Este é o tema que
qualquer que seja a opinião (quase) toda a gente tem razão.
Devemos ser dos poucos
países civilizados em que um investigador doutorado não tem (obrigatoriedade)
de ter um contrato de trabalho. Para quem não sabe, vou repetir ad nauseum, um aluno que acabe o
doutoramento, até há (bem) pouco tempo, o máximo que poderia ambicionar era uma
bolsa de postdoc (1495 €/mês x 12 meses, sem subsídios de férias e de Natal e os
descontos para a Segurança Social resumem-se ao Seguro social voluntário (opcional)
no valor de aproximadamente 125€/mês. Bolsa esta que não é actualizada há mais
de 10 anos.
Há uns anos, começaram
os contratos para doutorados da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), a
que foram dados diferentes nomes pelos diferentes governos. Estes eram poucos
mas garantiam estabilidade e valores variáveis consoante idade e experiência
durante 3 a 5 anos. Entre avanços e recuos, estes concursos que este governo
sugeriu que iam acabar, pelos vistos, irão continuar.
Depois existe a possibilidade,
através de projectos (Europeus ou não) de as Universidades contratarem
investigadores doutorados por determinado número de anos. Neste caso, não são
sujeitos ao regulamento rígido da FCT que só permite que doutorados com 3 ou
mais anos sejam elegíveis. Nestes casos, apesar do concurso ser público, e da
meritocracia ser alegada, os critérios de selecção são mais discutíveis.
Este governo teve a pertinente
ideia de considerar que todos os bolseiros
doutorados que eram financiados directa ou indirectamente pela FCT, há mais de três anos, que desempenhem funções em
instituições públicas têm direito a um contrato. Quem pode não achar? Para
isso propôs que todas as universidades abram concursos para os candidatos
elegíveis. O Ministro da Ciência anunciou hoje o princípio de 2018 para iniciar
o processo de contratação, a termo, de três mil investigadores doutorados. O
diploma, que aguarda publicação em Diário da República, define que a FCT suportará
os custos da contratação de doutorados. E aqui começa o eterno problema. Não
parece um cenário utópico? Eu acho óptimo. Aplaudo de pé. Mas é (mesmo)
verdade? As universidades, nomeadamente de Lisboa e Coimbra, têm alegado
constrangimentos orçamentais para a contratação de investigadores doutorados.
Eu, só acredito, vendo.
No Domingo, o grande
cientista António Coutinho (ex-director do Instituto Gulbenkian de Ciência e actual Presidente da Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa)
escreveu um texto no Observador que dá
que pensar. Começa por escrever que "Os
dados oficiais da FCT mostram que o orçamento realizado em 2016 (367M€) foi
inferior ao do ano anterior (372M€). O investimento na ciência é propaganda
política". Quem diz isto é o insuspeito Prof António
Coutinho. Faltou ainda dizer que os resultados do concurso dos projectos FCT
não estão previstos para antes do início do próximo ano. Este governo vai
acabar a legislatura com 2 concursos de projectos atribuído em 4 anos...
Também, no início da
semana, a excelsa cientista Maria de Sousa foi galardoada com o prémio da
Universidade de Lisboa. Na nota biográfica disponibilizada estava escrito: "Profundamente estimada e muito respeitada na comunidade
científica, Maria de Sousa é também uma humanista que cultiva o gosto pelas
artes, pela história e pela poesia”. É que tal como dizia Abel Salazar: “Um
médico que só sabe de Medicina nem de Medicina sabe”. E esta mulher,
intelectual, médica, cientista com a idade que tem é um orgulho. Também, mas
principalmente, por ser mulher. Elogiou
publicamente os alunos de doutoramento: “Permitam-me um parêntesis de
reconhecimento dos nossos estudantes GABBA”. A cientista a não esquecer
quem ajudou e quem a ajudou. Diz muito da pessoa que é. E destacou dois
momentos: explosão do número de bolsas de doutoramento da responsabilidade do
Ministro Mariano Gago e de investigadores da FCT. Destes últimos, já mais seniores, e que se
tornaram directores de grupo (entre os 40 e 50 anos), e que são “ os
recipientes de grandes bolsas internacionais” mas “a universidade parece não
querer ou não poder integrá-los e o Governo vai implementar um decreto-lei que
vai empregar milhares de postdocs com 6 anos de doutoramento”.
Quando
dois dos maiores cientistas (jubilados) do nosso país, que podiam estar no
conforto do silêncio sobre um problema que não os afecta directamente, falam na
mesma semana dos mesmos (e mais) problemas na ciência em Portugal, algo vai
muito mal.
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