porta é o meu afilhado. E
dá-me um abraço com toda a força que tem. Segue-se o abraço e os beijos do
sobrinho mais velho. Este, como sempre, nas suas actividades criativas que
envolvem pintura, desenhos e criações. Agora, sobretudo, bandeiras de Portugal,
dinossauros, baleias e tubarões. O afilhado está fechado num quarto cuja porta
está forrada de recados, desde horários de atendimento, conselhos e profissões.
Hoje a ordem é para que ninguém entre. O sinal proibido. Depois seguem-se as
instruções. Ao mesmo tempo que as leio a minha mãe diz-me ao longe que só se
pode entrar com autorização dele seguindo as instruções. São elas: bater 3
vezes e tocar o sino. Estou demasiado cansada para desempenhar um papel. Mas o
que eu não faço por eles?. Procuro o sino. Está ao lado da porta [é um sino
pequenino, comprado pelos meus pais em Washington no tempo em que os pequenos
tinham paranóia por sinos. Quando me lembro não consigo não rir. O mais pequeno
ainda não falava nem andava e por influência do mais velho dizia: “Tão, Tão,
Tão, Ti, Tão”. Existem vídeos de morrer a rir]. Faço o que os meus olhos lêem.
Bato à porta, toco o sino e espero. O mais velho vem a correr e diz que aquele
é o sino dele. E eu, já preocupada com o tempo que a demonstração teatral vai
demorar, peço-lhe que me empreste o sino, que é só para entrar. Depois de
alguma negociação, consigo que seja ele próprio a tocar o sino (enquanto o
leva) mas a tempo do mais novo ouvir. O afilhado abre a porta e pergunta “O que
deseja?” e eu “Entregar-lhe o presente que trouxe de Lisboa, espero que goste”.
Saio e fecho a porta. Vou à sala e entrego ao mais velho o que ele me tinha
pedido: uma miniatura da Torre de Belém. Abriu e felizmente disse: “Titi, era
mesmo isto que eu que queria, acertaste”, entre beijos e abraços. Ao longe ouço
o afilhado dizer à avó que não gostou nada do que eu lhe dei. Vou em direcção à
conversa e diz-me: “Não gostei nada! Não era nada disto que eu queria (uma
caneca de Lisboa com eléctricos, Torre de Belém, guitarras,...). Ao que
respondo: “Desculpa afilhado mas é o que acontece quando não se diz o que se
quer. E vais dar-lhe uso para beberes o leite.” Não convencido com a explicação
argumenta: “O que eu queria mesmo era o equipamento do Benfica!”. Todos os que
nos rodeiam sabem que isso será o presente do Natal... Este episódio faz-me
lembrar outro, protagonizado pelo pai deles que quando era pequeno respondeu à
madrinha dele: “Não gostei nada! Livros não são prendas!”. Quem sai aos seus não degenera (é de Genebra)...
terça-feira, 13 de setembro de 2016
As verdadeiras vítimas de violência doméstica que me perdoem
Tenho 37 anos, e felizmente, na minha vida entre este país à
beira mar plantado e o outro do lado oposto do Atlântico não conheci nas minhas
relações violência doméstica. Sou filha de pais casados há quase 41 anos (fazem
em Dezembro). O meu pai continua a oferecer flores semanalmente à minha mãe e
nunca lhes assisti a uma discussão. Claro que as deviam ter, como todos os
casais, mas nunca à nossa frente, nem nunca envolveram vozes altas nem gritos.
Nos últimos tempos, e bem, as denúncias de violência
doméstica têm disparado. Obviamente, que nem homens nem mulheres se tornaram
mais violentos. A coragem, a divulgação e as consequência é que aumentaram. Seja
por que motivo for, a violência, verbal e/ou física, são condenáveis. Quando se
chega a este ponto, o sentimento que é o pilar das relações humanas, o
respeito, terminou e não há volta a dar. Há limites que nunca se podem
ultrapassar.
A minha experiência é outra. A violência por parte das
mulheres. Conheço três casos concretos. O primeiro soube-o há alguns anos,
ainda era aluna de doutoramento em Houston. Quando me contaram e me mostraram
as marcas fiquei tão petrificada que só acreditei na evidência, vendo. Porque
os olhos não mentem. Perante aquele absurdo só disse que era inadmissível e
como era possível se sujeitar aqueles maus tratos. Na minha inocência de quem
nunca vivenciou uma cena de violência perguntei porque não se defendia. Foi-me
respondido: “Se reagir posso matá-la”. Aconselhei a pessoa em causa a não dar mais
nenhuma oportunidade e revoltei-me, obviamente, com a agressora com quem não
falo até hoje. Independentemente dos motivos, ninguém tem o direito de levantar
a mão a ninguém. Nada se resolve assim. E nada disto se justifica.
Mais tarde, outro amigo disse-me que um homem com filhos
quando terminava uma relação tinha uma coisa a fazer quando quisesse sair de
casa e não ser privado dos filhos: fazer queixa à polícia de violência
doméstica. Não entendi. Mas percebi com a experiência que era a única forma da
justiça não optar pelo lado errado.
Façam um estudo e mostrem as estatísticas. A maioria das
mulheres perante a iminência da separação, que aceitam ou não, usam os filhos
como arma de arremesso. Primeiro, quando os filhos são pequenos, dominadas pelo
instinto de vingança e aconselhadas perversamente por maus advogados,
acusam-nos de violência doméstica contra si e os seus filhos e em simultâneo,
para acabar de vez com a dignidade de uma pessoa de bem e reduzi-lo aquilo que
ninguém aceita, a machadada final é dada com a acusação de abuso sexual dos
filhos. Investiguem as falsas denúncias. Ouçam e leiam grandes peritos neste
tema como o Prof. Daniel Sampaio e Dra Maria Saldanha Pinto Ribeiro. Imaginem,
por um instante, ser acusado de uma coisa tão idionda que não se cometeu.
Imaginem o que essa mentira provocará na vossa vida. E os efeitos dela. O pai
que me contou ser vítima desta situação era um homem destruído, cansado,
choroso, privado da sua filha de dois anos e quem eu dizia que a primeira coisa
a fazer era apoiar-se na família, fortalecer-se psicologicamente e acreditar
que a justiça dos homens funcionasse. Isto foi há 3 anos. Pelo menos já
conseguiu provar que a mãe da filha mentia. Está outro homem. Melhor. Mas os
estragos provocados ficarão lá para sempre.
O último e não menos importante caso tem 4 anos. O casamento
nunca correu bem. Ele era pai, mãe, sustento da casa, quem tratava dos filhos,
quem cozinhava, quem acordava de noite. Para além dos 2 filhos tinha a mulher
que parecia ser mais um. Toda a gente conhecia a situação. Era visível demais.
