O dia começa de manhã para mim, nada habitual ao domingo.
Ontem caí na cama e doía-me todos os músculos das pernas, até os que eu não
sabia que tinha! Isto é o que acontece a quem não anda a pé. Acordei diversas
vezes durante a noite, nada fora do habitual. E às 9 já estava acordada, antes
do despertador dar o toque de alvorada às 9:30. Fui ao Museu Gulbenkian, não
para ver a exposição permanente, mas para ver
a exposição da Clarice Lispector – A hora da estrela. Está nos últimos
dias, e a última vez que estive cá, não coincidiram os horários. Museu cheio de
famílias, turistas, crianças, novos, velhos. E hoje era de graça, coisa que eu
não sabia, mas agradeci! A exposição, tal como Clarice Lispector é invulgar e
sombria, escura. A primeira sala está coberta de frases da autoria dela, e
fotos, a principal delas a destacar um
dos seus olhos, invulgares. A seguinte é parecida mas iluminada. A seguinte tem
a transmissão de uma entrevista, dada pouco antes de morrer, e da publicação do
seu último livro “A hora da Estrela”. Ali são perceptíveis as marcas deixadas
na sua mão direita, provocadas pelo acidente em casa por conta de ter
adormecido com um cigarro aceso. A sala dos espelhos mostra a trajectória das
cidades por onde Clarice Lispector passou, desde a cidade que nasceu, na
Ucrânia até ao Rio de Janeiro, onde morreu. A última sala é constituída de cima
a baixo por gavetas, as quais só algumas abrem. São muitos documentos, cartas,
cartões, e correspondências entre amigos, dos quais se destaca o poeta e
diplomata João Cabral de Melo Neto. É possível ver também carta a pedir ao Presidente Getúlio Vargas a
nacionalidade brasileira, porque apesar de o único país que conheceu como seu
ter sido o Brasil, ela saíra da Ucrânia bebé de colo. As outras espectacularidades
do museu são os jardins e a esplanada da cafetaria. E o clima e a luz de Lisboa
são exemplares para isso.
Segui para o Cais das colunas. Se me perguntarem a minha
imagem preferida de Lisboa, é sentar-me nas escadas que dão para o rio e estar
ali a olhá-lo sem dar pela passagem do tempo. Quando eu conheci o Mississipi
pela primeira vez em Memphis, foi uma desilusão. Eu que achava que o rio era
grandioso ao estilo do Amazonas, das histórias do Tom Sawyer, quando cheguei lá
apareceu-me um rio normalíssimo. Olhar o Tejo do Cais das Colunas [outra das
vistas magníficas é a vista da Fundação Champalimaud] é majestoso. Na semana
passada festejaram-se os 125 anos de Fernando Pessoa. Não existe poema que descreva tão
bem o Tejo como este:
" O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
(...)
O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá nã está,
A memória das naus.
O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso.
(...)
Pelo Tejo vai-se para o mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
(...)
Ricardo Reis
Depois, como estava próxima, fui à Fundação José Saramago.
Para minha surpresa estava fechada. Pelos vistos fecha aos domingos. Para a
“Presidenta” Pilar que está sempre a reclamar de tudo, era óptimo que
explicasse a lógica de fechar a fundação ao domingo, quando os que trabalham
durante a semana não o podem fazer... Sem querer estragar o meu dia que estava
a ser perfeito, encontrei a felicidade mesmo ao lado. Almoço:caracóis,
sardinhas, uma salada, uma imperial e uma coca-cola na esplanada do “Solar dos
bicos”. E ainda estive a avançar a leitura da biografia da Clarice Lispector.
A
meio da tarde, para desgastar, segui pela Praça do Comércio em direcção à Rua
do Alecrim, não tão íngreme como a Bica... Depois segui pela Rua da
Misericórdia até ao Miradouro São Pedro de Alcântara, que juntamente com o
Miradouro de Santa Catarina e a Graça, é
de tirar a respiração. É quase de
desmaiar de tão lindo! Segui até ao Príncipe Real onde me estiquei na relva. Em
Braga, os jardins são para olhar e não para usar. Este não, toda a gente deitada
nos jardins! E eu que só podia fazer isso em casa dos meus avós, tirei a
barriga de misérias e estive ali a olhar para o céu, a ver as nuvens passar
devagarinho, a ouvir as crianças a jogar à bola, os gritos das correrias,
casais de namorados (as) a ler e a aproveitar o sol, esplanadas cheias,
velhinhos nos bancos do jardim, a olhar as palmeiras e outras árvores que não
sei o nome. Aproveitei para mais leitura e até ao último minuto porque queria
que este dia demorasse mais a acabar.
Em dias assim o tempo devia ser demorado...e as horas deviam ser minutos e os dias deviam ser horas...em dias assim aprende-se tanto a não fazer nada!!!!!!!! :-D
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