terça-feira, 24 de outubro de 2017

Que acordão é este?

Hoje ouvia que não há classe mais avaliada e escrutinada do que a dos juízes porque os acordãos são colocados à disposição de quem os quiser ler e consultar. E depois, esse trabalho está sob os holofotes das partes, do MP, dos advogados, das outras instâncias superiores, dos jornalistas... Tudo verdade.

O Conselho Superior da Magistratura reagiu timidamente ao acórdão do Tribunal da Relação do Porto em que dois magistrados declaram ser compreensível a punição violenta das “mulheres adúlteras”. No comunicado defendem que “nem todas as proclamações arcaicas, inadequadas ou infelizes constantes de sentenças assumem relevância disciplinar”. A questão pertinente que se coloca é quem pode agir contra o Juiz Desembargador Neto de Moura que é o autor do acordão inqualificável sobre um recurso do Tribunal de Felgueiras que  foi assinado, também, pela sua colega Maria Luísa Arantes (sim, uma mulher)?

Os argumentos do acordão para justificar a violência são tão arcaicos e medievais que parece impossível terem sido escritos no século XXI, numa cidade da Europa:  “O adultério da mulher é um gravíssimo atentado à honra e dignidade do homem. Sociedades existem em que a mulher adúltera é alvo de lapidação até à morte. Na Bíblia, podemos ler que a mulher adúltera deve ser punida com a morte. Ainda não foi há muito tempo que a lei penal [de 1886] punia com uma pena pouco mais que simbólica o homem que, achando a sua mulher em adultério, nesse acto a matasse.” Um provinciano, misógino, preconceituoso, inculto que julga com base no divino em que acredita é péssimo mas  não censurar e não conseguir despir-se de todos os preconceitos de uma sociedade machista  é muito pior. Há argumentos no acordão que parecem ser ele o traído. De facto, os juízes também são humanos. O grande problema aqui foi a balança do sentimento lhe ter pendido para o lado errado. Acusou e julgou, parecendo, na minha opinião, colocar-se  no papel de traído, como se isso fosse o importante, e nunca por exemplo de pai ou irmão da “traidora”. É sempre interessante perceber para que lado pende a balança da nossa (cega) justiça.

Sem comentários:

Enviar um comentário

facebook