Ele era o pilar. E ia aguentando como podia para bem dos filhos. Os problemas
começaram quando começou por não deixar os filhos ao fim de semana na casa dos
pais. Continuaram porque ela deixou de trabalhar e pioraram com um facto grave
que foi o fim. Os pais dela que sabiam de toda a situação gostavam dele e
apoiavam-no. Quando se separaram fizeram um acordo escrito, acordado e tratado
pelos respectivos advogados, e assinado pelas partes que incluía a permanência
dos filhos em determinado colégio. Antes de dar entrada no registo, a mãe
rasgou o acordo e andou com os filhos em parte incerta e o pai não os viu
durante dois meses. Espalhou um sem número de mentiras. Dizia-se vítima de
espancamentos sucessivos, vítima de violência e até de atropelamentos.O mesmo
aplicado aos filhos. Factos zero. Provas zero. Relatos dos vizinhos zero.
Chamada para a perícia médico-legal não compareceu. Na primeira avaliação
psicológica a única coisa que demonstra é querer, sem razão, é não permitir a
convivência dos filhos com o pai. Os pais dela desmentem a versão. Não vou
entrar em pormenores sórdidos que incluem medicações perigosas para os filhos,
mudanças várias de escolas e de casas, retirada dos filhos à mãe... O que
mudou: quase nada. Apenas os pais dela, que inexplicavelmente, em vez de
defenderem os netos preferem defender as loucuras da filha. Apesar de este pai
ser um bom pai, de ter emprego fixo e estável, avaliação psicológica e social
mais do que positiva, nenhum juíz (e já lá vão 3) lhe atribuiu a guarda
(ainda). Tem tido azar em tudo. Juízes demasiado jovens, sem coragem, médicos
incompetentes, psicólogos maus,técnicos pouco aplicados. Vítima de funcionários
do Estado que se demitem do seu papel e que não acham este caso (demasiado)
grave nem urgente. Este é o perigo dos casos que os outros não consideram
graves. Há outros com maior prioridade e (realmente) graves. Gente que faz
pouco ou nenhum trabalho de casa e que mal sabe investigar. E gente que dorme
bem à noite, sem qualquer remorso. Até lá, espera-se com uma paciência estoica
e com um fé que se pede que não desvaneça. Este pai sente-se inútil e impotente
por não poder fazer mais do que lutar pelo melhor para os seus filhos e esperar
que a justiça dos homens seja feita. Responsabiliza os juízes que optam sempre
pela solução mais fácil que é não decidir. Que é passar a responsabilidade para
o outro. Isto é o que mais se tem visto. Gente de verdade com muita coragem.
Justiceiros. Juízes como Joaquim Silva a quem chamam “defensor dos filhos com
pais em guerra”.
E por último, coloquemos na ordem do dia, tal como a
violência doméstica, o síndrome de alienação parental. Pessoas que acham que os filhos são
propriedade sua, pais que querem que os filhos escolham e/ou gostem de apenas
um dos progenitores e da sua família. Isto é uma calamidade social. E é preciso
vive-la de perto. Passar por ela para que saibamos a sua dimensão.
E como me disse uma grande amiga é “ser confiante que as
coisas só podem melhorar”. É essa a fé no futuro. E confiar que as pessoas más
não triunfarão e que a maldade tem que ser punida.
segunda-feira, 29 de agosto de 2016
A amizade
A amizade, como o amor,
não se explica. Há quem diga que tem muitos amigos. Eu não. Há quem diga que as
amizades não acabam. A minha experiência também me diz que pode, sim, acabar. O que é verdade numa amizade, ao contrário
do amor, é que nunca se fica a odiar a outra pessoa, apesar de tudo. Mas eu
também não odeio ninguém, seja porque motivo for. Esse sentimento nunca tive
por ninguém. Nunca tive muitos amigos. Dizem que não gosto de quase ninguém, a
esse ponto. Dizem que gosto pouco de pessoas. Gosto muito de algumas pessoas. E os meus amigos são aqueles a quem eu dei uma
oportunidade. Às vezes em situações difíceis, que não me envolviam, tentei
ajudar usando o meu humor judeu. Isso já me valeu o afastamento de algumas
pessoas por quem eu tive que lutar. O que é uma verdadeira amizade? Quando
damos conta que o tempo passou, e que apesar da distância e da rara
convivência, a intimidade permaneceu. É não ter capas. É falar verdade. É ser
transparente. Mas não há regras nem fórmulas.
Durante muitos anos, os
amigos que me acompanharam e partilharam a vida, vivíamos como se não houvesse
amanhã. Dançávamos, coisa que nunca fiz em público a não ser que a concentração
alcoólica fosse alta. Fumávamos sem conta e sem limite. Fizemos muitas
loucuras. Nunca nos cansávamos. Tínhamos asas muito grandes. Fizemos interventions uns aos outros. Testámos
os nossos limites. E isso passou. Há um tempo para tudo. Hoje, alguns, permanecem.
Tenho amigos de cá e de
além-mar. Amigos malucos, neuróticos, chatos. Amigos com pinta. Amigos que não
gostam de ler e que gostam de ler. Amigos que tocam piano. Amigos de todas as horas. Amigos que choram
no meu ombro e no meu colo. Amigos que já me viram chorar e com quem chorei ao
telefone. Amigos que me ampararam as quedas e os tombos. Amigos que me salvaram
a vida mais do que uma vez. Amigos que são irmãos. Amigos que me dão sobrinhos.
Amigos que se riem do meu humor judeu. Amigos que se desfazem e que “estão tão
à flor da pele que qualquer beijo de novela os faz chorar”. Amigos que perdoam.
Amigos que pedem desculpa. Amigos que se esquecem. Amigos que contam e guardam
segredos. Amigos que se expõem e que não fingem. Amigos que não se fazem de
fortes. Amigos sinceros e honestos. Amigos com corações muito grandes. Amigos
com coração sem tamanho. Amigos que me dizem que me adoram. Amigos que eu
reconheço as mãos no escuro. Amigos que
nunca me abandonam e que já me abandonaram. Amigos que vão e que ficam. Amigos
mega, tera, giga bons. Amigos que acreditam. Amigos que respeitam. Amigos que
se fazem de fortes. Amigos que cantam e que pintam. Amigos que ouvem e que
falam. Amigos de todas as horas e de todos os dias. Amigos íntimos e mais
afastados. Amigos sem definição.
