terça-feira, 20 de junho de 2017

O sofrimento das mães

Todos os aniversários lembra-se que nasceu às 31 semanas, com um gémeo e com pouco mais de 1000 gramas. Todos os anos lembra-se, particularmente nesse dia, que a mãe ficou sem tocá-la durante quase um mês em que esteve na incubadora. A mãe recusara-se a vê-la (só) do vidro. A única vez que o fez sentiu-se a morrer por dentro porque, ao contrário das outras mães, não podia amamentar os filhos, encostá-los, cuidá-los, mimá-los, mudar-lhes as fraldas. Nada a não ser olhá-los pelo vidro. O pai ia todos os dias entregar o leite que a mãe tirava. Não durou muito porque até isso o desgosto lhe levou. Depois disso levou-lhe a fome, a alegria, o sono, tudo. Quando os filhos voltaram para casa pesava menos do que antes de engravidar. Até hoje a mãe fala dessa dor inqualificável de não ter podido tocar nos filhos durante um mês. Não houve nunca dor maior. E a filha imagina como é para um bebé ser retirado do conforto de um útero, de ter o irmão como vizinho durante sete meses, de ouvir a voz (conhecida) da mãe. E de ter sido alimentada e cuidada, sozinha, durante um mês numa fria incubadora. Sobreviveu, apesar de tudo. A mãe, apesar de ter sido sempre feliz, diz que nunca recuperou desse acontecimento.

As mães nunca se preparam para o pior. São sempre as mais felizes, as mais optimistas, as mais alegres. Tudo o que uma mãe quer ouvir, e se possível ver, é que está tudo bem com o seu bebé. Como se reage quando se faz tudo certo e a natureza mfalhou? Quando se planeia e a probabilidade de erro acontece? Quando se dá a notícia de o bebé não ser saudável, ou como os médicos dizem, não é viável? Como se enfrenta? Como se age? Como decidir? Não é um feto, é um filho - disse a mãe. Os médicos só lhe queriam menorizar a dor e poupar-lhe (algum) sofrimento. Poupá-la do julgamento moral porque o ético e o judicial estava previsto na lei. Mas como as mães orientam-se pelo princípio de Arquimedes (“Dá-me um ponto de apoio e eu moverei o mundo”) arranjam forças onde nem elas sabem de onde surgem. E assim, seguiu em frente, sem vacilar, sem um minuto de arrependimento com uma gravidez que todos apostavam para o bem de todos, que terminasse. E foi feliz, como todas as mães, durante os 9 meses. Esteve mesmo muito feliz. Nunca seria ela a terminar o que a natureza começou. Deixaria a natureza seguir o seu caminho. Depois, reencontrou-se nas palavras e no apoio dos amigos. A vida deste filho não foi a que imaginou nem teve o privilégio de  o ver crescer.  Mas a sua vida é tão mais que as primeiras impressões, nas suas palavras. A vida é insondável. E sente-se grata e em paz por todas estas vivências. No sofrimento e na alegria todas as mães parecem ser iguais. As mães, como as árvores, morrem de pé.

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