segunda-feira, 27 de abril de 2015

O dia mais esperado chegou

Antes de conhecer o L. pessoalmente já ouvia falar dele. Quando o conheci pessoalmente em NY estava um dia de inverno fortíssimo, nevava e a neve acumulava-se  na ruas. Emocionalmente eu estava um caco, tal como esse dia de inverno. Nessa noite fomos jantar a um restaurante chique em Upper East Side, Le Perigord. O restaurante foi uma péssima escolha, bem ao jeito de quem o escolheu. Quem lá trabalhava falava em francês. Eu acabara de chegar a NY, estava numa casa que detestava, com uma roommate cujo santo não se cruzava com o meu, sem amigos, sozinha para dizer o mínimo. A C. eu já tinha conhecido há dias, a N. acho que também, o F. ainda não. Nesse jantar eram só portugueses com a excepção da minha roommate. Todos na sua melhor roupa já que o restaurante assim o exigia. Eu e o L. mal nos falamos nessa noite. Ele achou-me, mais do que calada, antipática. Mas essa noite foi o princípio de tudo. Depois dessa noite nunca mais jantei sozinha, a não ser por opção. Com o L. jantei em quase todos os restaurantes perto do main campus de Columbia University, bem como todos os asseados de Washington Heights. O L. tem um problema com limpezas. Então, no critério dele não entram os "carros de comida" em frente ao Presbyterian (com os deliciosos chicken over rice e os gyros), nem o Las Palmas ( que mais parecia um supermercado e atrás tinha uma espécie de tasco mexicano), nem o El Presidente. Estes tipos de comida, na sua opinião, faziam-lhe mal. Com ele era mais os peça-lhe Strokos, Jou Jou, Tamaya, Coogan's em Washinton Heights e o nosso preferido do patinho (Ollie's) e o Symposium. Foi com ele que depois de termos assistido a uma conferência da NYSCF no edifício emblemático do the New York Times, onde conheci o cientista mais sexy do mundo (Kevin Eggan), fomos ao Ipanema em Midtown.

O L., quando o conheci, parecia um adulto. Não parecia um jovem aluno de doutoramento. Parecia ter muitas mais certezas do que dúvidas. Foi com ele que aprendi quase tudo o que precisava sobre Columbia University. Conheci os Nobel Eric Kandel e Richard Axel. Conheci o eterno candidato a Nobel, Thomas Jessel, que parece o Hannibal Lecter. Foi ele que me deu a conhecer outro sex symbol de Columbia, meio pop star, meio cientista, meio médico, Sid Mukherjee (autor do livro vencedor do Pulitzer Prize "The Emperor of all Maladies"). E depois dele conheci a mulher dele, Sarah Sze. Com o L. só se falava de ciência. E ele conhecia tudo, todos e todas. Sabia ao detalhe todos os papers da área publicados nas melhores revistas. Como eu não o podia acompanhar e considerava-me uma ignorante, já que a minha temática preferida fora do lab nunca fora o trabalho, resolvemos falar de outros assuntos. Assim, eu tornei-me uma especialista em Benfica, clube que somos adeptos. A outra temática era a política. Ele um fervoroso apoiante do PS e do governo Sócrates e eu (quase) sempre do contra. Para além de tudo isto, o L. sempre teve uma característica que me arrebatou desde que o conhecei: um coração grande. Nunca me faltou. Sempre esteve presente nos bons e nos maus momentos. Sempre telefonou. Nem que fosse para se queixar ou para fazer os seus longos monólogos. Mas ausente foi uma coisa que nunca esteve. No funeral da minha avó, numa tarde quente de férias, em Agosto, ele estava lá. Foi ele que passou a noite comigo no Presbyterian Hospital quando a C. esteve doente. Entrou connosco às 4 da tarde e esteve lá o resto do dia e noite com idas e vindas ao lab. Às 4 da manha estávamos no Jou Jou a fazer tempo para um diagnóstico mais definitivo. Às 7 mandaram-nos para casa. E sei que eu ainda dormia e ele já estava no Hospital com a C. Antes da C. ter alta ainda bebemos uns sumos de maçã do hospital, experimentamos a cama que registava  o peso e ainda experimentamos a casa de banho fio quarto todo xpto do mesmo hospital em que a Hillary Clinton esteve internada. Para além de tudo isto, o L. ainda foi a minha companhia das terças-feiras no Cubby Hole. Das míticas margaridas a $2. E da mítica irmã Lúcia.
Isto foi o bom.

Mas o percurso do L. foi penoso. Escolheu o lab errado quando foi para Columbia. Trocou de lab e de orientadores contra tudo e contra todos. E sofreu pesadamente por isso. O L. Sempre foi ambicioso. Sempre trabalhou muito. Mais. Para que nada falhasse. Tinha objectivos. Metas. Planos. Tudo muito bem planeado. Não vou contar pormenores. Só vou dizer que passou por tudo com muita perseverança e coragem. Nunca desistiu. Nunca desanimou. Nunca baixou os braços.
Acho, hoje, que o que poderia provocar na maioria dos humanos revolta e amargura, no L.  ajudou-o a amadurecer e a encontrar o norte. A dar o devido valor às coisas e definir prioridades. O L. tornou-se (ainda) uma melhor pessoa. Aprendeu a ouvir. E aprendeu que a opinião dos outros nem sempre é a mais importante.

Hoje, passados 4 anos do que deveria ter sido a defesa do seu doutoramento, finalmente esse grande dia chegou. E foi um dia feliz. Esperado e emocionante. Estou a escrever este texto e as lágrimas correm-me pela cara. Nunca conheci ninguém que esperasse com tanta expectativa este dia. E foi brilhante, como só poderia ter sido. E pela primeira vez na vida, em todos os doutoramentos que assisti, vi na cara do mais recente Doutor lágrimas nos olhos.

O orientador dele fez das intervenções mais sensíveis e inteligentes que vi na vida. Falou sobretudo de tempo. Começou por lhe perguntar se sabia, sem olhar para o relógio, que horas eram. E falou numa coisa importantíssima que é: não importa o tempo que as coisas demoram a acontecer mas que provavelmente existe um tempo certo para que elas aconteçam. Muitos parabéns, meu grande amigo! Let's party!

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