É assim que eu queria
que os outros me descrevessem quando morresse: uma boa pessoa, uma grande amiga
que sempre fez bem. Este é o meu objectivo maior.
terça-feira, 14 de junho de 2016
Uma carta para os pais, para os homens, e para a família deles:
-
Quando se casarem, mesmo que descubram que se enganaram, que a pessoa com quem
se casaram não existe mais, que tudo não passou de uma ilusão, que as pessoas
de facto não mudam (só se for para pior), não coloquem a hipótese de se divorciarem;
-
Se por acaso tiverem filhos, o problema (só) aumenta exponencialmente, e em vez
de “não colocarem a hipótese de se
divorciarem” mudem para “nunca se divorciem;
- Leiam
as estatísticas de quantas mudanças, guardas, e responsabilidades parentais
foram atribuídas aos pais (homens) desde a última mudança da lei. Acreditem
nelas (porque existe a tendência para achar que é mentira e que os direitos são
iguais, afinal estamos no séc. XXI);
-
Quando vos disserem que os direitos de pais e mães em relação aos filhos são
iguais, riam-se e relativizem. Nem sempre o que está escrito corresponde à
verdade. O Direito não é uma ciência e muito menos exacta;
- Quando
vos disserem que os magistrados são a classe mais bem preparada do país,
esqueçam. A quantidade de juízes e procuradores aplicados, estudiosos, competentes,
progressistas e que não sejam tendenciosos é como encontrar um grão de areia
branca num areal preto (Eu que nunca mais oiça dizer que os médicos portugueses
são maus porque me vai dar um ataque);
- O máximo que poderão esperar da decisão do tribunal
é a “chapa 5”: um jantar todas as quartas-feiras, um fim-de-semana de 15 dias,
Natal, Páscoa e aniversários à vez e uma via sacra de martírios, de vergonhas,
de cenas, de espectáculos, de insultos, de mentiras e gastos de rios de
dinheiro em Psiquiatria;
- Pelas
experiências empíricas que conheço, em 4 anos, zero sessões de julgamento para
alterações da guarda. Apenas, conferências de pais, requerimento para aqui e
para ali, relatórios de psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais, CPCJ,
hospitais, papéis, tinta, muita tinta, resmas e resmas que ninguém lê, árvores
abatidas;
- Encontrem
conforto nas palavras dos poucos que ainda defendem as crianças, não ligando ao género dos pais,
mas aquele que é mais competente. A anotar: Dr. Maria Saldanha Pinto Ribeiro e Prof. Daniel Sampaio;
- E
para aqueles que acham que as mulheres são todas iguais, não generalizem. De
facto, as grandes mulheres existem e andam aí: “Vou
dizer uma coisa que muitas mulheres detestam que eu diga, mas, hoje em dia, há
muitas situações em que os homens são prejudicados e são discriminados. Dou
como exemplo o que acontece na regulação do poder paternal. Normalmente o que
acontece é que as mulheres, por serem mulheres, são beneficiadas judicialmente
em detrimento dos homens. Não estou a dizer que não haja casos em que isto faça
sentido. Agora não pode ser um princípio geral de que as mulheres serão sempre
melhores como mães. Isto é uma questão de igualdade e mais, é de bem-estar das
crianças. Não podemos defender a igualdade dizendo que nós somos mais iguais
que eles. Não. O que temos de discutir hoje é a igualdade em tudo, quer nos
casos em que as mulheres são discriminadas quer nos casos em que os homens são”-Doutora
Graça Fonseca, actual Secretária de Estado Adjunta e da Modernização
Administrativa, Jornal Público, 01/02/15.
- Ser crente ajuda. Para quem tem fé, acredita que se a justiça dos homens não funcionar, a justiça de Deus funcionará. E mesmo quando tudo parecer perdido, há sempre um milagre à espreita. Para quem não acredita, para além de não encontrar conforto terreno, passará acreditar que existe sempre mais fundo;
- Termino
a sugerir a todos os licenciados e mestres em Direito: escolham como tema de
doutoramento uma análise de decisões dos Tribunais de Família e Menores do
norte do país (tradicionalmente mais conservador) e comparação das decisões da
guarda dos filhos por género.
domingo, 12 de junho de 2016
O elogio a uma vida boa e longa
Hoje vamos exaltar apenas as virtudes e a qualidades de um homem de família. Marido. Pai. Irmão. Amigo. Um homem austero. Sério. Duro. Forte. Conservador. Tradicional. De bom gosto. Antecipava cenários e crises. Por vezes, exagerado. Trabalhador. Crente. Defensor das mulheres. Sempre defendeu a sua emancipação e a sua independência, sobretudo profissional. Conversador nato. Recto.
Teve uma vida boa. E quando a doença apareceu não houve muito que a Medicina pudesse fazer para o curar. Aceitou a doença e foi um bom doente. A voz, que era a sua característica e identidade, modificou-se, mas não se perdeu.
A última vez que o vi, tinha já sido diagnosticado. Uma semana antes da Páscoa. Se eu não soubesse não acreditaria. Estava igual ao que sempre foi. Crítico da política. Elogiou grandes homens. Criticou maus exemplos. Propunha soluções. Acompanhado, como sempre, pelo seu vinho branco que tanto orgulho tinha. Como sempre à volta da mesa e do famoso lanche. O que eu vi naquele dia foi um homem (ainda) cheio de energia e optimismo que me mostrou como se via mensagens no telemóvel e um cartão pré-pago especial para falar quando quisesse com a minha madrinha na Austrália. Nesse dia, levei duas garrafas de jeropiga, que lhe disseram que eu gostava. De facto, a melhor jeropiga do mundo.
Como no salmo, o Senhor foi sempre o seu Pastor e por isso nada lhe faltou. Nos últimos dias, quando as forças lhe começaram a faltar, nos limites da condição humana, viveu uma vida de qualidade, apesar de difícil. As noites eram longas e silenciosas. Sempre contou com a melhor das ciências dos homens e com a Graça de Deus para não ter medo. Aceitou e soube viver com isso. Não se revoltou nem desistiu.
Nunca é fácil perdermos uma pessoa que gostámos. E sobretudo, achamos (sempre) que foi cedo demais e que tinha (ainda) tanto para dar. Mas a parte boa é que teve 79 anos de vida saudável e sem limitações.Teve o fim da vida ideal e que todos desejam. Rodeado e assistido pela família, que tudo fizeram. Nunca esteve só. Suportado pelo amor. Em casa. Em paz. Preparou tudo. Esteve lúcido, quase até ao fim.
Em especial, para a família, sintam-se orgulhosos deste homem e do que por ele fizeram. A forma como o acompanharam e se apoiaram na doença é um exemplo. Sintam-se abraçados e confortados pelo vosso exemplo. Bem-hajam.
sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016
A celebração da vida
Acordo
às 5 da manhã sem motivo aparente. Pego no iPAD e vejo a inesperada notícia.
