Vi, finalmente, o documentário “Democracia em vertigem” da Petra Costa. Sem saber, vi muitas vezes,
repetidamente, aquela menina tímida, tão nova, a perguntar a Caetano Veloso o
significado da canção “Cajuína” que conta o episódio do encontro de Caetano Veloso
com o pai de Torquato Neto, em Teresina. A letra que começa com aquela questão
existencial “Existirmos, a que será que se destina?”.
E agora, descubro que
aquela menina da pergunta é a cinesasta Petra Costa. O documentário que estreou
no Festival de Sundance e foi tão elogiado pelo The New York Times é de uma
sensibilidade e está tão bem feito que é uma roleta russa de emoções. A revolta,
a surpresa, vergonha e incompreensão quando se vê as manisfestações violentas
contra Dilma e Lula, quando se assiste aquela palhaçada que foi a votação no
Senado do impeachment de Dilma Rousseff
e que eu vivi para ver em directo na televisão. E a preocupação de quem vê uma
país à beira do precipício: “O que vão pensar de nós”? E a profunda emoção despoltada
quando Dilma Rousseff chora no discurso no dia do impeachment. E a serenidade de quem nada teme: “Hoje só temo pela
morte da democracia”. Esta mulher guerreira, que não chorou quando foi
torturada e que assiste, como todos nós, sem nada que a democacia possa fazer,
à derrocada de um Brasil que não existe mais. O Brasil de Lula da Silva que eu
aprendi a respeitar porque foi um Brasil
pensado, um Brasil sonhado. Um sonho que se cumpriu. Um país da América Latina
onde foi possível ver pessoas que foram ajudadas pelo “Bolsa Família e “Minha Casa
minha Gente”. Poder ver os seus filhos estudar, entrar nas universidades,
estabelecer uma classe média, onde os ricos ficaram incomodados por ver tanta
gente andar de avião, viajar, adquirir poder de compra, conseguir direitos
trabalhistas. Uma sociedade com mais igualdade que ameaçou a hegemonia dos
ricos. Este país menos desigual não interessava aos privilegiados. Mas como
Lula disse antes de ser detido: “Ninguém pode prender um ideal”. Esse viverá
com toda a gente que acreditou e acredita porque ninguém poderá prender toda a
gente. Como disse Obama: “This is the man”. O político trabalhador metalúrgico,
que nunca desistiu, que perdeu muito para poder ganhar, filho de uma mãe
analfabeta do nordeste que chegou ao cargo mais alto do Brasil. Ficará para a
história por bons motivos e será sempre lembrado. Eu que não gostava de Lula da
Silva, com toda esta perseguição política de anos, aprendi a respeitá-lo. E
convenhamos, alguém como o Lula que ganhava milhares de euros por palestra, que
é uma vedeta na política mundial, ser subornado por uma casa no meio do fim do
mundo ou um apartamento numa praia suburbana? Sabemos, agora, que tudo não
passou de um plano muito bem feito. E sim, mais vale tarde do que nunca, eu
digo #lulalivre. No dia da votação do impeachment de Dilma Rouseff, o então
deputado Jean Willys, hoje exilado político disse tudo em pouco menos de um
minuto: “Eu me sinto constrangido por participar nesta farsa, conduzidapor um
ladrão, urdida por um traidor conspirador e apoiada por torturadores, covardes,
analfabetos políticos e vendidos. Em nome da população LGBT, do povo negro
exterminado nas periferias, dos trabalhadores da cultura, dos sem tectos, dos
sem terra, eu digo não ao golpe. Durmam com essa, canalhas”.
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