quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Luana Carvalho

As pessoas que me conhecem bem sabem o quanto a música está ausente na minha vida e o quanto sou ignorante neste tema. Ouço cada vez menos, menos, menos música. E acho que há cada vez mais música desnecessária e que só polui o mundo. E com o passar dos anos, não me consigo concentrar na presença dela. Uso-a apenas para “mascarar” o barulho quando me incomoda, no ginásio (que vou com muita pouca frequência) e a andar de bicicleta (que era o meu meio de transporte em Houston). Para piorar os meus conhecimentos musicais, saio cada vez menos à noite e a pouca música nova que vou conhecendo limita-se à obra do acaso. Ou à grande transposição de resistência que às vezes concedo às músicas que os meus amigos me enviam.

A Luana foi uma das grandes surpresas do último ano. Conheci-a, e a sua voz, num fim de tarde lindo em Óbidos. Fiquei encantada. Falou bem, cantou bem e vim a saber que escreve (ainda) melhor. Acompanhada da poeta Alice Sant’Anna, do baterista e baixista da banda Tono. Foi daqueles encontros memoráveis e irrepetíveis que ficam apenas gravados na memória, em que tudo parece ser perfeito. Ali era apenas a Luana. Com as letras, as canções, a voz, a música, os óculos e o violão. Lembro-me, para sempre, que se falou de Machado de Assis, de baleias, de mar, de Moby Dick, da Mangueira...

Em Outubro foi convidada especial do Moreno Veloso no S. Luiz. Cantou “Deusa do amor” e “Invente-me” que serão para sempre a imagem dela, para mim. E no final do concerto foi-me apresentada pela Anabela Mota Ribeiro. Pessoalmente Luana é tal e qual como a cantora que se revelara no palco, como leitora de poesia dela e dos outros, como compositora, como instrumentista: gentil e delicada. Disse-me que os discos seriam lançados em Janeiro, e assim foi. Cumpriu-se.

“Sul” saiu saiu primeiro em todas as plataformas digitais. Ouvi do princípio ao fim, repetidamente, sem me cansar. Tem sido a minha companhia, como barulho (bom) de fundo. A capa, na primeira vez que a vi, lembrou-me “Moby Dick”. Não sei se era essa a intenção. E estão lá, tão perceptíveis a guitarra de Pedro Sá e o violoncelo de Moreno Veloso. “Invente-me” é de morrer de amores. E já sei o significado de “cabrocha”.

“Branco” é diferente. Parece-me um trabalho muito mais experimental e autoral, muito decantado. Um conjunto de sons e palavras cuidadas que não se parece com nada. Talvez daí o nome branco. Ou um zero (não absoluto). Algo no disco me fez (re)lembrar da sonoridade de “Cantada” de Calcanhotto. Sou só eu que achei?

Este trabalho duplo da Luana não é só música, nem canção, nem interpretação. É muito mais. Mais além. Para lá. Muitas expressões artísticas numa só. O muito que se transforma em pouco. A simplicidade tão difícil de conseguir, atingida. A beleza da arte como uma coisa só.


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