Congelei. Não percebi. Reli várias vezes. “Escrevo com esperança... E chegou a hora em que teria que me
despedir...... Estás por uns segundos... Entre mim e ti todos os fios se
desprendem... Tão grande a vida que fizeste, atravessaste
o século 20, até agora... 91 é um número supremo... Sei que não ouvirei a tua
voz mais... Só dentro de mim... E com o tempo, até essa ficará esbatida e eu
infeliz tentarei compor para meu consolo outra. Olharei as tuas fotos de vedeta
de cinema americano... Que eras, de parar o trânsito... Esquecendo os outros
que para além da casca eras de fibra da melhor proveniência... Grande, imensa,
forte, suave, apaziguadora, de humor irresistível... Lutaste, construíste,
nunca viraste a cara a adversidade, Foste a minha heroína.. Tinhas pinta,
classe... Poucas ou nenhumas sabiam estar como tudo em todo o lado... Se
quisesses serias a dona do mundo, mas não, escolheste o trabalho e a família e
com isto deste-me tudo o que alguma vez alguém teve...”. Não dormi mais. E essa
parte já falei aqui.
O funeral foi
em Cepães. Terra Natal.Uma capelinha pequenina. Nossa Senhora da Guadalupe.
Chovia torrencialmente. Chegámos uma hora mais cedo da hora marcada para o
início da missa de corpo presente. Lá estava o R. Sempre com aquele sorriso
lindo. A cara da mãe. E o grande amor da tia. Foi o último a vê-la com vida.
Ainda o reconheceu. Que despedida boa foi, imagino eu. Partir com 91 anos com
total independência. E não morreu sozinha. Teve até ao fim qualidade de vida. O
que mais se pode pedir e desejar para os que amamos. O caixão estava fechado e
em cima uma fotografia linda de quem foi a L. Tão bem. O instante captado no
seu melhor, pela máquina fotográfica. Ao lado, uma jarra de rosas pérola.
Adorava flores. A capela, com o aproximar da hora foi-se enchendo. Chegou a C.
e o P. com os filhos (M., C., J. e A.). Vi a tia L. com tantas tantas flores.
Um ramo por cada sobrinho e família. Depois vi também o M. e a J. com os filhos
(M., A., A. e L.). Ao meu lado ficaram as pequeninas A . e T. Portavam-se
exemplarmente. Perguntavam porque não podiam ver a L. No decorrer da missa vi
muitas lágrimas a correr nas caras dos meninos. Mas também dos grandes. Mas as
lágrimas eram acompanhadas de muitos abraços e de muitos sorrisos. A M. e o P. Fizeram
as leituras. Nunca vi um funeral com tantas crianças. O que se podia esperar
triste, transformou-se numa celebração. As crianças que a L. tanto gostava e
que ajudou a criar. Duas gerações de pais e filhos gratos a esta grande mulher.
A família emprestada em peso. A L. deveria ficar orgulhosa. Tinha um dom
intrínseco para a alegria e felicidade. Quando vi todas estas pessoas juntas, reunidas
na celebração da vida da L. comovi-me até às lágrimas. Mas o momento alto foi
quando a C. foi ler um texto. Aí não me aguentei. Um texto tão lindo, tão bem
escrito e tudo o que a L. era. Todos choraram dos grandes aos pequenos. A C.
lia alto e bem, avoz trémula e com as lágrimas a escorrerem mas ao mesmo tempo,
a cara, como a L. queria era alegre. No final da missa a M. tocou viola e todos
(quem sabia) cantaram juntos. Mais lágrimas e mais sorrisos e mais soluços. A
capela foi-se esvaziando e a C. despediu-se da L. com tantas festas e beijos. O
bilhete do elogio fúnebre foi colocado junto à cara. Como é bom terminar a vida rodeada de amor.
Saudade, falta e memórias. É isto que fica. É assim que me lembro da L., bem
disposta, doce, carinhosa, amiga, alegre,
sorridente, optimista, festeira. Com uma vida e uma alegria de viver que fazia
inveja aos novos. A L. teve, tudo balançado, uma vida boa e uma boa vida. Viveu
os últimos 40 anos com a família que não era de sangue mas que foi a família do
coração. Todos os meninos e meninas dela, com um raminho na mão acompanharam-na
debaixo de um dilúvio. As lágrimas confundiam-se com a chuva. As flores da
minha madrinha P., ZL, C. e A. também não foram esquecidas. Estes pais e estes
filhos que eram a perdição da L. Também eles estiveram lá em pensamento. A
nossa L. vai fazer muita falta e deixa uma saudade tão boa. Mas o exemplo dela,
aquela jovialidade, as palavras e a força vão ser para sempre admiradas. E
enquanto cada um de nós que conheceu a L. viver, ela não morrerá nunca.
sábado, 13 de fevereiro de 2016
A surpresa do inesperado
Os sinos das igrejas do centro dão as 6 horas. Chovem cães e gatos. Eu sem um guarda- chuva. Sou só água. Entro na Favorita e lancho rápidamente ao balcão. Subo a rua de S. Marcos. Tenho consulta marcada no oftalmologista. Há muito que adio. Como vejo pior a cada dia, hoje teve que ser. Subo as escadas. Pouso a mochila e tiro o casaco encharcado. À hora marcada entro. A última vez que lá tinha estado foi há 12 anos. As perguntas habituais: "estás cá, agora?", "então, o que tens?". Respondo que não vejo bem, cada vez pior, ao perto e ao longe". E o médico: "estás a ficar velhota". Começamos os exames. Pergunta-me há quanto tempo reparei que comecei a ver mal. Respondo que foi em NY que não conseguia ler os ecrãs de informação do metro. Letras. A aumentarem de tamanho. Não as reconheço. Aumentam. Continuam a aumentar. Tapo um olho. Tapo outro. O tamanho das letras a aumentar. Percebo isso. Mas não as distingo. Cada vez maiores. Percebo a cara de espanto do meu pai. Penso que deva estar intrigado por não conseguir dizer que letras são. Ufa. Distingo-as. Continuo sem distinguir o O, D, C. Também não distingo o F e o P. Passamos para outro aparelho. Tenho de focar uma casa. Pergunto se é normal só ver cores porque não mais consigo ver a casa. Não me responde. Vamos