terça-feira, 27 de novembro de 2012

Este texto é para a C. que salvou a minha vida duas vezes - Parte II

No início de Janeiro de 2011 fui para Nova Iorque, a cidade que eu escolhera para viver. Foi uma coisa tão planeada, tão desejada, tão preparada e cheia de expectativa. Eu nunca, em nenhum momento, achei que algo pudesse não correr bem. A minha única “pedra no sapato” era o ter que dividir casa com alguém que não conhecia de lado nenhum. E eu confesso, sou muito de primeiras impressões e quando “ o meu santo não se cruza” com o da outra pessoa pouco haverá a fazer, embora existas algumas muito boas excepções. Depois de uma procura desmedida durante várias semanas, e nada encontrar de jeito, uma colega do meu grupo ia regressar de NY quando eu fosse para lá. Algumas pequenas peripécias antes de resolver alugar o apartamento , mas nada de extraordinário. Tenho que admitir, porque mentirosa é coisa que nunca fui nem soube ser, o tal do meu santo não se cruzou com o da fulana. E isto só de ver a foto no Facebook... Passou-se o Natal e a passagem de ano e nos primeiros dias de Janeiro cheguei a NY. Cheguei por volta das 3, um dia lindo, um sol magnífico, a cidade coberta de neve, linda. Mas ao contrário de todas as outras viagens, de todas as chegadas a Houston, eu não estava bem, tinha uma espécie de aperto no peito e não sabia explicar a razão.  Fui de táxi de Newark até ao endereço da minha futura casa (no limite do Upper West Side), na 110 entre a Broadway e Amsterdam.  Chegada à rua começa o primeiro filme. O taxista descarrega-me as malas que eram exactamente duas (daquelas bem enormes)  no meio da estrada. De não esquecer que a estrada estava limpa e o passeio também mas a neve tinha sido atirada em monte para o meio desta divisão. Ou seja, eu tive q literalmente, escalar esta montanha de neve com uma mala de cada vez.  Feito! Segundo desafio: subir os degraus q separavam a entrada do prédio do passeio. Outra aventura... Até que uma alma caridosa deve ter assistido a esta cena e ajudou-me. Ah, claro, esqueci-me de referir que toquei várias vezes no apartamento e a fulana não se dignou a perguntar se precisava de ajuda... para quê? Eu só tinha 2 malas de 25 kgs cada mais uma mochila e tinha que subir 5 andares a pé..



A tal da alma caridosa (dessas pessoas boas que encontramos sempre no mundo e com as quais nunca nos vamos mais encontrar) perguntou-me qual era o andar e levou-me uma das malas. Claro que eu demorei provavelmente o triplo do tempo a subir com uma delas. Eu já não sabia se chorava, se parava e me sentava ali no meio das escadas... Sei que cheguei ao 5º andar e tive logo um ataque de asma.  Depois de tocar várias vezes à porta a tal da pessoa do apartamento onde ficaria nos próximos 6 meses, dignou-se a abri-la. Cumprimentei-a, levei as malas para dentro,  sem qualquer ajuda e disse-lhe apenas que quando a minha colega voltasse que eu tinha ido comprar um cartão para o telemóvel. Fui pela Broadway e na primeira At&T que vi entrei. Os senhores eram tão simpáticos que eu perdi-me com as horas. Soube quando regressei a casa que a minha colega achara q eu andava perdida. Fomos depois jantar ao “The heights” onde param os undergrads de Columbia (aka canalha). Essa minha colega precisou de ficar o mês de Janeiro para terminar o trabalho dela no lab. Então basicamente eu dormia num quarto, a minha colega na sala e a outra no quarto dela. Essa minha colega acabou por me vender tudo o que tinha por 300 euros e lá fiquei eu com um quarto habitável. Cozinhar nunca cozinhei. Desde o primeiro dia percebi que ali nunca cozinharia. Eu cheguei numa quinta e na sexta fui ao lab e tratar de todas as burocracias. Estava um dia cinzento, triste, chuvoso, tal como eu, e que raramente voltei mais a ver em Nova Iorque. A primeira impressão do lab, comparativamente com o meu lab de Houston, não podia ter sido mais oposto. A primeira pessoa com quem falei não foi com a chefe e isso demorou alguns dias a acontecer...Bem, eu senti-me um caos, eu estava triste como a noite, nunca me tinha sentido assim.Acho que foi nessa noite que cheguei a casa e que era suposto ir à festa de anos da N.  e eu estava com uma dor de cabeça tão grande e já tinha tomado tudo o que podia, que a solução foi deitar-me e esperar que fosse outro dia. Eu sempre ouvi dizer que não havia como um dia depois do outro... A verdade é que acordei e estava ainda pior do que no dia anterior, triste, triste, sim, podem rir-se, tipo novela mexicana “tão à flor da pele que qualquer beijo de novela me faz chorar”, neste caso era qualquer coisa que me fazia chorar... A C. de manhã ligou-me, ou eu liguei-lhe a ela, n sei. Ela estava em Cambridge e já havíamos combinado que eu iria lá no fim de semana seguinte. Mal ela começou a falar comigo e percebeu imediatamente que eu não estava bem. Disse-me para me vestir e sair. Depois de tomar banho saí. Mal cheguei à rua e liguei-lhe, ainda não tinha chegado ao cruzamento com a Broadway e já estava lavada em lágrimas. E são apenas alguns metros... Ela bem me perguntava o que eu tinha, o que tinha acontecido, o que se passava... mas o que eu apenas conseguia fazer era soluçar  e expulsar muito ranho e lágrimas e mais lágrimas. A verdadeira tragédia.  E eu só imagino o pranto, porque em toda a minha vida, não me lembro de ter chorado tanto!!! E lá fui caminhando Broadway abaixo com dezenas de pessoas que passavam por mim e me viam assim e nada fizeram. Em Nova Iorque consegue estar-se só no meio da multidão. Entrei num Starbucks acho que na 103, com aquela cara que deveria ser difícil de esconder, mas ninguém se importou. Como a conversa entre mim e a C. era um monólogo, ela foi fazendo as perguntas e dando as respostas e lá me fez aquelas avaliações que ela sempre faz quando estamos mal... e tomou mais uma vez conta da situação: “ vais a casa, fazes uma mala para um fds prolongado, enquanto eu compro a viagem para Boston. Já te ligo a dizer a hora que vens!. E assim fiz, fui a casa, preparei uma mochila, avisei que ia passar o fds a Boston e a C. acabara de me dar as indicações para ir para Boston.



