Fim de dia. Cansaço. Leve dor de cabeça. Paciência quase
nenhuma. Sono, muito. Há muitos dias que durmo mal. Tenho sono quando não devo.
E quando devia dormir, leio. Só imagino uma cama, ao longe. Dia de jantar com
os sobrinhos. Toco a campainha e ouço a voz que quero ouvir: “Quem é?- a
pergunta de sempre. Com a resposta previsível e sem engano: “Sou eu”. Quando
querem brincar ainda acrescentam: “ Eu, quem?”. Subo de elevador e antes da
porta se abrir já ouço o ladrar da Bu. Quem me abre a porta é o meu afilhado. E
dá-me um abraço com toda a força que tem. Segue-se o abraço e os beijos do
sobrinho mais velho. Este, como sempre, nas suas actividades criativas que
envolvem pintura, desenhos e criações. Agora, sobretudo, bandeiras de Portugal,
dinossauros, baleias e tubarões. O afilhado está fechado num quarto cuja porta
está forrada de recados, desde horários de atendimento, conselhos e profissões.
Hoje a ordem é para que ninguém entre. O sinal proibido. Depois seguem-se as
instruções. Ao mesmo tempo que as leio a minha mãe diz-me ao longe que só se
pode entrar com autorização dele seguindo as instruções. São elas: bater 3
vezes e tocar o sino. Estou demasiado cansada para desempenhar um papel. Mas o
que eu não faço por eles?. Procuro o sino. Está ao lado da porta [é um sino
pequenino, comprado pelos meus pais em Washington no tempo em que os pequenos
tinham paranóia por sinos. Quando me lembro não consigo não rir. O mais pequeno
ainda não falava nem andava e por influência do mais velho dizia: “Tão, Tão,
Tão, Ti, Tão”. Existem vídeos de morrer a rir]. Faço o que os meus olhos lêem.
Bato à porta, toco o sino e espero. O mais velho vem a correr e diz que aquele
é o sino dele. E eu, já preocupada com o tempo que a demonstração teatral vai
demorar, peço-lhe que me empreste o sino, que é só para entrar. Depois de
alguma negociação, consigo que seja ele próprio a tocar o sino (enquanto o
leva) mas a tempo do mais novo ouvir. O afilhado abre a porta e pergunta “O que
deseja?” e eu “Entregar-lhe o presente que trouxe de Lisboa, espero que goste”.
Saio e fecho a porta. Vou à sala e entrego ao mais velho o que ele me tinha
pedido: uma miniatura da Torre de Belém. Abriu e felizmente disse: “Titi, era
mesmo isto que eu que queria, acertaste”, entre beijos e abraços. Ao longe ouço
o afilhado dizer à avó que não gostou nada do que eu lhe dei. Vou em direcção à
conversa e diz-me: “Não gostei nada! Não era nada disto que eu queria (uma
caneca de Lisboa com eléctricos, Torre de Belém, guitarras,...). Ao que
respondo: “Desculpa afilhado mas é o que acontece quando não se diz o que se
quer. E vais dar-lhe uso para beberes o leite.” Não convencido com a explicação
argumenta: “O que eu queria mesmo era o equipamento do Benfica!”. Todos os que
nos rodeiam sabem que isso será o presente do Natal... Este episódio faz-me
lembrar outro, protagonizado pelo pai deles que quando era pequeno respondeu à
madrinha dele: “Não gostei nada! Livros não são prendas!”. Quem sai aos seus não degenera (é de Genebra)...
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