repetir os exames iniciais. "Agora com calma". Diz o médico. Muda-me as lentes, coloca-me uns binóculos. Continuo a fazer muito sacrifício para adivinhar. E continuo com muitas reticências sobre as letras que vejo. Ao fim de muito tempo, pede-me para me sentar em frente da secretária. A cara está séria e preocupada. Percebo a preocupação. E sai-lhe "Não te quero assustar mas o quadro está negro. Não vês nem ao perto nem ao longe. Estás com uma perda de visão brutal". Diz-me que nem deveria conduzir assim. Que devo (ainda) não ter tido um acidente porque sou muito cuidadosa. Que vejo muito muito pouco. Eu, que ainda estava a limpar os olhos das gotas, devo ter paralisado. O médico estava a dizer-me aquilo tudo e de repente comecei a achar que ele estava a falar de outra pessoa. Fala-me da urgência de fazer análises. Que se tem de perceber de onde vem isto. Garante-me que não é dos olhos mas a incerteza não me faz bem. Pergunta-me há quanto tempo fiz análises gerais. Há quanto tempo me doía a cabeça.. Porque não fui lá quando comecei a ver muito mal?...Continuo a não achar que a pessoa de quem ele está a falar não sou eu. Até que me diz: "Sabes Ana, há coisas mais importantes que o trabalho". E, nesse momento, que ainda não tinha começado a digerir a informação, a ficha começou a cair. Começo a ver a minha vida a andar para trás. Deixo de o ouvir. Em vez de me preocupar com a informação que ele debita, só me preocupo com as duas deadlines dos 2 projectos que estão aí. O médico a sugerir e a insinuar possibilidades bastante graves quanto à origem da falta de visão e eu preocupada com a falta de óculos. Afinal, foi para isso que eu lá fui. Diz-me que enquanto não percebermos a origem não há óculos para mim. Com o regresso à realidade de me lembrar (estupidamente) dos projectos, e não da primeira preocupação que deveria ter: comigo! Quando tento digerir o que me acaba de dizer, olho para o meu pai, ao meu lado. Estou mais preocupada com o meu pai por estar a saber da verdade, como eu, e tento perceber-lhe a expressão. Não consigo perceber se está muito preocupado ou se está em choque, como eu. Já não assimilo muito. Já só oiço pedaços de frases."Hoje é sexta mas segunda sem falta...", "se não conseguires liga-me", "falo com (não sei quem) na Clínica de Santa Tecla". Marca-me outra consulta para fazer outros exames. Estou muda. Não reajo. Não questiono. Concordo com tudo. Devo ter mudado de cor. Tenho o estômago embrulhado. Acompanha-nos à porta. A assistente marca a próxima consulta. Percebo (agora) que fica marcada para uma hora em que deveria trabalhar. Lembro-me de o meu pai me perguntar se não é muito cedo, se não pode ser mais tarde... Eu quero encontrar a minha agenda na mochila mas não sei o que procuro. Mudo, para a procura de uma esferográfica num dos bolsos do casaco. A assistente, que deve ter percebido que eu não sabia o que procurava, disse-me que escrevia num cartão. Não me lembro onde pus o cartão. Desci as escadas, com velocidade, sem olhar para trás e sem esperar pelo meu pai. Chego à rua e agradeço estar a chover torrencialmente. Desço a rua apressada com a chuva a cair-me como um chuveiro. O meu pai tenta acompanhar-me. Tenta abrigar-me. Tenta abraçar-me. E eu não quero nada. Sou uma lágrima só. Paro, finalmente, em frente à Igreja de Santa Cruz. Não sei porque choro. O meu pai diz-me para ter calma. Eu que (quase) nunca vacilo. Eu que sou uma muralha. Trocam-se os papéis. Sinto o frio da dúvida. Sinto a impotência perante o inesperado. Não sinto revolta. Mas sinto culpa. Eu que achava que (ainda) era muito nova. O meu cérebro é um turbilhão. Pergunto ao meu pai, repetidamente, se não percebeu a gravidade da situação. E ele só me pergunta porque choro. "Não tenhas medo"e "não vai ser nada" são as frases que me lembro. E hoje percebo porque chorei. Não tenho medo. Seja o que for. Seja qual for o resultado e o prognóstico. Mas chorei pela surpresa do inesperado. O instante que não controlamos (nunca).
quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016
Lilau
Tudo em mim, hoje, é arrependimento. Tenho falhado muito na vida mas não em coisas maiores. Desta vez, talvez a primeira, falhei naquilo que procurei nunca falhar. Soube há pouco tempo o quão doente estava. Um segredo bem guardado. Nada nela transparecia o quão perto estava do fim. Ela não imaginava. Queria muito ver-me. Tinha saudades minhas, disseram-me. E eu, tão consciente que o fim estava próximo, fiz (quase) tudo para ir vê-la. O meu irmão e sobrinhos ainda foram a tempo. Foi um dia lindo, disseram-me. Eu nesse dia não fui porque queria que tivesse alegrias repartidas. Sabia que o fim estava próximo. Nunca imaginei que tanto. Há duas semanas tentei mas tinha ido à terra tratar das coisas dela e estar com as amigas. Deste fim de semana não passaria. Se não estivesse cá iria onde estivesse. Disse isso à minha mãe. Apareceríamos domingo de surpresa na casa dela. Eu sabia da urgência. Sabia que o tempo não parava e que a doença estava a evoluir. Ela estava bem mas eu, no fundo, sabia que a minha visita era inadiável. De domingo não passaria. Seria abraçada e beijada com aquele entusiasmo tão dela. Ficaria contentíssima por me ver. Eu elogiaria o quão bem estava no alto dos seus 91 anos. Entrelaçaríamos as quatro mãos. Ficaríamos assim muito tempo. Não aparentaria o quão doente estava nem tão pouco a idade que tinha. Veria-a magrinha como fora a vida toda. Sairia de lá muito feliz. Cheguei tarde demais. Ou antes, não cheguei. Afinal, não é verdade que chegamos sempre ao lugar que nos esperam.