Por volta das 7 cheguei a Boston, a South Station e a C. deu-me as indicações direitinhas que tinha de apanhar o metro e sair em Central station  e com aquele  sorriso lindo dela. Mal a vi desmanchei-me outra vez. E ela só gritava, berrava, saltava, abraçava-me e eu já não sabia se chorava de alegria ou de tristeza. Mas ainda acabei a rir-me quando reparei nas pessoas que estavam dentro do starbucks a olhar para nós. E fomos afogar as mágoas. Começamos na Green Street e por aí foi...  zou zou e afins...Falamos, choramos, comemos, dançamos e sei que acordei numa casa que não era a dela. Não me lembro como fui lá parar... Vim a saber depois que era de uma amiga que tinha sido operada a um joelho e a C. estava a ajudá-la. Continuei deprimida nesse e no outro dia. Mas hoje sei, com a devida distância o efeito que estes dias e este conforto de família tiveram em mim. Nestes dias a C. cuidou de mim. 






Soube muito tempo depois o que lhe custou ver-me ir para Nova Iorque ainda combalida. E eu lembro-me que acordava diariamente e dizia-lhe “C, não estou melhor” e ela respondia-me sempre “Não estás mas vais ficar”. E um dia, assim como nascem todos os dias da mesma forma que estava deprimida deixei de estar.. Não sei explicar como aconteceu mas foi um click. A partir deste dia nada mais foi justo para a C. O que sempre haviamos combinado de passar fds alternados em Boston e NY passou a ser apenas um plano... Ela coitadinha, saía de Boston  não me lembro a que horas e eu ia buscá-la a Penn Station (não me lembro se às 9 ou às 10). Os fins de semana eram do mais louco que se poe imaginar. Começavam quase sempre no Zigolinis ou Pao. Mas também fomos ao Mercato e Becco em Hells Kitchen , onde pagavamos $80/garrafa de Chianti. 







A noite começava na “Trash Party “do Wesbter Hall e depois ainda iamos para umas festas maradas para Brooklyn, uns lugares muito manhosos mas que a C. dizia “Então não valeu a pena, até atravessamos a ponte de Brooklyn de táxi à noite! Olha que linda vista!”. Ao sábado, quando a ressaca não era muita iamos para o Soho e para o Fanelli. À noite iamos para o Beauty bar e para o Lit...







Às vezes a C. ficava à segunda e percorriamos Greenwhich Village, West Village, Nolita, East Village, Soho  e Tribeca a pé. Acabavamos sempre no Fanelli ou no Zigolinis. Nós somos pessoas de hábitos. Boston, apesar de ter lá estado algumas vezes, conheço muitoooo mal, Cambridge um pouco melhor. Mas vejam bem que eu sou fanática pelo Alexander Calder e não fui ver a escultura dele do MIT... A minha estadia em NY nos primeiros meses não teria sido tão boa se não tivesse tão perto a C. e sim, se não fosse ela, naqueles primeiros dias eu teria conhecido o que era a loucura.

1 comentário:

  1. Eu assisti a tudo nos bastidores. Aqui no meu Portinho mas sempre a falar contigo. Até te mandei uma encomenda para te sentires melhor :)
    Fiquei com vontade de chorar a ler isto e sei que daqui a uns anos quando ler isto outra vez, vou sentir o mesmo!

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