Há 20 anos fiquei muito chocada quando um grande amigo não teve coragem de me dizer que era gay e optou por me dizer por carta. Eu
sabia, sempre soube mas fiquei tristíssima por ele não ter tido coragem de me
dizer olhos nos olhos e por ter demorado tanto tempo. Eu tinha 18 anos e ele também. Essa verdade
que eu sempre soubera, era e sempre foi, clara para mim. E nada mudou. A
importância que dei ao tempo que demorou e a forma de me dizer relativizou-se.
Tudo é tão relativo, veio o tempo a mostrar-me, depois.
Hoje, passados 20 anos, a história repete-se. Soube ontem,
abertamente, por mensagem o que sempre achei que se sabia mas que nunca me disse. Mas teria
que dizer? Conheço-o desde sempre. É mais velho do que eu. É a pessoa mais
delicada, educada, física, amorosa, que conheço. Um doce de pessoa. Sempre com
coisas bonitas para dizer. Um esteta. Tem uma biblioteca que me faz ter inveja.
E uma casa linda de morrer. Tem sempre flores frescas. Estamos pouco mas quando
estamos é uma alegria. Acabo de saber que tinha uma relação há 18 anos. Vividos
em silêncio. Viveu aprisionado tempo demais. Viveu com as verdades que ninguém
quis ver. Em segredo. Pergunta-nos se sabemos o que é calar. Esconder. Passar
uma vida assim. Como se a outra pessoa não existisse. Como ninguém. Estou tão
feliz por ele. Por amar abertamente. Tantas pessoas que passam pelo mundo e não
sabem o que isso é. E ele permitir-se, dar-se a essa oportunidade que pode não
ser repetível, é o que me faz sorrir e festejar por ele. Assumiu o seu segredo.
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