terça-feira, 12 de maio de 2015
Porto-Faro
Jantar rápido na mãe. O sobrinho mais velho janta com o apetite das quartas-feiras. O afilhado está mal disposto porque adormeceu no carro. Colo, muito colo, sempre. Estou com uma dor de cabeça que não me larga desde ontem. O tempo, como quase sempre em Braga, está mau. Janto rapidamente. Vou apanhar o avião ao Porto. A fila está imensa e o voo atrasado. O frio é muito. Eu vestida como quem vai para o Algarve. À espera ao relento. Desta vez não implicam com a mala. Dormi o tempo todo na vã expectativa que a dor de cabeça me passasse. Chegada a Faro e parece que estamos noutro país. A temperatura está amena. Vou em direcção aos táxis. Quando chego ao local de espera dos passageiros sinto-me em Lisboa, tal a fila de táxis. Apesar de quase não haver passageiros os táxis organizam-se em 3 filas. Qual delas escolho? Qual é a ordem? Entre o olhar para afrente e para trás para ver se alguém me da uma indicação, só vejo caras mal dispostas e a abanarem os braços em direcção à sei lá o quê. Vou a entrar para um táxi. Gritam-me que não é aquele e que há uma ordem. Vou para outro. Já com a minha mala na mala do táxi. Entro e o taxista diz-me que a minha mochila não pode entrar ou se entrar só pode ir no chão. Ainda não refeita da afirmação incompreensível e a tentar entender manda-me: " a mochila não entra ou vai no chão porque os clientes seguintes podem ficar todos cagados". Eu, entre a estupefação do que acabei de ouvir saí do táxi. Como aquilo deve tratar-se de uma máfia achei que ficaria no aeroporto a noite toda porque arranjei um problema. Ninguém me queria levar. No próximo que entrei, tratei de não discutir e fazer tudo o mais inócuo possível. Coloco a mochila e a mala na mala do táxi. Aqui os taxistas não ajudam as pessoas com as malas. É a lei do "faça você mesmo". Quando chegamos ao hotel demorei ligeiramente a encontrar a carteira, na mochila... Lembram-se daquela que coloquei na mala porque não entrava no táxi... O taxista não tem mais nada, depois de eu ter demorado não mais do que um minuto: "ó dona, vai demorar muito?". E eu já sem palavras, porque nunca tenho resposta à altura quando sou apanhada de surpresa, limitei-me ao silêncio. Subo ao quarto e reparo q a tv não funciona. Desisto e vou dormir. Há dias que mais vale dormir e esperar pelo dia seguinte. Almoço com o P. e a J. em frente à universidade. Pelo menos aqui as pessoas parecem ser simpáticas. O tempo é de verão e convida a esplanar. Resto da tarde aulas intensivas. Apesar de serem alunos de mestrado em Ciências Biomédicas, todos querem Medicina, excepto uma que quer veterinária. Cruzo-me no intervalo com o Rui Vieira Nery e vejo muitos professores com a toga de doutorado. Dizem-me depois que é o Doutoramento Honoris Causa do professor Sampaio da Nóvoa e que a universidade tinha dado tolerância de ponte nessa tarde. Como a aula terminava às 6 e como só tinha avião às 8 ainda deu para ir à ilha de Faro beber uma Margarita e comer uma bifana. Já passava das 7 quando me deixaram no aeroporto e deu tempo para tudo. A maioria dos passageiros eram turistas daqueles que foram aproveitar bem a praia. A sua indumentária denunciava-os. Havaianas, calções, chapéus. E a cor alternava entre o quase bronzeado e o camarão. Chegado ao Porto, um dilúvio aguardava-nos. Muita chuva é muito frio para os padrões algarvios. O Porto nunca nos desilude!
terça-feira, 21 de abril de 2015
Os 6 anos do afilhado
Braga, 18 de Abril de 2015
Há 6 anos nascia o afilhado. A um sábado, precisamente. Ainda tem os dentes todos de leite. Só um abana e ameaça cair. Madrugou, como sempre. E veio para a minha cama, como quase sempre. Dou-lhe os parabéns e cubro-o de beijos. Ficamos deitados. Explica-me porque não foi ontem buscar-me ao aeroporto. Beijos e muitos abraços. Primeiro pedido do dia: pequeno-almoço. O costume. Copo de leite com o desenho de uma guitarra de blues de Beale Street trazida directamente de Memphis. Duas colheres de chocolate medidas por ele. Apesar do cuidado, a mão atraiçoa-o sempre, e parte do pó de chocolate suja a mesa. Como sempre, avisa-me e eu como sempre passo-lhe um papel. Vamos abrir o presente. Exactamente o que ele me pediu: um jipe da policia com um barco num reboque da Playmobil. Ainda não entendi as escolhas do meu afilhado. Visivelmente, tal como eu, não tem jeito para coisas de montar e desmontar. Não tem jeito para legos, nem para Playmobil, nem para puzzles, nem para nada que se relacione com isso. Por qualquer motivo que eu desconheço, continua a fazer as mesmas escolhas ao longo dos anos. O que ele gosta é de carros e de motas e de camiões do lixo e de máquinas escavadoras. E de jogos de futebol. E de tablets. Como ele sabe que eu não aprovo jogos no tablet nem na tv, talvez me queira agradar. Está notoriamente contente mas não é por montar nada nem com os pormenores tão pequenos da Playmobil. Está fascinado sim com o jipe e com o barco que são razoavelmente grandes. O seu passatempo preferido nos últimos tempos é escrever. E é vê-lo a preencher cadernos e cadernos com as escritas dele. Coisas que só ele percebe e algumas que percebemos todos. Anda sempre com um caderno e com uma esferográfica debaixo do braço. Para onde quer que vá. O outro passatempo é escrever e desenhar nas paredes da cozinha! Já quase não há espaço livre tal o tamanho da sua obra. Aquilo já não são paredes. Mais parecem murais. O meu afilhado não gosta de quase nada. Há pouca coisa que goste de comer. Tem mau feitio. O que ele mais gosta é Coca-cola, apesar de lhe ser praticamente proibida. Gosta muito da Bu. Ao contrário do irmão que a trata com muito cuidado, e é o símbolo da meiguice, o afilhado trata-a como companheira das brincadeiras. Carrega-a para todo o lado mesmo que isso seja um processo quase impossível. Tem um fascínio pelo Homem-aranha. E vive na ilusão que eu o conheço e que é real. Quando era mais pequeno adorava que lhe lesse histórias. Agora gosta menos, só quando vai para a cama. Adora cantar. E adora hinos de futebol, principalmente os do Benfica. Adora bolas e jogar futebol. Já assina o nome e depois coloca por baixo “afilhado”. Tem um riso lindo. E uns abraços fortes. Insiste que um dia é ele que pega em mim. Teve a festa que quis. Com os amigos que escolheu. A festa acabou no dia seguinte e excepcionalmente deitou-se no mesmo dia que acordou.
segunda-feira, 20 de abril de 2015
Sexta-feira
Sexta-feira. Acordo à hora do
costume mas deixo-me estar na cama. Tenho por companhia, em cima das minhas
pernas, um gato preto que mais parece um leão. Enorme e pesado. Ronrona. A luz
de Lisboa entra pela janela. Mesmo com nuvens, Lisboa é sempre clara. Acho que
não há luz como esta. Pequeno almoço tardio. Desço a pé a Estados Unidos da
América até Entrecampos. Pouso a mala. Almoço tardio no Entre Copos. Escolhemos
ovas de peixe grelhadas. Não me lembro da última vez que as comi. Como são 3 da
tarde dizem-nos que as brasas estão fracas e que é melhor escolher outra coisa.
Dourada escalada. Não me lembro de comer um peixe tão bem grelhado na brasa. No
ponto. Nem no Algarve. Para acompanhar dispenso as batatas cozidas. Só brócolos
cozidos e tomate com sal. Nada de álcool nem sobremesas. Os excessos
restringiram-se ao dia anterior. Vamos buscar o ZM à creche. Pequenina.
