terça-feira, 21 de janeiro de 2014

A vergonha

Eu, tal como muita gente, mas principalmente tal como o João Miguel Tavares (com quem partilho muitas das opiniões), na passada sexta-feira, tive vergonha da democracia portuguesa. Não tenho vergonha de ter contribuído com o meu voto para eleger os deputados do PSD (mas podia ter tido, caso tivesse tido oportunidade de votar). Mas, principalmente, vergonha de quem “inventou” um referendo  à última da hora por puro oportunismo político, já depois do projecto de lei ter sido aprovado na Assembleia da República.  Hugo Soares “lançou-se” como o arauto do referendo mas desconfio que não passa de um fantoche que só cumpre ordens e abana com a cabeça. É que a pouca preparação que demonstra ter, mesmo com formação em Direito, envergonha qualquer pessoa. Nem a defender o “seu” referendo mostra-se à vontade. Vazio de ideias é o que me parece. O debate em que participou na TVI24 com a Isabel Moreira foi um KO sucessivo do princípio ao fim. Como se diz na minha terra de nascença (ou nossa, para minha vergonha) o Hugo Soares levou uma coça da Isabel Moreira.

Hugo Soares é mais um jotinha que foi subindo na hierarquia do seu partido, muito provavelmente, por lamber botas. Acresce que não é um grande orador ou um grande argumentador. Não se lhe conhecessem desempenhos profissionais, fora da política, relevantes. A minha grande questão, que continua sem resposta, é: qual é o objectivo de propor um referendo “em cima do joelho” a mando do boss ao boy Hugo Soares?
Tenho vergonha de quem aceitou a disciplina de voto numa matéria de consciência individual. O projecto de lei tinha sido aprovado com os votos a favor de mais de uma dúzia de deputados do PSD. Onde estão eles? O que lhes aconteceu para mudarem de opinião? Não me lembro em matérias tão delicadas de não haver liberdade individual. Estamos numa ditadura? O pastor ordena e o rebanho vai atrás? Palmas para a Teresa Leal Coelho que esteve à altura da sua consciência e dos eleitores. E palmas para os militantes do PSD que não tiveram receios de criticar o referendo, entre eles, Marques Mendes, Pacheco Pereira e José Eduardo Martins. Se ouvir mais alguma vez algum deputado ou governante do PSD invocar a crise para poupar em qualquer coisa, a minha arma de arremesso será sempre o referendo.

As famílias de duas mães e dois pais existem. Ninguém as poderá apagar ou fazer desaparecer. A única injustiça é que não estão protegidas pela lei. E é nisto que os deputados que votaram a favor do referendo deveriam envergonhar-se: esta situação existe, não vai mudar. O que esta lei da co-adopção pretende mudar é o direito de uma criança ter no papel o que existe na realidade.Agora, para quem ainda não percebeu o que está em causa: Um casal criou junto um filho e apenas um dos cônjuges é mãe/pai biologico (a). Separam-se. Todos sabemos como muitas pessoas se transformam nas separações/divórcios. Que direito tem o conjuge que apesar de ter sido pai/mãe, que passou noites a fio em claro quando o filho estava doente, que acompanhou ao médico, que o protegeu? Neste momento, o direito sobre a criança que criou é zero. Agora imaginem outra situação: imaginemos a morte de um dos membros do casal que é pai/mãe biológico da criança. Que direito tem o membro que sobrevive?


Estas famílias já existem. Só temos que lhe dar um direito que lhes pertence. Não custa nada. Não prejudica ninguém. Não faz mal a ninguém. Quem for a favor continuará a ser e quem for contra poderá continuar a sê-lo, democraticamente.

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