Estou a escrever este texto há meses. Demoro imenso.
Começo, recomeço, apago, deixo... Decantar e repousar. O simples tão difícil... Tive contacto com a obra da Susan Sontag
através das crónicas da Clara Ferreira Alves no “Expresso”. Aliás, quase todos
os escritores americanos que adoro conheci-os por intermédio da Clara.
Lembro-me perfeitamente de uma crónica, em particular, publicada na semana da
sua morte. Isto em 2003. A partir dessa altura comecei a ler alguns livros
dela. Desde que estou em NY passei a ler tudo o que encontro sobre elea,
biografias, na sua maioria. Há uns anos que tudo o que leio são biografias. Nada
mais actual que publicar este texto sobre Susan Sontag a poucos dias da
atribuição do prémio de tradução em Língua portuguesa pela sua Fundação (Susan
Sontag Foundation) no dia 1 de Junho.
Li o livro “Sempre
Susan – a memoir of Susan Sontag by Sigrid Nunez” no ano passado.
Sigrid Nunez é autora
de 6 livros com boas críticas que descreve Sontag como mentora, amiga e uma
inspiração. Em 1974, depois de ter
estudado no Barnard College, estava a frequentar o MFA em Columbia University
na tentativa de escrever ficção enquanto arranjou um emprego a ajudar Sontag
com a correspondência. Sontag, nessa altura, vivia no último andar na 106th
Street com a Riverside Drive com o filho Davied Rieff de 24 anos que estudava
em Princeton mas passava a maior parte do tempo em NY. Sigrid começou a andar
com David e em pouco tempo mudou-se para a casa deles. Sigrid explica que o
título é italiano e que evoca o facto de toda a gente tratar e referir-se a
Susan Sontag pelo primeiro nome. Mas ela não explica porque escolheu o título
em italiano.
Muito pouco é explicado
e descrito neste livro pequeníssimo mas ficamos a perceber o essencial de Susan
Sontag. Muitas das passagens parecem lembranças que ela anotou em pequenos
cartões e juntou-os sem nenhuma ordem particular.
Susan
Sontag parece ter carregado um trauma de
infância pelo egoísmo da mãe pela pouca atenção que lhe dava. Era uma mãe fria,
egoísta, narcisista que nunca mostrou afecto pela filha, que nunca reparou que
tinha uma filha especial. É descrito também no livro Fala os ataques de asma
que Susan tinha em criança e que por esse motivo mudaram-se de NY para Tucson
(Arizona) depois de uma estadia breve em Miami. Fala também que Susan bebia um
copo de sangue diariamente que a mãe trazia do talho. Aos 3 já lia, aos 8
lia Shakespeare, aos quinze anos o director do liceu chamou-a e disse-lhe: “a
menina só está a perder tempo aqui, vamos já dar-lhe o diploma para poder ir
para a universidade”. Sontag ingressou imediatamente na universidade e aos 17
casou-se. Nunca perdeu tempo.
Uma das frases de Susan Sontag mais repetia era: “I want two things: I
want to work and I want to have fun”
Ela era tão “new
yorker”,era tão a imagem que eu tinha das pessoas que viviam em NY: cosmopolitas,
intelectuais, modernas. Na opinião de Sigrid Nunez ela era tão “New York” pela
sua energia e ambição, no “poder fazer”, espírito de conseguir tudo o que
queria, e na convicção do seu excepcionalismo no poder da sua própria escrita,
na sua própria criação, no seu poder de renancer, nas possibilidades
infindáveis de novas oportunidades. Ela considerava-se uma “beauty freak”. Ela
considerava a arte superior à natureza e as cidades muito mais importantes do
que os países. Não havia para ela melhor cidade do que NYC (Manhattan) que ela
considerava a a capital do século XX.
Susan Sontag recusava-se
a ter carteira/bolsa. Não conseguia perceber a ligação das mulheres a esse
acessório. Não usava maquilhagem, pintava o cabelo mas deixava aquela madeixa
branca tão característica. Usava água de colónia para homem: Dior Homme.
Preocupava-se com o peso que oscilava consoante a fase de escrita em que se
encontrava, que influenciava também o quanto fumava, o que significava, se
fosse muito, que estava também a tomar anfetaminas. Mas adorava comer. Nunca
foi adepta de exercício físico, mas adorava andar, quando o tempo começava a
aquecer. Ela usava muito preto, que não era a cor que lhe ficava melhor. Achava
que Virgínia Woolf era um génio. Não gostava de fazer nada sozinha. Adorava
comprar cadernos, canetas e lápis. Sempre adorou viajar. Viajar, para ela,
entre outras coisas, era um antídoto para a depressão.
Susan Nunez diz no livro que por causa de
Susan Sontag começou a ler rápido e começou a escrever o nome em cada livro
novo e que usava um lápis (nunca uma caneta ou esferográfica) para sublinhar.
Susan Sontag costumava dizer que se não tivesse sido escritora teria sido
médica. Sempre adorou sair (frequentou muito o Studio 54) mas gostava também de
receber pessoas em casa. Dormia muito pouco, o menos possível. Adorava
cinema e opera. Quanto mais velha ficava, preferia a amizade e socializar com
pessoas mais novas. E gostava também de ir a sítios e fazer coisas associadas
com a juventude. Ela era muito física, gostava de ser tocada e de tocar. Era
muito fácil de se conversar com ela e se ser confessional. Adorava conversar,
quanto mais intimamente melhor.
Ela dizia que poderíamos saber como eram as
pessoas pelos livros que liam. Susan
Nunez diz que nessa altura Susan Sontag tinha aproximadamente 6000 livros em casa.
Descreve no livro que por influência de Susan começou a organizar os próprios
livros por assunto e cronologicamente em vez de ordem alfabética. Susan Sontag
chegava sempre atrasada aos encontros marcados e dizia sempre que por essa
razão todas as pessoas deviam ter consigo livros (para passar o tempo). Só era
pontual para apanhar um vôo ou para a ópera.
Foi enterrada em Paris
no mesmo cemitério que Beckett.
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