Familiar. Desenhos nas paredes. Alegria. Simpatia. Beijos e abraços.
Despedidas. Vamos até ao parque. Crianças de um colégio são fotografadas. Reparo
no número de crianças com óculos. Temperatura amena em Lisboa. Sol radiante. O
ZM já consegue pronunciar o meu nome com um tom anasalado no final. Hora do
lanche. O meu, o de sempre. Galão claro morno e pão com manteiga. O ZM
reparte-se entre o pau com manteiga e uma língua de gato. Quer dar de comer aos
piu-pius. Sobe para casa. Descubro que o Frozen não é só paranóia das meninas.
Toda a gente está viciada. Brincamos com uma bola e com umas peças de madeira.
O tempo não pára. Seguimos de carro para o aeroporto onde a S. me deixa no
Terminal 2. Continuo sempre a aprender. Afinal podemos ir directamente para o
terminal 2 sem passar pelo 1. O check in parece uma feira e as salas de
embarque também. Mais gente que bancos. Como ainda falta algum tempo decido-me
pelo único bar que lá tem. Guiness parece-me uma boa escolha. Leio. Os
estrangeiros são os principais clientes. Sandes de tudo e mais alguma coisa e
litros de imperiais Sagres. Chamada para o avião. O dia acaba. Fim
de dia ameno. Chegada o Porto 45 minutos de pois. Noite escura. Chuva
torrencial. Dilúvio. Arca de Noé.Como é possível um mudança tão drástica de
cenário com tão poucos kms que separam estas duas cidades. Toda a gente corre.
Malas arrastam-se. Outras voam, tal é a velocidade. Fatos molhados. Ninguém
preparado para esta chuva. Ninguém é elegante a correr debaixo deste temporal.
Eu deixo-me ir, lentamente. Parece que saí do chuveiro mas isso não me faz
acelerar o passo. Quando apanho a mala, tiro o casaco de malha, desaperto a
camisa, fico em t-shirt, seco o cabelo com a camisa, visto uma camisa
divinamente embrulhada na mala, visto outro casaco. Como é hora de jantar,
espero uns 30 minutos pelo meu irmão naquele café que é uma imitação barata do
Starbucks mas com preços igualmente pornográficos para um país pobre como o
nosso. O meu irmão chega sozinho sem os meus sobrinhos. Aguardam-me em casa dos
avós porque não quiseram enfrentar a chuva. Chegada a casa dos pais é a festa
da miudagem, como se não me vissem há muitos. Colos, beijos e abraços e elogios
aos penteados novos.
quinta-feira, 16 de abril de 2015
Quarta-feira
Quarta-feira, dia de jantar com os sobrinhos. Como o meu irmão ficou de me levar ao aeroporto, fomos jantar ao McDonals. Isto só acontece muito raramente. Então, para eles, é a alegria. O meu afilhado, que faz 6 anos no próximo sábado, anda sempre com um caderno é uma esferográfica. Diz ele que é para escrever. Como o irmão já anda na primária deve querer imitá-lo. Então é ver páginas e folhas completas de letras que só ele entende e outras que entendemos todos. No carro contam entusiasticamente a semana na escola. O que aprenderam. O que comeram. A peça de teatro que viram hoje. As histórias com os amigos. Quando saímos do carro a necessidade de serem abraçados e visível. Passamos o tempo abraçados e a trocar de par. O pai abraça um e eu abraço outro e depois trocamos. E passamos o jantar a encostar cabeças e ombros. E a tocar nas mãos. E a fazer festinhas na cabeça uns dos outros. Gargalhamos e rimos muito. Brincamos mesmo que o tempo seja curto. Falamos dos desenhos que os meus sobrinhos me prometem, mais uns, para escorar a minha secretária. Falamos das cartolinas que os esperam para fazerem o alfabeto dos animais e das profissões. Falamos do jantar de sábado que terão com os amiguinhos de Braga, R. e J. Vamos a caminho to aeroporto. O dilúvio da Arca de Noé abrandou. O céu cinzento escuro tornou-se mais claro. O dia está a terminar. O sol está a começar a pôr-se. Vê-se o arco-íris ao longe. O sol laranja, lindo, ao fundo da estrada. Falamos de ir a Serralves quando estiver bom tempo. O afilhado adormece. O K. bebe o resto da minha Coca-Cola. Aproveita porque quase nunca o pode fazer. É a bebida quase proibida. Estamos quase a chegar só aeroporto. O K. quer ir à torre de controle. Rimos da inocência dele. Prometo-lhe, que por hoje não haver tempo, na sexta entrará no aeroporto. Ele fiz- me que já conhece, claro. Mas quer ver outra vez.
Hora de embarcar. Fila enorme. Muitas pessoas. Muitas malas. Ninguém é parado. Só eu. Nestas horas percebo porque não gosto de low costs. A pessoa que controla os bilhetes diz-me que se a mala não cabe nas medidas deles é porque a mala não tem aquelas medidas. Não falo. Não discuto. Não argumento. Não digo nada. Só abano com a cabeça e lembro-me da razão pela qual só viajei duas vezes com a Ryanair. A minha cara deve dizer tudo. Poupo num lado mas gasto no mais elementar, a mala. Depois penso naquele vídeo dos apanhados da TVI: "Eles poupam 5, elas fo*** 10? De quem é a culpa, cara***? E sorrio. Afinal o que é isto comparado com tanta desgraça no mundo. Relativizo. Não dou importância. Não fico chateada por mais de10 segundos. Até que a senhora me pede licença para retirar a etiqueta da minha querida TAP e colocar a da Ryanair. E como se não bastasse diz-me que tenho que levar a mala para a pista e entregá-la para ir no porão. Como? Não basta ter que pagar por uma mala que deve ter 2 cm a mais, porque a régua que tenho em casa deve estar em polegadas em vez de estar em centímetros, e ainda tenho que ser eu a levá-la? Arrasto-me com a minha impotência para discutir e reparo que o selo que tenho no bilhete e a etiqueta que tenho na mala diz "free bag". Os meus passos ganham mais ritmo e a minha cabeça baixa levanta-se. E percebo, mais uma vez, porque é " melhor ser alegre do que ser triste". Não aproveito a vista da janela e não vi sequer a minha amada Lisboa do ar porque estava a escrever este texto.
terça-feira, 24 de março de 2015
Ver crescer os sobrinhos
Há umas semanas os meus
sobrinhos tiveram a emoção da vida deles, tendo em conta a tenra idade.
Entraram em campo de mãos dadas com os jogadores do Porto e do Braga. O mais
velho foi de mãos dadas com o guarda-redes do Braga (que eu não sabia quem era, e continuo a não
saber) cujo nome é Mateus. O afilhado, segundo o meu irmão, entrou amuado
porque na sorte calhou-lhe um jogador do Porto. E como o rapaz é do Benfica, a
coisa não correu bem. Lá entrou de mãos dadas com o Hernani, que também não sei
quem seja. Quando cheguei a casa, nessa noite,
já dormiam e só no dia seguinte contaram a aventura. O afilhado mal
acordou veio enfiar-se na minha cama para contar os pormenores. Não me falou do
amuo. E disse-me que o jogador que lhe deu a mão lhe perguntou o nome. A
aventura para ele foi mesmo pisar a relva. O mais velho disse-me que a maior
emoção tinha sido entrar no campo e ver uns meninos nus ( o que ele deve ter
visto foram os membros da claque em tronco-nu) com umas bandeira gigantes e
fogo vermelho. O que eu me ri com esta descrição. E ainda me
disse que cantou o hino do Braga enquanto esperava no túnel de mão dada com o
seu jogador.
No dia do pai achávamos todos
que jantassem com o pai e connosco. Como os meus sobrinhos dependem da vontade
da mãe deles, esta não autorizou que jantassem com o pai. Por essa razão, o meu
irmão esteve apenas com eles pouco mais de uma hora. Eu, já tinha chegado a
Braga, quando recebo um telefonema do meu irmão a dizer que o meu afilhado não
parava de chorar porque queria estar comigo. Sem olhar nem para trás, fiz-me á
estrada para estar com os meus sobrinhos não mais do que 30 minutos. Mas a
alegria de os ver com o pai e os abraços apertados que me deram, salvaram-me o
dia.
No sábado passado fomos a uma
sessão de um género de yoga que envolvia
adultos e crianças. A ideia é que os miúdos imitassem os adultos ou os adultos
imitassem os adultos. Os meus sobrinhos não gostaram do que eles apelidaram de “ginástica”.
Mas eu achei que foi uma coisa divertida. Imitámos animais, fizemos túneis,
relaxamos. O que o meu afilhado mais gostou foi das massagens e o mais velhos
gostou de imitar o leão.
quinta-feira, 19 de março de 2015
O dia do pai
Hoje
de manhã cheguei ao meu trabalho e um dos meus amigos mostrou-me o presente da
filha que está quase a fazer um ano: a mão da filha marcada no papel com tinta
cor de rosa. A alegria dele de ser o primeiro ano que comemora, como pai, este
dia. Outro dos meus amigos vai à festinha do colégio da filha, embora a filha o
avisasse que nem todos os pais podiam ir. Mas este pai podia e foi.
De
há uns anos para cá, tudo o que seja festejos, festas, comemorações, dias
evocativos, celebrações, são mais de tristeza e medo do que alegria. Sempre de
coração na mão. Sempre à espera da última decisão. Do poder que alguém humano
decida de acordo com a sua vontade. Os crentes na humanidade, pessoas normais
que nunca passaram (felizmente) por uma situação destas poderão perguntar: a
justiça não funciona? Não. A justiça é lenta e lenta como é perde dias, meses e
anos de situações que são irreparáveis. No Natal, Passagem de ano, dia de anos
do pai, dia do pai, dias de aniversário... são sempre de expectativa e de prece
silenciosa para que tudo corra bem.
Quando
há uma separação, o interesse maior deveria ser salvaguardar os filhos. Pois
bem, na maioria dos casos, infelizmente, os filhos são usados para causar as
piores dores de todas: distância, saudade e ausência. Privar um dos
progenitores de estar com os filhos. Eu pergunto-me o que terá na cabeça uma
pessoa que faz tudo para evitar que os filhos estejam com o pai, nestes dias particularmente,
que um pai tem direito a estar com os
filhos? Que ódio gigantesco é este que permite afastar um pai dos filhos? O que
leva uma pessoa a não informar a escola e as informações escolares de um filho?
Que troca a escola dos filhos todos os anos sem informar o pai? Que maldade é
esta que permite que se não atenda os telefonemas do pai e da família do pai? Que
avassaladoras atitudes são estas que permitem que os filhos sejam considerados
propriedade de uma pessoa? Que amor é este? Que palavra se pode dar a isto? Que
magnânime poder é este que alguns humanos têm de provocar um frio na barriga e
um aperto no coração que deve ser semelhante aqueles que percorrem o corredor
da morte?
Como
me dizia uma amiga há dias, estou descreste nesta humanidade. Que vida tiveram
alguns para ter este tipo de atitudes? Acho que nem a medicina nem a justiça os
pode salvar...
Este
texto não tem a ambição de encontrar respostas nem para ter explicações. É
apenas de desabafo de quem nunca falou em público sobre esta dor que presencia
diariamente e a partilha.
sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015
O dia que a Bu fugiu
Nunca imaginei um dia assim. Vivo por antecipação muitos dos dias da minha vida. Imagino cenários, antecipo situações, sofro por antecipação, sonho alegria e tristezas, imagino conversas, tento o simples tão difícil. Mas nunca imaginei que a Bu um dia fugisse. Era uma sexta à tarde e ligaram-me. Fiquei parada sem reacção. Não sabia o que fazer. Não sabia por onde começar. Liguei primeiro para uma amiga e para o meu irmão. Ficaram os dois como a noite. Liguei para um vizinho meu que tem duas cadelas para me aconselhar. A Bu fugiu porque é uma medricas. Estava a passear sem trela e ouviu um barulho grande e fugiu com o medo. Desorientou-se. A bem da verdade, ela nunca é orientada. O tempo que demorou a chegar a Braga foi uma eternidade. Preparei-me psicologicamente para que o pior tivesse acontecido ou fosse acontecer. O meu medo não era que a roubassem ou que se perdesse porque ela tem chip e uma placa com o nome dela é com o meu telemóvel. O meu receio é que fosse atropelada. Com uma rua cheia de trânsito à frente de casa nunca imaginei um bom cenário. Quando cheguei a casa comecei por procurar o Poeta e pedir-lhe que a procurasse e espalhar a notícia. Depois fui à pastelaria. Estava tudo em alerta. Depois fui procurá-la a pé a chamar pelo nome dela. Quando achei que a vi, avistei- a ao longe. Uma coisa pequena a andar junto ao rio. Comecei a gritar o nome dela. E ela imediatamente parou. Não correu, não andou, simplesmente parou. Rodava a cabeça sem sair do lugar. E quando cheguei ao pé dela ela não reagiu com a euforia e o barulho de sempre. A excitação era muita mas não se ouvia apenas se via. Desde esse dia que reparo que está muito mais atenta e que não foge. Desde esse dia que não mais a passeei sem trela.
Subscrever:
Mensagens (Atom)